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Vídeo: Como a internet normalizou a supremacia branca

As comunidades virtuais ajudaram a radicalizar e construir a identidade de muitos jovens americanos.

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Uma das imagens mais chocantes da marcha “Unir a Direita” – realizada no dia 11 de agosto em Charlottesville, no estado americano da Virgínia – foram as centenas de jovens de tochas na mão, manifestando-se a favor do nacionalismo branco.

Após a morte da ativista Heather Heyer, assassinada pelo militante de extrema-direita James Alex Fields Jr., de 20 anos, que jogou seu carro contra a multidão de manifestantes antirracismo, uma intensa cobertura midiática tem tentado explicar por que o movimento supremacista branco vem se organizando cada vez mais. A desumanização de grupos marginalizados – imigrantes, minorias raciais e muçulmanos – tem tido cada vez mais protagonismo na grande mídia conservadora e no discurso do Partido Republicano, culminando na intolerância descarada da campanha eleitoral de Donald Trump. Muitos especialistas veem o fenômeno do crescimento das organizações de direita radical e racistas como uma reação à alteração do perfil demográfico americano, aos direitos recém-conquistados por gays e lésbicas e ao aumento do poder econômico das mulheres.

Por mais que esses fatores sejam reais, essa radicalização também tem origem em comunidades virtuais onde muitos jovens americanos construíram uma identidade de grupo – para só então passar à ação violenta no mundo real a que estamos assistindo. O The Intercept investigou o fenômeno, explorando as dinâmicas de raça, violência e cultura virtual em um curto documentário que pode ser acessado acima.

Nos últimos anos, muitos grupos neonazistas – que antes dependiam de programas de rádio alternativos e editoras de fudo de quintal para difundir suas ideias – passaram a se aglutinar em torno de fóruns de videogames; sites de sarcásticos trolls da “alt-right” – termo que designa uma nova “direita alternativa”, defensora de ideias de extrema-direita fundadas sobre a supremacia branca; e do chamado “Movimento pelos Direitos dos Homens” para recrutar novos membros, aproveitando-se do descontentamento de muitos jovens para incutir-lhes ideias extremistas. O humor negro que se propaga nesses fóruns de discussão de limites e temáticas mal demarcadas normaliza as ideias de guerra racial e genocídio, gerando verdadeiras batalhas entre identidades raciais. Esse caldeirão virtual tem alimentado o crescimento da “alt-right” e de organizações racistas.

Sem uma compreensão do papel desempenhado pelas comunidades virtuais, será muito difícil deter o avanço do nacionalismo branco.

James Fields, por exemplo, foi fotografado usando um escudo da Vanguard America, um dos grupos da “alt-right” criados recentemente para recrutar mais e mais jovens para o movimento supremacista branco, principalmente nas faculdades americanas. O perfil de Fields no Facebook estaria cheio de imagens humorísticas sobre o poder do “ativismo nerd” e memes como Pepe, o Sapo, um inocente personagem apropriado por trolls e transformado em símbolo neonazista; e o Feels Guy, um desenho tosco de um homem careca e triste criado no fórum “4chan” para representar o isolamento social e a dor existencial. Os folhetos de divulgação da manifestação também continham imagens jocosas de memes famosos.

O 4chan, um site que adora ofender as sensibilidades modernas com provocações sobre raça, violência e sexualidade, tornou-se um centro de recrutamento para o movimento nacionalista branco. Mas essa ideologia nem sempre teve tanto espaço no 4chan. Durante muito tempo, a página foi apenas uma plataforma de socialização para várias subculturas interessadas em mangás, animes e humor negro, além de ser um espaço de “trollagem”, a prática de atacar ou perseguir pessoas por pura diversão. Dale Beran, escritor e estudioso do 4chan, conta que seus usuários costumavam se reunir para “fazer incursões” nos servidores de Habbo Hotel, um jogo online para crianças, “apenas por ser uma maneira divertida de passar seu quase ilimitado tempo livre”.

