Já ficou mais que provado que a Venezuela e seu presidente, Nicolás Maduro, são os alvos prediletos da ira da administração Trump. No início de um encontro sobre a América Central em Miami, na semana passada – à margem do anúncio sobre sua retrógrada política em relação à Cuba –, o presidente Donald Trump disse ao secretário de Estado, Rex Tillerson, para “colaborar com os países da região de modo a fazer avançar as discussões sobre a Venezuela”, afirma um comunicado da Casa Branca. “Os Estados Unidos estão ao lado do povo venezuelano nesses tristes e preocupantes tempos para seu país.”
No entanto, esse diplomático discurso de Tillerson ficou por Miami mesmo. No dia seguinte a essa declaração da Casa Branca, o secretário de Estado norte-americano cancelou sua participação na 47ª Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), cuja reunião em Cancún tem a Venezuela como assunto principal. Em vez de ir lá pessoalmente, Tillerson permanecerá em Washington para enfrentar as crescentes tensões no Golfo Pérsico.
Essa mudança de planos reflete as prioridades do Departamento de Estado norte-americano, mas também evita que Tillerson confronte seu nebuloso passado com a Venezuela.
A Assembleia da OEA ocorre em um momento em que a Venezuela está atormentada por uma inflação galopante, pela falta de alimentos, por uma infraestrutura médica decrépita e por uma agitação política violenta. Todos esses fatores são catalisados por outra crise diplomática: em abril, a ministra das Relações Exteriores de Maduro, Delcy Rodríguez, anunciou que, após 65 anos, a Venezuela vai se retirar da OEA por considerar a principal instância diplomática do hemisfério um braço de uma campanha para derrubar o regime de Maduro.
As crises da Venezuela são ainda mais vexatórias porque o país onde as pessoas hoje morrem de fome foi outrora o mais rico da América Latina – a Venezuela possui as maiores reservas comprovadas de petróleo do mundo.
É aqui que Rex Tillerson, ex-presidente da Exxon, entra na história. Enquanto Tillerson dirigia a gigante do petróleo, posição deixada por ele para se juntar ao governo Trump, a empresa sofreu um duro golpe de Hugo Chávez, o antecessor e mentor de Maduro. Em 2007, Chávez nacionalizou os ativos venezuelanos da petroleira, avaliados em US$ 10 bilhões. A ExxonMobil voltou a enfrentar Maduro em 2015, numa disputa sobre quem tinha o direito de perfurar em águas na costa da Guiana. Dessa vez, foi Tillerson quem ganhou a queda de braço.
Apesar da conflituosa história de Tillerson com a Venezuela, o país parecia disposto a trocar figurinhas com a administração Trump. Uma empresa petrolífera estatal venezuelana doou US$ 500 mil para a posse de Trump e, em fevereiro, empresários norte-americanos ligados a Trump se encontraram com membros do Conselho de Segurança Nacional, incluindo o principal assessor da Casa Branca Steve Bannon, para discutir o fim das sanções contra a Venezuela. Maduro, por sua vez, tomou posição mais suave do que poderia se esperar de um instigador do anti-imperialismo ianque. “Ele não será pior do que Barack Obama”, disse o líder venezuelano quando Trump tomou posse, comparando o novo presidente americano com seu antecessor.
As boas relações, logo azedaram, no entanto. À medida que a atual onda de violentos protestos anti-Maduro cresceu nos últimos meses, Trump logo começou a falar em intervenção e novas sanções. Em meados de maio, ele anunciou sanções contra oito membros do Supremo Tribunal da Venezuela depois de a corte anular os poderes da Assembleia Nacional por desrespeitar as regras do Congresso venezuelano. Maduro descreveu as sanções dos EUA como uma tentativa de golpe e bradou: “Tire suas mãos imundas da Venezuela!”
No entanto, o principal diplomata de Trump não vai por a mão na massa para fazer avançar as discussões continentais para enfrentar a crise na Venezuela. Em vez disso, a bomba cairá no colo de John Sullivan, o vice de Tillerson – Sullivan é um burocrata republicano de longa data, mas com pouca experiência em diplomacia, e muito menos sobre a Venezuela.
Tradução: Charles Nisz
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