Senador Ciro Nogueira (PP-PI), autor de um projeto que prevê prisão para divulgação de fake news, discursa em plenário, em 29 de abril de 2015.

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Senador que quer prisão por divulgação de "fake news" usou jornal do mandato para promover a mulher

Eleita pela segunda vez em 2014, deputada Iracema Portella, casada com Ciro Nogueira,  usou R$ 32 mil de dinheiro público para comprar posts em portal de notícias do Piauí.

Senador Ciro Nogueira (PP-PI), autor de um projeto que prevê prisão para divulgação de fake news, discursa em plenário, em 29 de abril de 2015.

Com as “fake news” na crista da onda, o senador Ciro Nogueira (Progressistas-PI) resolveu se apresentar como mais um defensor da verdade. Um projeto de lei do senador do PP do Piauí prevê pena de até três anos de prisão para quem divulgar notícias falsas está aguardando a designação de um relator na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. O curioso é que Ciro, tão preocupado agora com a integridade das informações que circulam pelas redes, teve, em seu passado recente, problemas com a Justiça Eleitoral por usar o jornal de seu mandato para promover a mulher, a deputada federal Iracema Portella.

Em 2014, o TRE do Piauí chegou a condenar o senador e a deputada a pagar, cada um, uma multa de R$ 5 mil por propaganda eleitoral fora do período permitido pela legislação. O que motivou a ação foi a edição de setembro de 2013 do informativo do parlamentar, “Ciro por você”, que ainda está disponível na internet. Na capa, a manchete: “Emendas de Ciro e Iracema garantem viaduto Raimundo Veras em Teresina”. A tiragem foi de 120 mil exemplares, pagos com dinheiro da cota de Ciro para exercício da atividade parlamentar. Os advogados do casal, porém, entraram com recurso no TSE e conseguiram reverter a decisão. A instância suprema da Justiça Eleitoral não considerou que houve propaganda antecipada pois a notícia não mencionava as eleições de 2014 ou o fato de Iracema Portella ser candidata à reeleição.

Capa de informativo do mandato do senador Ciro Nogueira

Capa de informativo do mandato do senador Ciro Nogueira.

Reprodução

No ano seguinte, Iracema conseguiu votos suficientes para um segundo mandato na Câmara. Atualmente, ela compra um espaço no Portal 180 Graus, um site de notícias do Piauí, sob o pretexto de divulgação de suas atividades parlamentares. Na rubrica de blogs do portal, há uma seção dedicada à deputada com dezenas de postagens em linguagem jornalística, não identificadas como material pago. Somente no ano passado, foram repassados pelo gabinete de Iracema R$ 32 mil dos cofres públicos para a empresa que administra o site.

Diversos textos lembram mais uma coluna social do que uma prestação de contas, como o publicado em 18 de dezembro do ano passado:

Texto do Portal 180 Graus sobre a deputada Iracema Portella (terceira à esquerda)

Post do Portal 180 Graus sobre a deputada Iracema Portella (terceira à esquerda).

Reprodução

Elogiado pela deputada no post, Hélder Eugênio é, segundo o cadastro da Receita Federal, um dos dois sócios da Empresa de Informações Divulgações e Notícias, que controla o Portal 180 Graus.

The Intercept Brasil entrou em contato com o portal através de um número de WhatsApp da redação disponível no site. Uma pessoa que se identificou como editor-chefe chegou a responder a uma pergunta a respeito da compra de espaço pela deputada e outros políticos, mas não autorizou a publicação das respostas nem quis informar seu nome.

Vítima: a “sociedade como um todo”

Na justificativa do texto que prevê a prisão de quem divulgar “fake news”, Ciro Nogueira alega que já há punições previstas no Código Penal por crime contra a honra quando existe uma vítima identificada. Porém, não há proteção quando o caso envolve a  “sociedade como um todo”:

“O presente projeto de lei busca criminalizar a divulgação de notícia falsa em que a vítima é a sociedade como um todo. Para tanto, estamos criando um tipo penal que, em linhas gerais, pune a divulgação de notícia falsa que atinge interesse público relevante, prevendo pena mais grave para a divulgação feita pela internet e uma causa de aumento de pena quando o agente visa a obtenção de vantagem, para si ou para outrem”.

A reportagem entrou em contato com os gabinetes de Ciro Nogueira e Iracema Portella, mas não teve resposta até a publicação desta matéria.

Conforme mostrou The Intercept Brasil no mês passado, há outras iniciativas em tramitação no Legislativo para criminalizar as “fake news”. Um projeto de lei da deputada Soraya Santos (PMDB-RJ), por exemplo, acaba com a obrigatoriedade de ordem judicial para levantar dados e conversas particulares dos internautas.

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