Nos últimos anos, entretanto, as campanhas de “trollagem” do 4chan têm se aventurado no terreno do debate político sobre multiculturalismo e diversidade. A polêmica do “gamergate”, que desencadeou uma onda de assédio e ameaças a mulheres na internet – alimentada pela profunda misoginia do 4chan – forneceu munição para o ódio conspiracionista contra feministas e defensores de políticas identitárias progressistas.

Os usuários do 4chan aproveitam toda e qualquer oportunidade para “trollar” o que a escritora Angela Nagle chama de Tumblr-liberalism (“esquerdismo de rede social”, em tradução livre), um discurso de esquerda que, segundo Nagle, chegou ao “cúmulo do absurdo com uma política baseada nas minúcias e gradações de identidades em rápida proliferação”. Esse discurso nascente, analisado pela autora em seu novo livro sobre as guerras culturais na internet, Kill All Normies (“Morte aos Normies”*, em tradução livre), baseia-se em práticas vexatórias na internet, repreendendo publicamente todo tipo de comportamento percebido como ofensivo para sensibilidades identitárias em constante evolução.

Um exemplo notável desse discurso progressista radical citado por Nagle é o caso de um escritor “antirracista” que usou a tragédia de uma criança – morta por um jacaré – para criticar o comportamento de “homem branco mimado” de seus pais.

Em reação a essas tentativas de ridicularizar os brancos, uma parte da direita está se apegando a uma identidade de branco vitimizado. Para comunidades como o 4chan, que nunca conheceu limites, o apego à identidade branca foi levado ao extremo.

US actor Shia LaBeouf(L)is seen during his He Will Not Divide Us livestream outside the Museum of the Moving Image in Astoria, in the Queens borough of New York January 24, 2017 as a protest against President Donald Trump. LaBeouf has installed a camera at the Museum of the Moving Image in New York that will run a continuous live stream for the duration of Trumps presidency. LaBeouf is inviting the public to participate in the project by saying the phrase, He will not divide us, into the camera. / AFP / TIMOTHY A. CLARY (Photo credit should read TIMOTHY A. CLARY/AFP/Getty Images)

O ator Shia LaBeouf no vídeo He Will Not Divide Us, no lado de fora do Musem of the Moving Image, em Nova York, em 24 de janeiro de 2017. Foto: Timothy A. Clary/AFP/Getty Images

Por exemplo, uma enxurrada de trolls tumultuou um projeto do ator Shia LaBeouf chamado He Will Not Divide Us (“Ele não vai nos dividir”, em português), que consistia em instalar uma webcam em Nova York para que as pessoas pudessem exprimir seu repúdio a Donald Trump ao vivo na internet, 24 horas por dia. Assim que a transmissão começou, o 4chan se mobilizou para “trollar” o projeto: uma multidão de jovens passou diante da câmera exibindo símbolos racistas.

As constantes brincadeiras dos supremacistas acabaram obrigando LaBeouf a encerrar a transmissão, transferindo a câmera para um lugar discreto no interior do estado do Tennessee, onde ela foi fixada diante de uma bandeira com o lema do projeto. Mais uma vez, o 4chan aproveitou para ridicularizar a iniciativa. Em um esforço de investigação coletiva, os usuários do site logo identificaram o local da transmissão e roubaram a bandeira, graças à análise da rota de um avião que passou diante da câmera e a um voluntário que percorreu o estado de carro, buzinando por onde passava.

Essas “pegadinhas” espalhafatosas vinham cada vez mais misturadas com demonstrações despudoradas de nacionalismo branco. Muitos visitavam o site para postar casualmente algum meme racista; porém, para outros, os memes humorísticos se tornaram uma ponte para uma associação formal com o movimento nacionalista branco. Em outras palavras, esses usuários postaram tantas piadas sobre genocídio ou estupro que ficaram suscetíveis ao discurso de grupos de ódio – uma transformação conhecida no mundo dos fóruns virtuais como irony poisoning (“evenenamento por ironia”, em uma tradução literal).

Em uma postagem recente, um usuário do 4chan evidenciou o elo entre as brincadeiras sarcásticas na internet e o nacionalismo branco. “A ‘alt-right’ é uma tentativa de dar uma nova roupagem ao nacionalismo branco”, escreveu. “Trata-se de usar memes irônicos que não significam nada para nossos inimigos, mas que os normies acham engraçados, para que as pessoas desenvolvam uma consciência política racial.”

