Ilustração para 'Mensagens internas revelam que Nubank vê 'censura e intolerância' contra executiva que apoiou Brasil Paralelo'.

Mensagens internas revelam que Nubank vê 'censura e intolerância' contra executiva que apoiou Brasil Paralelo

Funcionários criticam associação com produtora, enquanto co-fundador David Vélez defende 'liberdade de expressão' e critica vazamentos.

Ilustração para 'Mensagens internas revelam que Nubank vê 'censura e intolerância' contra executiva que apoiou Brasil Paralelo'.

O Nubank está passando por uma grave crise de imagem após ser associado à produtora Brasil Paralelo, conhecida por suas posições negacionistas e de extrema direita. Mensagens do Slack, plataforma de comunicação interna, e um vídeo de uma reunião de emergência sobre o caso, obtidos pelo Intercept Brasil, mostram como o banco está lidando com as repercussões das denúncias e as reações dos funcionários. 

A crise começou após o Intercept revelar que o Nubank havia acobertado um então funcionário envolvido em denúncias de xenofobia, Konrad Scorciapino, que é atual diretor da Brasil Paralelo.

Dias depois, a co-fundadora Cristina Junqueira divulgou um evento da produtora de extrema direita em sua conta no Instagram, o que gerou uma onda de cancelamentos de contas por parte dos clientes e fortes reações dos funcionários.

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As mensagens do Slack revelam que David Vélez, outro co-fundador do Nubank, escreveu sobre o tema aos funcionários da empresa na tarde da última quinta-feira, 20. Apesar de admitir a necessidade de revisar as políticas de comunicação para a alta liderança e falar que a empresa está em “modo de crise ativado”, ele saiu em defesa de Cristina Junqueira.

Vélez minimizou o post pró-Brasil Paralelo alegando a importância da pluralidade de ideias e afirmando que “ideias ruins são combatidas com ideias melhores, não com censura ou intolerância”.  

O executivo também citou uma suposta violência contra quem “promove pontos de vista diferentes”. Como observado pelos seus próprios funcionários, Vélez ignorou que, segundo especialistas, a Brasil Paralelo propaga discursos de teor negacionista — e não simplesmente controversos. 

“Queremos criar diretrizes e um processo que possam, de maneira justa e sem vieses, fazer a avaliação e as recomendações que respeitem nosso princípio de pluralidade de pensamento e que não se tornem reféns da grande quantidade de intolerância atualmente existente em relação a conteúdos, pessoas ou eventos que promovem pontos de vista diferentes”, escreveu Vélez.

O comentário gerou fortes reações. Pelo menos cinco profissionais do banco responderam textualmente à afirmação do executivo, revela o material obtido pelo Intercept. Dezenas de outros enviaram reações de apoio aos empregados que demonstraram discordância às afirmações do co-fundador.

Um profissional respondeu à mensagem de Vélez destacando que a controvérsia não é meramente uma questão de liberdade de expressão.  

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“Gostaria de esclarecer o seguinte: os Nubankers não estão inflamados por uma associação com um veículo conservador ou de direita, mas sim por um disseminador de notícias falsas que prejudica os direitos humanos fundamentais. Existe um falso paralelo entre opiniões divergentes (o que é mais do que aceitável, é democrático e justo) e o que a Brasil Paralelo faz. É uma empresa que promove notícias falsas e discursos de ódio”, escreveu.

O funcionário citou ainda um documentário da Brasil Paralelo que tenta desacreditar o caso de Maria da Penha, usado como exemplo do tipo de desinformação que a produtora promove. 

“Pouco depois disso, Maria foi alvo de uma tentativa contra sua vida como consequência direta das supostas dúvidas levantadas pelo documentário. Ela agora está sob proteção do Estado. Este é o tipo de dano e ódio que está sendo disseminado, e isso não é uma questão de opinião”, afirmou, sendo apoiado por dezenas de colegas.

Outro funcionário do Nubank afirma que, apesar da empresa defender “diversidade de ideias”, há algumas que são inaceitáveis, como o racismo. “Não há espaço para argumentação e discussão nesse cenário. Portanto, deve ser censurado e nunca tolerado”, diz o funcionário. 

David Veléz, então, disse discordar. “Eu interpreto alguém que se recusa a debater como tendo argumentos muito fracos”, disse.

Outro tema que gerou revolta na mensagem de Vélez foi a abordagem ameaçadora sobre vazamentos de informações internas. Mais do que expressar decepção com a divulgação de mensagens internas para a imprensa, Vélez enfatizou que “qualquer um que recorra a vazamentos para fazer um ponto deveria procurar outro local de trabalho”.

O co-fundador fazia referência, nesse trecho, a uma mensagem interna enviada pelo CEO diretor de operações do Nubank, Youssef Lahrech, que foi divulgada em reportagem da Agência Pública. Na mensagem, ele minimizou a importância da postagem de Junqueira. 

