JERUSALEM - JUNE 21 : (----EDITORIAL USE ONLY  MANDATORY CREDIT - " GPO / AMOS BEN GERSHOM / HANDOUT" - NO MARKETING NO ADVERTISING CAMPAIGNS - DISTRIBUTED AS A SERVICE TO CLIENTS----) Israel's Prime Minister Benjamin Netanyahu (2nd R) meets with Jared Kushner (3rd L) in Jerusalem on June 21, 2017. (Photo by Handout / Amos Ben Gershom / GPO/Anadolu Agency/Getty Images)

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A equipe de transição de Trump conspirou com Israel, mas isso não está no noticiário

Ex-conselheiro de segurança de Trump admitiu conluio para derrubar posição de Obama sobre assentamentos ilegais.

JERUSALEM - JUNE 21 : (----EDITORIAL USE ONLY  MANDATORY CREDIT - " GPO / AMOS BEN GERSHOM / HANDOUT" - NO MARKETING NO ADVERTISING CAMPAIGNS - DISTRIBUTED AS A SERVICE TO CLIENTS----) Israel's Prime Minister Benjamin Netanyahu (2nd R) meets with Jared Kushner (3rd L) in Jerusalem on June 21, 2017. (Photo by Handout / Amos Ben Gershom / GPO/Anadolu Agency/Getty Images)

Ainda não há como ter certeza se a campanha de Trump praticou um conluio com Vladimir Putin para vencer as eleições de 2016. Para saber mais, é preciso aguardar o próximo passo do promotor especial Robert Mueller. Mas enquanto isso, por que os membros do Congresso e a mídia não estão discutindo acaloradamente sobre o conluio bastante claro entre a equipe de transição de Trump e o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu para abalar a política externa do governo norte-americano e o Direito Internacional? Esse não deveria ser um escândalo de grandes proporções?

Graças à investigação de Mueller em curso, sabemos que antes da posse do presidente Donald Trump pessoas próximas a ele deram apoio a Israel, mais especificamente aos assentamentos ilegais israelenses em território palestino ocupado, por trás dos panos e em oposição direta à política externa oficial dos EUA. É o mesmo tipo de conluio com estados estrangeiros que tem recebido muita atenção no caso da Rússia, mas quando se trata de Israel, curiosamente, o interesse parece bem menor.

É o mesmo tipo de conluio com estados estrangeiros que tem recebido muita atenção no caso da Rússia, mas quando se trata de Israel, curiosamente, o interesse parece bem menor.

Eis o que descobrimos na semana passada, quando a equipe de Mueller divulgou o acordo de delação com o ex-conselheiro nacional de segurança de Trump, o general da reserva Michael Flynn. Em dezembro de 2016, o Conselho de Segurança da ONU estava discutindo uma proposta de resolução que condenava a expansão dos assentamentos israelenses nos territórios ocupados como uma “flagrante infração do Direito Internacional” que estava “perigosamente colocando em risco a viabilidade” de um estado palestino independente.

O governo Obama havia deixado claro que os EUA pretendiam se abster sobre a resolução, observando porém que “os assentamentos não têm validade legal” e que “o problema dos assentamentos piorou tanto que agora está colocando em risco a […] solução de dois Estados”. (Pelo menos no discurso, a oposição dos EUA aos assentamentos Israel é uma posição que vem sendo mantida há muito tempo e por ambos os partidos: Ronald Reagan exigiu um “efetivo congelamento dos assentamentos” em 1982, e em 1991 George H.W. Bush tentou conter os planos israelenses de expandi-los suspendendo por um breve período a concessão de garantias dos EUA a empréstimos feitos pelo Estado judeu.)

O que fizeram então os membros da equipe de Trump, enquanto ouviam as estridentes objeções do governo Netanyahu à resolução da ONU e contavam os dias para a posse de Trump em janeiro de 2017?

“Em 22 de dezembro de 2016, ou perto dessa data, um membro de altíssimo escalão da Equipe Presidencial de Transição orientou Flynn a entrar em contato com agentes de governos estrangeiros, inclusive da Rússia, para descobrir a posição de cada um desses governos sobre a resolução e influenciá-los a adiar a votação ou derrubar a resolução”, consta do documento que lista as acusações contra Flynn, que confessou ter mentido ao FBI sobre suas conversas com o embaixador russo nos EUA. “Em 22 de dezembro de 2016, ou perto dessa data, Flynn entrou em contato com o embaixador russo sobre a votação em aberto. Flynn informou ao embaixador russo sobre a oposição do governo eleito à resolução, e solicitou que a Rússia votasse contra ela ou adiasse a votação.”

Quem foi o “membro de altíssimo escalão” da equipe de transição que “orientou” Flynn a fazer isso? Diversos veículos de notícias confirmaram que se tratava de Jared Kushner, genro de Trump e ponto focal das negociações de paz no Oriente Médio. “Jared ligou para Flynn e disse que ele precisava telefonar para todos os membros do Conselho de Segurança e pedir para adiarem a votação”, revelou ao BuzzFeed News um funcionário da equipe de transição de Trump na sexta-feira, e acrescentou que Kushner teria informado a Flynn que “aquela era uma das maiores prioridades do presidente”.