No arquivo de postagens do 4chan, vemos uma fluxo constante de mensagens incentivando os usuários a se alistar em diversas organizações nacionalistas brancas, como o Traditionalist Worker Party, a Vanguard America e a Identity Evropa. “Se você está procurando a organização menos autista**, venha para a Identity Evropa”, diz uma postagem no site, afirmando que o grupo estaria “tentando alcançar objetivos realistas”. Algumas pessoas, como Andrew Anglin, fundador do Daily Stormer, um site de propaganda supremacista branca inspirado no semanário da era nazista Der Stürmer, chegaram a caracterizar a transformação do 4chan em um site de ódio como um marco em sua jornada em direção à radicalização.

Ativistas conservadores começaram a perceber que havia uma guerra cultural em curso na internet e aproveitaram a oportunidade para se lançar como personalidades antissistema, dispostos a desafiar as normas politicamente corretas de gênero e raça, na esperança provocar uma reação exagerada da esquerda.

Christopher Cantwell, supremacista branco flagrado pelas câmeras nos confrontos de Charlottesville, era um importante ativista do “Movimento pelos Direitos dos Homens”, da mesma forma que Mike Cernovich, um conhecido líder da “alt-right” e adepto de primeira hora de Trump. A misoginia, um conceito muito menos estigmatizado na sociedade americana do que a supremacia branca – principalmente entre jovens com dificuldades no mundo dos relacionamentos – se tornou “uma porta de entrada para a ‘alt-right’”. O machismo atrai, o racismo fideliza.

O recém-demitido chefe de estratégia de Donald Trump, Steve Bannon, tentou forjar um laço com as entranhas do 4chan e outros sites similares. “Esses caras, esses homens brancos desarraigados, tinham um poder monstruoso”, descobriu Bannon quando trabalhava em uma startup – hoje já exinta – criada para monetizar a acumulação da moeda virtual do jogo online World of Warcraft, segundo o livro Devil’s Bargain (“Pacto com o diabo”, em tradução livre), do jornalista Joshua Green. Quando assumiu o controle do portal Breitbart News, Bannon logo se empenhou em mobilizar o exército de trolls revoltados de sites como o 4chan. “A verdade é que a audiência da Fox News era geriátrica, e ninguém estava tentando falar com o público mais jovem”, disse Bannon. A decisão de contratar um editor de tecnologia chamado Milo Yiannopoulos, cuja especialidade no Breitbart era gerar conteúdo intencionalmente ofensivo, era uma tentativa de atrair a horda de usuários do 4chan para se fortalecer politicamente.

Em um artigo para a National Review, o escritor Elliot Kaufman observa que a direita logo adotou a tática de provocar o campo progressista a fazer “alguma besteira violenta”, transformando os conservadores em vítimas dos excessos da esquerda e bastiões da liberdade de expressão. Em outras palavras, “trollar” esquerdistas se tornou uma eficiente maneira de recrutar jovens conservadores, principalmente em cidades universitárias, onde o humor vulgar tem boa penetração em todos os campos do espectro ideológico. Isso se tornou uma opção tão sedutora que diversos grupos ligados ao Partido Republicano começaram a convidar personalidades da “alt-right”, inclusive aquelas com um conhecido histórico de antissemitismo, racismo e machismo, para dar palestras em universidades de todo o país.

Enquanto isso, as redes sociais continuavam produzindo um fluxo inesgotável de conteúdo para provocar o campo progressista. Diversos canais do YouTube atraíram milhões de espectadores ao ridicularizar os excessos da política identitária da esquerda – como uma iniciativa para proibir a participação de pessoas brancas em aulas de ioga, ou os intermináveis debates sobre se os brancos estariam roubando a “propriedade intelectual” dos mexicanos ao abrir lanchonetes mexicanas.

