HERAT, AFGHANISTAN - NOVEMBER 4:  Surrendering Taliban militants stand with their weapons as they are presented to the media on November 4, 2010 in Herat, Afghanistan. Twenty Taliban fighters from Afghanistan's Herat province have surrendered to government troops in Herat, west of the capital city of Kabul. After an amnesty launched by President Hamid Karzai in November 2004, hundreds of anti-government Taliban militants have since surrendered to the government. (Photo by Majid Saeedi/Getty Images)

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O Talibã já tentou se render, os Estados Unidos rejeitaram e guerra do Afeganistão não tem fim

Donald Trump está prestes a repetir os mesmos erros já cometidos pelos Estados Unidos no Afeganistão.

HERAT, AFGHANISTAN - NOVEMBER 4:  Surrendering Taliban militants stand with their weapons as they are presented to the media on November 4, 2010 in Herat, Afghanistan. Twenty Taliban fighters from Afghanistan's Herat province have surrendered to government troops in Herat, west of the capital city of Kabul. After an amnesty launched by President Hamid Karzai in November 2004, hundreds of anti-government Taliban militants have since surrendered to the government. (Photo by Majid Saeedi/Getty Images)

Você sabia que o Talibã tentou se render pouco tempo depois de os Estados Unidos invadirem o Afeganistão?

Segundo a tradição afegã, há séculos, quando uma força rival vence, os derrotados depõem as armas e se integram à nova estrutura de poder. Claro, com muito menos poder – às vezes, sem poder nenhum. É o que tem que ser feito para que a convivência entre vizinhos continue a ser possível. Não é que nem jogo de futebol, os times não voltam para suas respectivas cidades depois que tudo acaba. Para os norte-americanos, pode ser difícil lembrar que é assim que as coisas funcionam, já que os Estados Unidos não vivem uma guerra prolongada sobre o próprio território desde a Guerra Civil.

Quando o Talibã quis se entregar, os Estados Unidos recusaram a rendição repetidas vezes, em uma série de trapalhadas arrogantes, relatadas por Anand Gopal em seu livro “No Good Men Among the Living”, uma investigação sobre a guerra do Afeganistão.

Só a completa aniquilação do inimigo interessava ao governo Bush. O que eles queriam era empilhar mais e mais corpos de terroristas. O problema é que os talibãs já tinham parado de lutar: tinham fugido para o Paquistão ou se reinserido na vida civil. E a Al Qaeda se resumia a um punhado de combatentes.

Mas se não há mais terroristas, como matá-los?

Fácil: afegãos que colaboravam com os Estados Unidos entenderam o dilema do aliado militar e inventaram vilões. A demanda sempre acaba gerando oferta, e os Estados Unidos passaram a pagar por informações que levassem à morte ou à captura de soldados talibãs. De repente, havia talibãs por todos os lados e a vingança correu solta: para matar um vizinho ou mandá-lo para Guantânamo, bastava dizer aos Estados Unidos que se tratava de um membro do Talibã.

Invadiam-se casas e arrombavam-se portas sem nem precisar explicar por quê. Os que foram poupados se tornaram senhores da guerra, enriqueceram e mandaram sua fortuna para o exterior. “Não estamos construindo novamente uma nação”, afirmou o presidente Donald Trump na segunda-feira. Bem, na verdade, nós, americanos, nunca construímos nada por lá – a menos que erguer arranha-céus em Dubai à base de dinheiro sujo conte.

Depois de anos vivendo essa farsa e vendo seus esforços de rendição serem ignorados, o antigo Talibã voltou a pegar em armas. Na época em que foram derrubados do poder, a população tinha ficado feliz em vê-los partir. Mas os Estados Unidos conseguiram torná-los novamente populares.

Os liberais passaram a campanha presidencial de 2008 reclamando que os EUA tinham “ignorado” o Afeganistão — quando, na verdade, as regiões sem a presença de tropas eram as únicas em paz, sem nenhum tipo de insurgência contra o governo afegão. Aí o então recém-empossado presidente Barack Obama resolveu aumentar o efetivo militar, ao mesmo tempo em que anunciava a retirada das tropas. Além disso, ampliou bombardeios noturnos, confiando no mesmo sistema questionável de inteligência que já tinha custava a vida a tantos inocentes.

E agora Trump vem dizer que tem uma estratégia nova e melhor. Segundo ele, os Estados Unidos precisam fazer com que o Paquistão se envolva mais – só que, claro, o serviço de inteligência paquistanês sustenta o Talibã há decadas.

O livro de Gopal é o relato cabal de um conflito que saiu dos trilhos. Parece um livro de ficção, mas é o perfil bem real de três afegãos que viveram a guerra: um senhor da guerra pró-Estados Unidos, um comandante talibã e uma dona de casa. Eu recomendaria a leitura a Trump. O livro traz uma grave advertência ao tipo de esforço de guerra que o presidente está prestes a intensificar. O problema é que tem mais de uma página – e, de acordo com seus assessores, esse é o máximo que ele consegue processar. No mais, a única coisa que interessa mesmo a Trump é o fato de o Afeganistão ter um monte de minerais – que ele acha que o país deve aos Estados Unidos.

Antes de sair gastando os lucros que pretende fazer com os minérios afegãos, Trump deveria parar para pensar na dura realidade: os Estados Unidos estão perdendo a guerra para um inimigo que já tinha se entregado. É uma proeza para poucos.

Foto em destaque: Combatentes talibãs que queriam se render mostram armas a repórteres em Herat, Afeganistão (04/11/2010).

Tradução: Carla Camargo Fanha

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