Segundo o BuzzFeed, “depois de desligar, Flynn disse a todos na sala [na sede da equipe de transição de Trump] que eles precisariam fazer lobby contra a votação da ONU, dizendo que ‘o presidente quer que isso seja feito o mais rápido possível'”. A delação de Flynn, ainda de acordo com o BuzzFeed News, teria revelado “pela primeira vez como funcionários da equipe de transição de Trump pediram apoio à Rússia para desviar a votação da ONU e abalar a política do governo Obama sobre a paz no Oriente Médio antes mesmo de colocar os pés na Casa Branca.”

WASHINGTON, DC - DECEMBER 3: White House Senior Advisor to the President Jared Kushner speaks during a conversation with Haim Saban at the Saban Forum, December 3, 2017 in Washington, DC. The Saban Forum is a US-Israeli dialogue, hosted by the Brookings Institution. (Drew Angerer/Getty Images)

Jared Kushner, assessor presidencial sênior da Casa Branca, fala durante uma conversa com Haim Saban no Fórum Saban, em Washington, em 3 de dezembro de 2017.

Photo: Drew Angerer/Getty Images

Nenhuma dessas informações foi contestada. Na verdade, Kushner fez uma rara aparição pública no domingo no Fórum Saban, um fórum de discussões entre autoridades e estudiosos norte-americanos e israelenses, para discutir os planos do governo Trump para o Oriente Médio. Ele foi recebido pelo patrocinador do fórum, o bilionário norte-americano de origem israelense Haim Saban, que declarou que “gostaria de agradecer pessoalmente” a Kushner por “tomar medidas para fazer com que o Conselho de Segurança da ONU não desse seguimento ao que terminou sendo uma abstenção dos EUA”. A resposta de Kushner? O genro presidencial sorriu, balançou a cabeça em concordância, e murmurou “obrigado” para Saban.

Os israelenses, da mesma forma, têm sido bastante diretos sobre seu papel nessa questão. Na segunda-feira, Ron Dermer, embaixador de Israel nos EUA e amigo próximo e aliado de Netanyahu, contou a Susan Glasser, do veículo de notícias norte-americano Politico, que, em dezembro de 2016, “nós obviamente entramos em contato [com a equipe de transição de Trump] na esperança de que eles nos ajudassem” e “tínhamos esperança de que eles conversariam” com outros governos “para impedir essa votação de acontecer”.

A equipe de transição de Trump entrou em contato com o governo da Rússia para enfraquecer o governo dos EUA a pedido do governo de Israel.

Ficou claro? A equipe de transição de Trump – representada por seus importantes assessores Kushner e Flynn – entrou em contato com o governo da Rússia para enfraquecer o governo dos EUA a pedido do governo de Israel.

E aí, onde está a indignação? Como é possível que a extensão e a ousadia da política de bastidores de Trump e Netanyahu – citando um funcionário da administração dos EUA que conversou comigo sob a condição de permanecer no anonimato, porque não está autorizado a dar declarações públicas sobre o tema – não seja uma notícia mais importante? Para começo de conversa, como argumentaram os professores de Direito da Universidade de Chicago Daniel Hemel e Eric Posner num artigo de opinião publicado na segunda (4) no New York Times, o Logan Act de 1799, embora ridicularizado, é “uma lei penal séria que proíbe os cidadãos de enfraquecer as ações de política externa do presidente em exercício”. Os juristas em questão apontam que “se o Sr. Flynn infringiu o Logan Act, o mesmo se aplica ao funcionário ‘de altíssimo escalão’ que orientou suas ações. Se esse funcionário é o Sr. Kushner, então ele deveria ser preso.”

Há também a própria questão da política do Oriente Médio. Ela não foi delegada aos israelense por Trump e companhia apenas durante a transição ou exclusivamente na questão dos assentamentos. A delegação continuou depois da posse. Era esperado que  Trump anunciasse que os Estados Unidos reconhecem Jerusalém como a capital de Israel – uma outra demanda israelense importante a que todos os presidentes anteriores, republicanos ou democratas, resistiram. A decisão sobre Jerusalém é tão controversa que ao mesmo tempo pode acabar com qualquer possibilidade de reavivar as negociações de paz e ameaça custar vidas – não apenas de israelenses e palestinos, mas também de norte-americanos.

O que James Mattis, secretário de defesa e ex-chefe do Comando Central (Central Command, CENTCOM) dos EUA, disse no Fórum de Segurança de Aspen, no Colorado, em 2013? Ele declarou que as chances de uma solução com dois Estados estavam “começando a se esvaziar por causa dos assentamentos”, e acrescentou: “eu tive um custo de segurança militar aumentado durante todos os meus dias como comandante do CENTCOM porque os americanos são vistos como parciais em favor de Israel.”

Até que Mueller elabore seu relatório final, podemos todos concordar em discordar com relação à existência de conluio entre a campanha de Trump e a Rússia. Nesse momento, no entanto, o que sabemos com certeza e não parece sujeito a dúvida é que Flynn e Kushner conspiraram com Netanyahu e Dermer, em nome de Trump. Seu objetivo, porém, não era tornar a América grande de novo, mas bem menos segura.

Não sou eu quem está dizendo, é o próprio secretário de defesa de Trump.

Foto em destaque: O primeiro-ministro de Israel Benjamin Netanyahhu em reunião com Jared Kushner em Jerusalém, em 21 de junho de 2017.

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