BERKELEY, CA - APRIL 15: Trump supporters chase after protesters at a "Patriots Day" free speech rally on April 15, 2017 in Berkeley, California. More than a dozen people were arrested after fistfights broke out at a park where supporters and opponents of President Trump had gathered. (Photo by Elijah Nouvelage/Getty Images)

Partidários de Donald Trump perseguem manifestantes em uma marcha pela liberdade de expressão em Berkeley, na Califórnia, em 15 de abril de 2017.

Foto: Elijah Nouvelage/Getty Images

Muitas ricas fundações de direita também logo aderiram à estratégia de “trollagem universitária” para tentar atrair as novas gerações. A Young America’s Foundation – financiada pela Fundação Koch –, a Turning Point USA e o bilionário Robert Mercer, desejosos de incentivar o novo fenômeno, financiaram palestras incendiárias em universidades americanas. Mercer, um magnata dos fundos de investimento de alto risco que, junto com sua filha, é um dos financiadores do Breitbart, do Media Research Center e de outros grupos pró-Trump, patrocinou discretamente uma turnê universitária de Yiannopoulos, cujos insultos preconceituosos e piadas de mau gosto proferidas nos auditórios dos campi tinham o claro objetivo de humilhar minorias e provocar a esquerda.

Isso acabou nos conduzindo ao maior espetáculo de violência já inspirado pelas guerras culturais da internet. Em fevereiro, Yiannopoulos teve que cancelar um comício em Berkeley quando ativistas de esquerda promoveram distúrbios dentro e fora do campus. Para muitos membros da esquerda, o tiro disparado contra um manifestante em uma visita anterior de Yiannopoulos era a prova da necessidade de impedir que esses eventos continuassem acontecendo. Um boato não confirmado também circulava entre a esquerda, segundo o qual Yiannopoulos iria de alguma forma revelar a identidade dos imigrantes ilegais que estudavam em Berkeley. Não se sabe se Yiannopoulos realmente tinha uma lista de imigrantes ilegais. De qualquer forma, evitar a realização do evento não impediria a revelação dos nomes na internet.

Os vídeos da revolta em Berkeley logo viralizaram, mostrando supostos fãs de Yiannopoulos sendo agredidos e atacados com spray de pimenta. Um homem teria sido agredido por antifascistas porque seu terno o fazia “parecer um nazista”.

As personalidades da extrema-direita, que em sua maioria já haviam conquistado uma legião de seguidores na internet durante a campanha de Donald Trump, logo aproveitaram os acontecimentos para se apresentar como vítimas de perseguição. Depois de anos de insignificantes acusações de opressão por parte da esquerda, finalmente havia um exemplo concreto para mobilizar quem se sentia incomodado com a “ditadura do politicamente correto”. Houve um chamado à resistência em Berkeley. Era preciso “defender a liberdade de expressão”.

É difícil afirmar quantos neonazistas de verdade estiveram presentes no comício de Yiannopoulos em fevereiro, mas as organizações nacionalistas brancas transformaram a cidade em um centro de mobilização, forjando uma aliança de conveniência com outras figuras conservadoras, também desejosas de explorar a oportunidade. Uma mescla de paramilitares, ultraliberais, nacionalistas brancos e caçadores de emoção acorreu nos meses seguintes a Berkeley para combater a esquerda em manifestações “pela liberdade de expressão”. Eles portavam não só armas como também câmeras, para filmar e transmitir os confrontos pela internet.

Mas a extrema-direita também explorou – e festejou – imagens de seus próprios membros agredindo os inimigos esquerdistas para ganhar notoriedade, em um terrível prenúncio da fúria assassina de Fields na Virgínia.

A violência nas ruas alimenta a rede de canais da “alt-right” no YouTube e contribui para o esforço dos grupos nacionalistas brancos em expandir sua influência nos EUA. Berkeley foi um marco para a Identity Evropa em particular, uma organização supremacista que recruta seus seguidores principalmente em fóruns de discussão e universidades.

An injured Trump supporter covers his bleeding mouth during a free speech rally at Martin Luther King Jr. Civic Center Park in Berkeley, California, United States of America on April 15, 2017. (Photo by Emily Molli/NurPhoto) *** Please Use Credit from Credit Field ***(Sipa via AP Images)

Um partidário de Trump, ferido, cobre a boca durante uma manifestação pela liberdade de expressão no Martin Luther King Jr. Civic Center Park, em Berkeley, na Califórnia, em 15 de abril de 2017.

