“A democracia custa caro.” É assim que o deputado Vicente Cândido (PT-SP), relator da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 77/2003, de reforma política, iniciou o capítulo voltado para a defesa do financiamento público de campanhas eleitorais em seu parecer, divulgado nesta quarta (9). Caso o texto seja aprovado até o dia 7 de outubro em Brasília, isso significará que, já nas eleições de 2018, os cofres da União terão que desembolsar R$ 3,6 bilhões para bancar a divulgação de candidaturas de políticos.
Para se ter uma ideia, com esse dinheiro, seria possível pagar mais ou menos um mês e meio de Bolsa Família para as atuais 13,2 milhões de famílias beneficiadas pelo programa em todo o país. Os recursos equivalem ainda, por exemplo, à metade do orçamento da Saúde previsto para este ano em São Paulo, maior cidade do país.
Vicente – apontado com o apelido “Palmas” na lista da Odebrecht – resume em sete parágrafos os motivos para a criação do Fundo Especial de Financiamento da Democracia (FFD). O nome é bonito, mas ele mesmo escorrega na hora de justificar a necessidade de colocar a dinheirama nas mãos dos políticos:
“Candidatos e partidos políticos, por sua vez, gastam com organização de campanhas, pessoal contratado e propaganda eleitoral montantes considerados assustadores por vários analistas. Trabalho realizado pelo brasilianista David Samuels, professor de ciência política da Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos, constatou que as eleições brasileiras são as mais caras do mundo. Segundo o TSE, as eleições gerais de 2014 custaram aproximadamente 5,1 bilhões de reais.”
Montantes “assustadores”
Teoricamente, se tínhamos em 2014 as eleições mais caras do mundo, de montantes “assustadores”, isso era para ser algo a ser mudado, correto?
Na lógica invertida de Brasília, porém, é motivo para justificar a injeção de dinheiro público nas campanhas. E nem precisamos mencionar que 2014 pode ter sido o ano de eleições das mais corrompidas já vistas. Só a Odebrecht, por exemplo, teria distribuído cerca de R$ 40 milhões em caixa 2. Mas enfim, deixa isso para lá.
Seguindo na sua tese, o deputado cita as eleições municipais de 2016 que, pela primeira vez, contaram exclusivamente com doações de pessoas físicas. Em uma era em que as redes sociais estão ao alcance da palma da mão da boa parte da população, o que se viu foram campanhas mais modestas, ruas menos sujas e por aí vai. Ou seja, melhorou.
“Com o fim das doações de empresas, não haverá recursos suficientes para a realização de campanhas já nas próximas eleições.”
Mas, para Vicente, “o fim do financiamento eleitoral oriundo de pessoas jurídicas… representou uma redução de quase 50% em relação aos gastos verificados quatro anos antes, que foram da ordem de 6 bilhões de reais, devidamente corrigidos pela inflação.” E isso quer dizer que “com o fim das doações de empresas, não haverá recursos suficientes para a realização de campanhas já nas próximas eleições.”
Pelo que vimos em 2016, com uma campanha exclusivamente bancada por pessoas físicas, a frase do deputado soa, no mínimo, como um alarmismo para 2018.
E a pergunta que fica é: a democracia depende mesmo de uma fortuna em dinheiro público nas campanhas para sobreviver?
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