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Antes defensor dos métodos da Lava Jato, ministro do STF agora vê crime em dever jornalístico

Alexandre de Moraes, que vê antigos aliados na mira da operação, diz que investigador e jornalista que divulgam informação sigilosa cometem “crimes”.

Ministro Alexandre de Moraes durante sessão no STF em 25/10/2017.

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes defendeu “resposta dura” em caso de vazamento de delações, em entrevista ao jornal O Globo, no último fim de semana. Para ele, investigador que entrega à imprensa um documento sigiloso “está cometendo um crime” e o jornalista que divulga o material, também.

Moraes defendeu que as colaborações só sejam divulgadas após o recebimento da denúncia pela Justiça, e não com sua homologação, como tem acontecido nos acordos firmados na esteira da Lava Jato.

O Globo: Se um investigador entrega à imprensa uma investigação sigilosa…

Moraes: Ele está praticando um crime.

O Globo: Mas a imprensa não está praticando um crime.

Moraes: Claro que está. Se você recebe um material sigiloso e divulga…

Atacar jornalistas que publicam informações sigilosas e suas fontes é uma prática que vem sendo usado mundialmente para cercear a liberdade de imprensa. Um projeto de lei — a chamada Lei da Mordaça — que criminalizaria a divulgação de informações sigilosas foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara em 2011, mas nunca avançou a plenário depois de ser fortemente criticada.

Depois de declarar que o jornalista que divulga dados sigilosos está praticando um crime, foi dada ao ministro uma outra chance para ele esclarecer sua posição:

O Globo: As pessoas que vazam deveriam ser punidas?

Moraes: É crime funcional, deveriam ser processadas criminalmente.

O Globo: E os jornalistas?

Moraes: O jornalista não vou comentar.

 Associação rebate fala de ministro

“A violação de sigilo judicial só é considerada quando cometida por pessoas que têm acesso legal ao conteúdo protegido e dever funcional de preservá-lo, caso de funcionários públicos e advogados”, afirmou a Associação Brasileiro de Jornalismo Investigativo (Abraji) em uma nota em resposta à entrevista de Moraes.

“A partir do momento em que um jornalista tem acesso à informação, ela se torna pública. Não há menção na lei brasileira a qualquer tipo de restrição ao trabalho de um repórter e ao seu dever de informar”, continuou a Abraji.

A divulgação das delações é tema de constantes embates jurídicos em relação à Operação Lava Jato. O juiz Sergio Moro se notabilizou por aplicar o raciocínio dos investigadores da Operação Mãos Limpas, da Itália, segundo a qual a delação é uma forma eficiente de se chegar aos mandantes de uma organização criminosa. A divulgação (e não o vazamento, claro) é considerada uma perna do tripé que sustenta o apoio da opinião pública às investigações. Para Moro, os italianos fizeram “largo uso da imprensa” com esse fim e criaram um “círculo virtuoso”.

O método é alvo de críticas em razão de um suposto uso político dessas divulgações. O caso mais notório foi a divulgação de conversas do ex-presidente Lula com a sucessora, Dilma Rousseff, a companheira, Marisa Letícia, e outros aliados.

No passado, defesa das delações

Antes de chegar ao Supremo, Moraes dizia não ter dúvida de que a Lava Jato era “uma belíssima operação porque foi feita com uma estratégia de investigação”.

“A parceria entre Polícia Federal e Ministério Público fez com que ela tivesse uma efetividade muito grande. A Lava Jato é um símbolo de combate à corrupção”, disse, logo que assumiu o Ministério da Justiça do governo Temer. Ele também criticava o governo anterior por “jamais ter apoiado” a Lava Jato.

Em outra entrevista, desta vez ao “Jornal Nacional”, da TV Globo, em maio de 2016, ele declarou que a lei deveria ser “aplicada igual para todos, sem nome, sem filiação e sem partido” e defendeu as delações premiadas: “É um instrumento de prova importantíssimo”.

Para Moraes, a Lava Jato era “a maior operação de combate à corrupção que se fez no Brasil, de maneira inteligente e estratégica”.

“Quando vocês virem esta semana, vão se lembrar de mim”

Os vazamentos, atacados justamente no momento em que a operação atinge o antigo chefe, Michel Temer, e ex-colegas de seu antigo partido, o PSDB, tal como o senador Aécio Neves (MG), não pareciam incomodar o hoje ministro do STF. Pelo contrário.

Em setembro, o ministro fazia campanha para um aliado tucano em Ribeirão Preto quando foi questionado por ativistas de grupos anticorrupção sobre o apoio do governo Temer à operação. “Teve [operação] a semana passada e esta semana vai ter mais, podem ficar tranquilos. Quando vocês virem esta semana, vão se lembrar de mim”, disse Moraes, sem conter o riso.

Indiretamente, ele acabava de “vazar” aos manifestantes informação, em tese, sigilosa: no dia seguinte a Polícia Federal, subordinada ao então ministro, prendeu o ex-ministro petista e ex-prefeito de Ribeirão Preto Antonio Palocci.

O “chefete de polícia”

Não foi a única polêmica de Moraes em sua passagem pelo Ministério da Justiça. Em outubro de 2016, uma ação policial no Senado, após a delação de um policial legislativo, prendeu quatro agentes do Senado, o que levou o então presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), a acusar o ministro de ser o “chefete de polícia” que usava métodos fascistas:

“É lamentável que isso aconteça num espetáculo inusitado, que nem a ditadura militar o fez, com a participação do ministro do governo federal que não tem se portado como um ministro de Estado. No máximo, tem se portado como um ministro circunstancial de governo, chefete de polícia”, disse Renan.

Na época, Temer foi pressionado para trocar o comando do ministério. Mas Moraes só “cairia” no ano seguinte, quando foi indicado para o STF na vaga de Teori Zavascki, morto em um acidente aéreo.

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