Foto: Emily Molli/Sipa/AP

No dia 15 de abril, em uma “manifestação pela liberdade de expressão” em Berkeley, Nathan Damigo, fundador da Identity Evropa, deu um soco no rosto de uma jovem de esquerda em frente às câmeras, o que logo virou um meme muito popular no 4chan e nos canais de YouTube conservadores.

“Começamos com cerca de 12 membros, em março de 2016, e agora temos cerca de 625 em todo o país”, diz Damigo, que atribui o repentino sucesso à viralização das imagens da agressão. “É uma questão de números”, afirma. Quanto mais vídeos de confrontos com antifascistas, mais atenção ele recebe.

Outras estrelas da “alt-right” surgiram de forma parecida.

Kyle Chapman, um ex-leão de chácara com uma longa ficha criminal, também virou uma celebridade instantânea depois de ter sido filmado batendo em ativistas de esquerda com um pedaço de pau em diversos confrontos em Berkeley.

Conhecido como “Based Stick Man” (algo como “O Maluco do Porrete” em português) e retratado em dezenas de memes e vídeos remixados celebrando suas brigas com esquerdistas, Chapman abraçou sua nova identidade e tem incentivado seus seguidores a lutar pela causa do nacionalismo branco. Ao longo do ano, Chapman e outros membros da direita radical têm comparecido a eventos em todo o país com o intuito de provocar e transmitir ao vivo mais enfrentamentos com grupos antifascistas.

As vozes tradicionais do nacionalismo branco – como o ex-líder da Ku Klux Klan David Duke – não foram as únicas responsáveis pela marcha “Unir a Direita”, em Charlottesville. Damigo, Johnny “Monoxide” Ramondetta, Tim “Baked Alaska” Gionet e outras celebridades da “alt-right” que ganharam notoriedade com sua participação nas manifestações de Berkeley no início do ano também ajudaram a organizar e promover o evento. Na esperança de se promover graças à grande cobertura midiática e a possíveis enfrentamentos, muitos deles desfilaram pelas ruas de Charlottesville de câmera na mão, para transmitir tudo ao vivo.

Mas será que o assassinato de Heyer – e a tempestade midiática que se seguiu – é um ponto de inflexão nessa história? Ou será que a ironia já azedou e virou veneno puro?

“O estratagema básico dos membros politicamente mais sérios da ‘alt-right’ tem consistido em flertar com o nazismo, porém ridicularizando quem quer que leve essa aproximação ao pé da letra”, observa Nagle em um artigo publicado após a tragédia de Charlottesville na revista The Baffler. “Porém, depois do ataque presumidamente terrorista de James Alex Fields, que tirou a vida da manifestante ‘antifa’ Heather Heyer, em Charlottesville, a ‘alt-right’ não pode mais se esconder atrás de suas ironias”, afirma.

Pouco depois da morte de Heyer, o Daily Stormer, um dos principais sites de defesa do nacionalismo branco, publicou um artigo que destilava todo o veneno, ironia, perversidade, misoginia e racismo que se tornaram a marca do movimento na internet. A manchete dizia: “Heather Heyer: a mulher morta no incidente era uma piranha gorda e sem filhos de 32 anos”, o que levou a empresa de hospedagem de sites GoDaddy a finalmente retirar o portal do ar.

Mensagens de salas de bate-papo vazadas mostram nacionalistas brancos comemorando a morte de Heyer, o que indica que mais violência ainda está por vir.

O chocante assassinato de Heyer – e a reação execrável de veículos como o Daily Stormer – pode acabar afastando da “alt-right” aqueles que viam nela uma mera forma transgressão cultural. Ou não.

Tradução: Bernardo Tonasse

*Termo pejorativo derivado da palavra “normal”, usado na internet para designar uma pessoa convencional, conformista, sem originalidade. (Nota do tradutor)

**O termo “autista” se tornou um insulto genérico nos fóruns virtuais em língua inglesa, também sendo usado para designar uma pessoa com problemas para se relacionar socialmente. (Nota do tradutor)

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