Evangélicos, assim como muitos outros grupos, são analisados de forma superficial e preconceituosa. Quem interage pouco com eles, tende a desqualificá-los (e isso é comum) como se fossem uma grande massa de primitivos facilmente manipulável. No âmbito político, é comum observar algumas facções seculares e de esquerda que consideram que os evangélicos se comportam de forma particularmente tribalista, sendo facilmente manipulados por seus líderes religiosos por conta de uma suposta escassez de pluralidade e independência de opiniões.
Como ocorre na maioria dos casos, quando se pesquisa a fundo, sempre é possível encontrar alguns exemplos que de certa forma se encaixam no estereótipo. Isso apenas comprova como o uso de estereótipos é um equívoco desnecessário. Durante as eleições municipais do Rio de Janeiro, falou-se muito sobre os evangélicos, já que o líder nas pesquisas é o bispo da Igreja Universal, Marcelo Crivella, mas o grupo em si raramente é ouvido. Isso abriu espaço para o surgimento de críticas sem fundamento sobre os membros da comunidade evangélica. Tais críticas têm dificultado o diálogo entre partidos de esquerda e essa parcela fundamental do eleitorado.
Com o intuito de dar voz a esse importante grupo, o The Intercept Brasil entrevistou diversos evangélicos sobre seus candidatos para domingo e o que os motivou a escolhê-los. Obviamente, muitos evangélicos votarão em Crivella, em grande parte, porque foram convencidos (de forma enganosa) que a vitória de Marcelo Freixo traria políticas sociais que eles consideram radicais, como a legalização de drogas, aborto e prostituição, ataques sistemáticos à liberdade religiosa e o “ensino” da homossexualidade para crianças pequenas nas escolas. Outros apoiam Crivella por motivos mais banais, como uma vaga esperança de que o bispo melhorará os sistemas de educação e saúde do município.
Mas dentro da comunidade, é possível observar ampla diversidade, individualidade e senso crítico. Diversos evangélicos se negam a votar em Crivella. Isso não acontece apesar do fato dele ser um evangélico fervoroso, mas justamente por conta disso. Eles defendem ser fundamental manter a separação entre dogmas religiosos e o poder político. Mas muitos acreditam que o compromisso de Freixo em melhorar as vidas da população pobre do Rio de Janeiro e a posição oposta de Crivella, defendendo o interesse do empresariado, são muito mais importantes do que qualquer afinidade religiosa ou concordância em questões de políticas sociais. Ainda assim, há muita gente sendo convencida pelos mesmos pontos que afligem eleitores não evangélicos: preocupações de que o lado corrupto de Crivella tenha sido revelado pelos escândalos recente e se alinhado com facções (família Bolsonaro) hostis às minorias e à população pobre da cidade.
Escolhemos dois eleitores evangélicos que se mostraram especialmente ponderados e articulados para esclarecerem os motivos por trás de seu apoio a Freixo: com isso, não pretendemos sugerir que a maioria dos evangélicos rejeita Crivella: é muito provável que esse não seja o caso. Pelo contrário, ao ouvir evangélicos que divergem dos estereótipos políticos comuns, ajudamos a trazer à tona a realidade desta comunidade: com grande riqueza intelectual, aberta a argumentos racionais e motivada por sua diversidade intelectual e senso crítico como qualquer outro grupo.
No vídeo abaixo, incluímos trechos da entrevista com Cosme Felippsen, jovem de 27 anos, morador do Morro da Providência, membro e missionário da Igreja da Assembleia de Deus, e Thamyra Thâmara, jornalista, 28 anos, moradora do Complexo do Alemão, que se autodenomina uma feminista, além de membro da Igreja Batista do Cominho:
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