Sérgio Cabral e Eike Batista presos. Dependendo do ângulo, eles não são uma dupla e sim uma tríade, como no caso da segurança pública do Rio de Janeiro. A diferença é que um deles periga “cair pra cima”. Isso porque Michel Temer vem cogitando José Mariano Beltrame, secretário de Segurança do Rio de Janeiro por quase uma década, para ser secretário Nacional de Segurança. Chegou a ser cotado para ministro da Justiça – o que lhe daria foro privilegiado –, mas a preferência neste caso é por nomes de carreira jurídica e não policial.
Cabral criou as Unidades de Polícia Pacificadora que alçaram José Mariano Beltrame ao posto de secretário modelo. Eike Batista financiou o sonho. Agora os padrinhos passam temporada em Bangu, e Beltrame pode alçar voos mais altos. Ou, diante dessa calamidade, queimar seu filme meticulosamente – e midiaticamente – construído. O Globo premiou Beltrame em 2009, 2010 e 2013. O El País o elegeu uma das 100 personalidades de 2011, mesmo ano em que revista Isto É o declarou o “brasileiro do ano”. O marketing funcionou.
Diante das crises penitenciária e da segurança pública como um todo que assola o país, a ideia é chamar um “nome de prestígio” para o cargo e anunciá-lo em março, após aprovação (ou não) de Alexandre de Moraes para o STF pelo Senado. Beltrame colaborou muito para a situação caótica na qual estamos imersos quando começou a transferir membros de facções de tráfico de drogas para outros estados e, assim, financiar a expansão dessas. Deixou o cargo em outubro do ano passado com a bomba da “guerra nacional” de facções prestes a explodir. Timing perfeito para deixar sua marca imaculada.
Eu sei que no confronto com criminosos, minha arma vai travar depois do terceiro ou quarto tiro. Vou fazer o quê? Vou morrer? O Beltrame teria que falar menos e fazer mais por nós.
Interessante pontuar que esse prestígio se dá majoritariamente fora do Rio de Janeiro. Nem dentro da Secretaria de Segurança do Rio de Janeiro (Seseg) essa “reputação” é grande coisa, já que ele tem fama de não ouvir as pessoas. O que parece ser um ótimo perfil para o tempo político que vivemos: dar de ombros para opinião técnica ou pública.
Homem Blindado
A blindagem ao nome de Beltrame durou quase 10 anos, mas prestes a sair do cargo sua imagem já era outra. Novos policiais desmotivados, antigos policiais insatisfeitos, policiais aposentados – como o coronel reformado da PM Paulo Cesar Lopes – soltando o verbo: “[Beltrame] Promoveu um desmantelamento organizacional na PM e exterminou dez turmas de oficiais, que, ao chegarem ao ápice da carreira, foram inativados, sem que houvesse tempo hábil para transmissão de conhecimento e experiência. Os comandante atuais são jovens inexperientes. O mais lamentável é que ainda tem a desfaçatez de atribuir aos policiais militares sua incompetência”. Os novatos também não tinham mais paciência. “Eu sei que no confronto com criminosos, minha arma vai travar depois do terceiro ou quarto tiro. Vou fazer o quê? Vou morrer? O Beltrame teria que falar menos e fazer mais por nós”, protestou o PM, lotado em uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Zona Norte.
O embate contra Beltrame não era só operacional, mas também político. Em 2015 os sinais do desprestígio começaram a ficar mais evidentes. O programa de segurança privada montado pelo governo do Rio – Lapa/Lagoa/Méier/Centro Presente – foi feito a revelia do secretário, que chegou a dizer que “quem paga, leva“, já que o programa não tinha planejamento.
A insatisfação com o secretário é grande. Já deu. Ele perdeu a confiança do governo, da Assembleia, da sociedade.
Acusações contra Beltrame apareceram de acordo com a perda de seu poder político. Em 2014, o Ministério Público pediu a sua saída do cargo e o denunciou por improbidade. A ação é referente a dois contratos de aquisição e manutenção de viaturas da Polícia Militar firmados entre 2007 e 2008, no valor de R$ 135 milhões. A justiça aceitou denúncia em 2015. Não há novidades sobre o caso.
Há poucos dias do início dos Jogos Olímpicos deputados se reuniram na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) para pedir a cabeça de Beltrame. “A insatisfação com o secretário é grande. Já deu. Ele perdeu a confiança do governo, da Assembleia, da sociedade”, disse um deputado peemedebista. Ele perdeu o respaldo diante da base aliada, que se calou quando o todo-poderoso Jorge Picciani – presidente da casa – se meteu no assunto.
Para além da fama de um deus no Olimpo, não se pode negar que Beltrame é um bom estrategista e que o marketing foi seu grande aliado. Beltrame deixou o Rio como encontrou: com ruas e túneis fechados, fachadas de condomínios de luxo perfuradas de balas, ônibus apedrejados, disputas entre facções, corpos esquartejados nas ruas. Proferiu impropérios como: não se pode “fazer um bolo sem quebrar ovos” – em referência ao alto número de balas perdidas em operações policiais –, o que é flagrantemente ratificado pelas suas palavras sectárias e racistas na frase: “Um tiro em Copacabana é uma coisa. Na Favela da Coreia é outra“. Mas apesar disso tudo, a imagem que ficou é a de “nome de prestígio”.
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