Brazil's President Michel Temer speaks at the Planalto Palace in Brasilia, Brazil, May 18, 2017. REUTERS/Ueslei Marcelino ORG XMIT: BRA107

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Imprensa ensaia operação abafa diante de suposta estabilidade econômica evocada por Temer

Enquanto Folha, Veja e Estado tentavam mudar foco da política para o capital, O Globo seguia agarrado ao furo.

Brazil's President Michel Temer speaks at the Planalto Palace in Brasilia, Brazil, May 18, 2017. REUTERS/Ueslei Marcelino ORG XMIT: BRA107

A manchete de hoje da Folha de S.Paulo – “Temer afirma que não renuncia; áudio sobre Cunha é inconclusivo” – causou desalento a uma grande parcela da população que anseia por ver Eduardo Cunha e Michel Temer na mesma vala comum da história. A Folha tem razão quando diz que não se pode concluir que Temer tenha incentivado a compra do silêncio de Cunha com base no trecho noticiado pelo Globo, mas erra ao escolher, diante da infinidade de maus feitos revelados, destacar isso.

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Capa da Folha de São Paulo desta sexta-feira (19).

Reprodução

Na quarta-feira (16), uma nação perplexa assistira a Willian Bonner e Renata Vasconcellos iniciarem o Jornal Nacional com um trecho bombástico da reportagem de O Globo:

Bonner: “O dono da JBS grava conversa como presidente Michel Temer…”

Renata: “Diz ao presidente que paga pelo silêncio de Eduardo Cunha e Lúcio Funaro na Prisão.

Bonner: “E Temer responde: ‘tem que manter isso, viu?”

O áudio divulgado ontem, contudo, revelou que a conversa não havia sido exatamente assim. A fala “tem que manter isso, viu?” vem depois de Joesley Batista dizer: “eu tô de bem com o Eduardo, ok?”.

A Folha não comete erro de informação ao cravar que, especificamente no que se refere à anuência de Temer sobre a propina de Cunha, o áudio é inconclusivo. Tudo bem que a informação é um tanto relativa. Afinal, o que é conclusivo para um pode não ser para outro (vide as redes sociais de coxinhas e petralhas). Mas, vá lá, que o trecho seja inconclusivo. Isso justifica a manchete?

De tudo que há no áudio, de todas as notícias avassaladoras do dia de ontem, o mais relevante era, de fato a dubiedade de um trecho?

De tudo que há no áudio, de todas as notícias avassaladoras do dia de ontem, o mais relevante era, de fato a dubiedade de um trecho? Uma breve espiada nas edições impressas da concorrência sugere que não. O Globo: “‘NÃO RENUCIAREI’: em gravação, Temer ouve dono da JBS relatar crimes”. O Estado de S.Paulo: “STF manda investigar Temer; presidente diz que não renuncia”.

Então o que houve? Deu a louca na Folha? As pistas para se buscar uma resposta estão lá mesmo, na primeira página do maior jornal do país, nas duas chamadas de maior destaque. Primeira: “No país, 2,9 mi estão em busca de emprego há mais de 2 anos”. A segunda: “Bolsa tem pior queda desde 2008; dólar à vista sobe 8,7%”. Em outras palavras, como diz o bordão neoliberal, “é a economia, estúpido”.

Não é de hoje que o jornal e boa parte da imprensa ensaiam fechar com o governo Temer como o menor dos males. No dia 13 de agosto do ano passado por exemplo, em pleno sabadão, a Folha se saía com a seguinte manchete: “Governo vê indícios de melhora na arrecadação”.

Mas voltemos à capa da edição de hoje. Não foi um pouco demais apelar para a economia em meio a uma tormenta do calibre da atual? Seria, talvez, apenas um editor tresvariado, a pressa do fechamento, um caso de cegueira momentânea, causada pelo brilho da careca de Henrique Meirelles? Ao que parece, não.

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Destaques da homepage da Folha de São Paulo na manhã de sexta-feira (19)

Reprodução

Durante toda a manhã e até o começo da tarde, a manchete no site da Folha vinha oficiosa qual um Pravda tropical: “Planalto desconfia que gravação de Joesley foi editada e envia áudio de Temer a perito”. Linha finda do título parte 1: “Conversa desperta suspeita, mas não leva a conclusão”. Parte 2: “Temer afirma que não acreditou nas declarações”. É ou não é um belo serviço de relações públicas?

Mas, bem, pelo menos o restante da grande imprensa manteve algum decoro e seguiu apertando o governo, certo? Não exatamente.

Mas, bem, pelo menos o restante da grande imprensa manteve algum decoro e seguiu apertando o governo, certo? Não exatamente. Pela manhã, o site do Estado já havia mudado o foco da política para a economia: “Após dia de tensão no mercado, dólar abre em queda e Bolsa tem leve alta”. O site de Veja, com todo o seu conservadorismo, resistiu um pouco mais. Pela manhã, continuava a bater no moribundo presidente “Ótimo, diz Temer, ao ouvir de Joesley estratégia para barrar investigações”. O lapso petralha, contudo, não duraria muito. Pouco depois do meio dia, o capital havia voltado ao comando da casa dos Civita: “Bolsa sobe e dólar opera em queda após abalo no governo Temer”.

Em mares revoltos, façamos, portanto, um resumo da rota que nossa brava imprensa vinha tentando traçar para si. Folha se colocava como porta voz do governo. O Estadão, de uma hora pra outra, circunscrevia a tensão como pertencente ao “mercado”. Veja passava a retratar a hecatombe política como um “abalo no governo Temer”. Ironicamente, portanto, a mídia escrita tradicional estava pendurada em O Globo, que, às 12h43, seguia apegado ao furo e trazia, em seu site, a seguinte manchete: “Dono da JBS relata tentativa de barrar investigações; Temer responde ‘ótimo, ótimo’”.

No início da tarde, nova reviravolta. Foram divulgados os vídeos da delação premiada de Joesley Batista, assim como o pedido de abertura de investigação sobre Temer, feito ao Supremo pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Diante do agravamento da crise, ficou impraticável manter os panos quentes da estabilidade econômica e a imprensa voltou a fustigar o governo. A patacoada matinal, contudo, deixou a impressão de que há um punhado de editores tentando desesperadamente enxugar a enxurrada de fatos que inunda a nação e transforma o futuro, incluindo Bolsa e dólar, num oceano de incerteza.

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Quando o assunto é a ascensão da extrema direita no Brasil, muitos acham que essa é uma preocupação só para anos eleitorais. Mas o projeto de poder bolsonarista nunca dorme.

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