O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, foi criticado por democratas e republicanos em abril por seu apoio entusiasmado a uma das violações de direitos humanos mais descaradas do mundo atual: a campanha assassina do presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, contra as drogas em seu país. Desde que Duterte assumiu o governo, em junho de 2016, esquadrões da morte compostos por policiais e justiceiros mataram mais de 7,000 pessoas, arrasando comunidades pobres em todo o país.
O documentário O Inferno de Duterte (Duterte’s Hell, no original em inglês), dirigido por Aaron Goodman e Luis Liwanag e produzido pela Field of Vision, mostra imagens fortes da ação da polícia filipina examinando e transportando cadáveres – e o sofrimento de familiares e amigos frente aos assassinatos patrocinados pelo governo.
Na campanha para a eleição presidencial de 2016, Duterte pregou o extermínio em massa de todos os envolvidos no negócio das drogas – não apenas dos traficantes mas também dos usuários. “Hitler massacrou três milhões de judeus”, disse Duterte em setembro. “Agora existem três milhões de viciados em drogas. Eu trucidaria todos eles com prazer”, acrescentou.
Em abril, Donald Trump chocou os observadores da crise filipina ao ligar para Duterte, convidando-o a visitar a Casa Branca – uma conversa descrita pelos assessores de Trump como “muito amistosa”. Algumas semanas depois, o Intercept, em parceria com o portal de notícias filipino Rappler, obteve e publicou uma transcrição da ligação, revelando os louvores do presidente americano à política antidrogas filipina. “Fiquei sabendo do incrível trabalho de vocês na questão das drogas”, elogiou.
Grupos de defesa dos direitos humanos relatam a ação de pequenos grupos de policiais à paisana ou justiceiros que executam pessoas nas ruas e invadem casas nas comunidades mais pobres. Policiais uniformizados costumam chegar na cena do crime para plantar armas ou drogas, de forma a justificar as mortes.
“Juro pela minha família que meu filho não era traficante. Ele estava desarmado”, lamenta uma mãe para as câmeras, aos prantos. “Por favor, contem ao mundo inteiro. Por favor, me ajudem! Meu filho não é cachorro. Ele não é cachorro nem porco para ser morto assim”, diz.
Filmado em Manila, capital das Filipinas, o documentário da Field of Vision mostra o impacto nas favelas da política antidrogas, cuja brutalidade desproporcional levou a Anistia Internacional a caracterizá-la como “uma guerra assassina contra os pobres”. O Inferno de Duterte mostra de perto a reação dos moradores e a dor das mães das vítimas, enquanto a polícia recolhe os corpos para dentro de carros funerários.
Por que Duterte concentra sua campanha sanguinária nas favelas das cidades, e não nos usuários de drogas mais abastados? Segundo a revista The New Yorker, quando questionado por grupos de combate à pobreza, o presidente filipino explicou que os usuários ricos se deslocam jatinhos particulares, e o governo “não tem dinheiro para aviões de caça”.
Duterte já era famoso por assassinatos extrajudiciais muito antes de se tornar presidente. Em 1996, como prefeito de Davao, uma cidade portuária no sul da ilha de Mindanao – seu reduto eleitoral – Duterte empregava um esquadrão da morte com centenas de membros para matar criminosos e reprimir opositores. Diversos ex-membros do grupo disseram que a ordem para matar vinha pessoalmente de Duterte, e o próprio presidente chegou a se gabar de haver matado pessoas da garupa de uma motocicleta.
Rodrigo Duterte não deixa de ser um produto do ambiente político em que foi criado. Ele é o primeiro presidente das Filipinas oriundo da ilha de Mindanao, um lugar com uma longa e conturbada história colonial. Durante séculos, a comunidade muçulmana do sul da ilha resistiu aos espanhóis, que já haviam conquistado o norte e tentavam difundir a religião católica no país. Depois da Guerra Hispano-Americana, milhares de pessoas morreram durante a campanha de “pacificação” promovida pelos EUA em Mindanao.
O legado desse passado foi fazer de Mindanao um berço para diversos grupos armados, terroristas e organizações criminosas ao longo dos anos, e a brutalidade da luta de Duterte contra essas organizações lhe valeu um apelido do qual ele se orgulha até hoje: “o prefeito do esquadrão da morte”.
Tradução: Bernardo Tonasse
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