Os gritos de “buceta rosa” – dados por seis brasileiros que assediavam uma mulher na Rússia – ainda ressoavam por aqui quando 14 conterrâneos cercaram uma jornalista para cantar: “chupar xoxota é uma coisa linda”. Para eles, não havia vergonha alguma em abordar publicamente e filmar mulheres que não os entendiam para falar de suas bucetas.
No entanto, a mesma palavra, proferida com orgulho viril nos assédios, não soou tão natural aos ouvidos masculinos quando deu nome a um oficina sobre saúde sexual feminina, um mês antes, intitulada Empoderamento de Buceta.
Em maio, a ginecologista Andrea Rufino mediou o evento, realizado na Universidade Federal do Piauí. Andrea foi atacada com insultos como “médica vagabunda” e “doente”. Usada por mulheres que desejavam aprender sobre sua sexualidade, e não mais por homens que sexualizavam forçosamente suas interlocutoras, buceta não era uma palavra. Era um afronte.
O correto seria usar palavras “mais amenas”, opinou um dos descontentes. Aceitável apenas quando objeto de desejo e domínio masculino, buceta deveria se transfigurar em vagina, termo desprovido de luxúria, neutro, científico. Monopólio dos homens, buceta não pode pertencer às mulheres. Os números revelam o desconforto delas com seus corpos e a pressão que sentem para satisfazer aos homens. Em 2015, uma pesquisa da revista americana Cosmopolitan mostrou que quase sete de cada dez mulheres já fingiram um orgasmo, em sua maioria para agradar o parceiro ou terminar logo a transa. Ao mesmo tempo, no Brasil, um estudo do Programa de Estudos em Sexualidade da Universidade de São Paulo mostrou que 40% das mulheres não se masturbam.
Fora dos consultórios e eventos médicos, nem a gêmea casta da buceta foge à estranheza. Há menos de três meses, a versão em quadrinhos do Diário de Anne Frank foi censurada em uma escola do Espírito Santo por conter a palavra “vagina”. O termo deixou alguns pais transtornados, ainda que a leitura fosse dirigida a alunos do 7º ano – apenas uma série anterior àquela em que, em geral, os adolescentes aprendem sobre a anatomia humana.
Constrangida pela profanidade da buceta, a imprensa se desdobrou para contornar o termo ao noticiar os casos de assédio na Copa do Mundo. Na Folha de São Paulo, lia-se: “a cor de seu sexo”. O Globo, assim como o Ig, preferiu escrever “o órgão sexual”. O portal R7, relatando outro caso, recorreu ao uso de asteriscos para citar a frase que brasileiros instruíram uma russa a repetir: “Eu quero dar a b****a para vocês”. Enquanto isso, bastava um clique para ouvir os agressores repetirem, aos berros, a palavra que ninguém ousava repetir.
Buceta, pelo visto, só tem vez na boca dos homens – figurativamente, é claro. Segundo pesquisa da empresa Sex Wipes, 43% dos homens não gostam de fazer sexo oral nas parceiras.
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