Ao Intercept, o Nubank afirmou que tem orgulho de criar um ambiente de trabalho “seguro e transparente, com uma cultura que ativamente estimula e incentiva questionamentos”. A empresa também afirmou lamentar que conversas internas tenham sido compartilhadas porque “confidencialidade é o alicerce do nosso ambiente plural”. Leia a nota na íntegra no fim deste texto.

Em vídeo, Vélez chama crise de ‘grande distração’

Stories postado pela executiva do Nubank divulga evento da Brasil Paralelo.

A conversa de Vélez com os funcionários do Nubank rendeu tanto que, no dia seguinte, foi convocada uma reunião para debater o caso por meio de uma chamada de vídeo. O Intercept obteve relatos de participantes da reunião e o vídeo de um trecho de pouco mais de três minutos. 

Na reunião, Vélez diz que a empresa já “passou muitas horas” debatendo o assunto, sai em defesa de Junqueira e minimiza as reações dos funcionários que ficaram incomodados.

“Eu também sei que para vocês foi muito estressante, mas vocês precisam fazer planejamento, os consumidores [estão] se sentido afetados, experiences [setor responsável por registrar reclamações dos clientes] recebendo muitas questões”, afirmou Vélez. “Ninguém tinha intenção de causar esses danos, eu tenho certeza”, prosseguiu.

O CEO do banco disse ainda: “Já estamos passando muitas horas nisso essa semana. Nós temos grandes contas aqui. E estamos tentando ver os prós e contras, mas, no final das contas, como CEO da empresa, é difícil impor em alguém o que alguém pode fazer no seu tempo livre”. 

Antes de finalizar sua fala inicial no encontro, Vélez disse mais uma frase que irritou funcionários: “É muito importante que isso não se torne uma grande distração”.

Junqueira não vê erro em post pró-Brasil Paralelo

Depois da reunião de Vélez com os funcionários, em mensagem enviada no Slack no fim da tarde de sexta-feira, 21, Cristina Junqueira afirmou que não tinha a intenção de ferir ou afetar negativamente os trabalhadores ou clientes do Nubank. 

“Quero começar reconhecendo que muitos Nubankers e clientes se sentiram magoados ou afetados por isso. Posso garantir que nunca foi minha intenção que alguém se sentisse assim”, escreveu, sem pedir desculpas ou admitir um possível erro.

Junqueira disse que suas ações têm um “impacto desproporcional” sobre o Nubank e se defendeu perante os colegas afirmando que, “na esmagadora maioria das milhares de atividades de comunicação na última década, meu trabalho tem sido uma força positiva para o Nubank”. 

Leia a nota enviada pelo Nubank:

Desde o começo do Nubank temos nos orgulhado de criar um ambiente de trabalho seguro e transparente, com uma cultura que ativamente estimula e incentiva questionamentos, desafios, a livre expressão de idéias e o debate entre diversos pontos de vista – desde que observadas as nossas normas internas e Código de Conduta que proíbem o desrespeito, a discriminação, a perseguição, retaliação e qualquer prática abusiva.

Promovemos conversas na semana passada com grupos de funcionários que queriam expressar os impactos causados pelo ciclo nas redes sociais. Tanto no canal interno de Slack, quanto em fóruns pelo zoom, centenas de funcionários debateram livremente, expressaram posturas divergentes entre si, e elogiaram o espaço seguro de diálogo transparente – o que permitiu explorar esse ciclo desde todos os pontos de vista.

Como empresa, acreditamos que a inovação da qual somos capazes só é possível quando temos um ambiente onde todos possam expressar seus pontos de vista e opiniões divergentes, com respeito e equilíbrio. Lamentamos que alguém em nossa empresa compartilhe nossas conversas internas porque a confidencialidade é o alicerce do nosso ambiente plural e amplo de debate interno.

🚨 O QUE ENFRENTAMOS AGORA 🚨

O Intercept está vigiando manobras eleitorais inéditas da extrema direita brasileira. 

Os golpistas estão de cara nova, com seus ternos e sapatênis. Eles aprenderam estratégias sofisticadas de marketing digital para dominar a internet, que estão testando agora nas eleições municipais.

O objetivo final? Dominar bases de poder locais para tomar a presidência e o congresso em 2026. 

Não se deixe enganar: Bolsonaro era fichinha perto dos fascistas de sapatênis…

O Intercept não pode poupar esforços para investigar e expor os esquemas que colocam em risco nossos direitos e nossa democracia.

Já revelamos as mensagens secretas de Moro na Lava Jato. Mostramos como certas empresas e outros jornais obrigavam seus trabalhadores a apoiarem Bolsonaro. E expusemos como Pablo Marçal estava violando a lei eleitoral. 

Mas temos pouco tempo, e muito mais a revelar. Agora precisamos de recursos para colocar mais repórteres nas ruas. Para isso, precisamos de sua ajuda. Somos financiados por nossos leitores, não pelas empresas ricas que mandam em Brasília.

Faça parte do nosso time para causar o impacto eleitoral que você não verá em nenhum outro lugar! Faça uma doação de qualquer valor ao Intercept hoje mesmo! 

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