No começo da semana passada, Amy Maldonado, advogada de imigração em Michigan, fez uma visita ao escritório do Centro de Crianças Heartland Alliance Internacional, em Chicago. Maldonado foi até lá se encontrar com seus clientes: dois meninos brasileiros que haviam sido separados de seus pais um mês antes pelas autoridades de fronteira dos EUA, no estado do Novo México. Os meninos, que não são parentes e têm 9 e 15 anos, chegaram ao escritório vindos de um lugar não divulgado. Por razões de segurança e privacidade, a localização exata do abrigo onde estão sendo detidos é um segredo guardado a sete chaves até mesmo de sua advogada. Maldonado só sabe que o prédio tem pelo menos quatro andares, e que, até onde conseguiu descobrir, parece ser operado de forma profissional.
Maldonado e as crianças, juntamente com um intérprete de português, escolheram uma mesa em um canto do escritório da Heartland. Ela explicou que não trabalhava para o governo, e que fazia parte de uma equipe cada vez maior de advogados atuando para tirá-los da detenção e reuni-los com seus pais, que permanecem presos a mais de mil quilômetros de distância: os meninos são autores de uma ação que contesta a separação em curso entre eles e seus pais. (Um representante do escritório da Procuradoria Federal do Distrito Norte de Illinois se recusou a comentar o caso, alegando uma política do Departamento de Justiça.) Eles são identificados nos processos por suas iniciais. O mais velho é identificado como W.S.R., e o mais novo, como C.D.A. The Intercept também não está divulgando os nomes de seus pais, a pedido dos próprios, que estão envolvidos em procedimentos delicados de pedido de asilo.
“Eu gostaria de estar com meu pai no meu aniversário, que vai ser dia 6 de julho.”
Maldonado passou duas horas com os garotos. W.S.R. se concentrou em redigir uma carta para o juiz de seu caso enquanto conversavam. Ele preencheu duas páginas com letra cursiva em português. O menino de 15 anos explicou que, depois que foram presos e levados para um centro de detenção do Departamento de Segurança Nacional [DHS, Department of Homeland Security], ele e seu pai receberam instruções para assinar um documento. Caso recusassem, ficariam separados por um período indeterminado; se assinassem, a separação duraria apenas alguns dias. “Já faz um mês desde que vi meu pai pela última vez”, ele escreveu ao juiz, acrescentando que “nunca mais” acreditaria em um agente da imigração. “Achei que seria por pouco tempo e mal me despedi do meu pai, e agora estou com muita saudade dele.” E acrescentou: “eu quero ficar com meu pai não importa onde, mas de preferência aqui.”
“Eu gostaria de estar com meu pai no meu aniversário”, ele escreveu. “Que vai ser dia 6 de julho” – hoje.
Enquanto W.S.R. se dedicava à sua carta, C.D.A., de 9 anos, se ocupava com um conjunto de giz de cera e folhas de papel. Maldonado fez algumas perguntas ao menino enquanto ele desenhava. O relato de Maldonado sobre a conversa, posteriormente protocolado em juízo, produziu algo raro: uma narrativa em primeira pessoa de uma criança arrastada pela investida de “tolerância zero” do governo Trump na fronteira.
“Não me lembro muito bem o que aconteceu quando a polícia de imigração nos pegou”, começou C.D.A., segundo a declaração que deu a Maldonado. A família passou dois dias no centro de detenção da fronteira, disse ele, o mesmo que W.S.R. havia descrito em sua carta. “Meu pai pediu para ligar para a minha mãe, e eles nos deixaram ligar”, ele lembrou. “Estava muito frio, e não tinha cama.” Ele e seu pai dormiram no chão. “As luzes ficavam acesas o tempo todo”, disse C.D.A. “Nós comemos burritos e suco de maçã. Eles às vezes nos davam água limpa, e às vezes enchíamos as garrafas vazias na torneira.”
“Eu bebi com as mãos e a água estava branca, mas eu estava com sede e bebi mesmo assim”, ele disse.
C.D.A. contou a Maldonado que seu pai havia explicado a ele que eles seriam separados. Logo em seguia, ele disse, “um policial chamou o meu nome e o do [nome de W.S.R.] e juntou outras crianças, pegou nossas coisas e me colocou em um carro de polícia e me levou para outro lugar sem o meu pai. Dentro do carro estavam uma mulher grávida e duas crianças. Também não havia camas para dormir ainda, só alguma coisa que parecia uma cama elástica. As luzes lá também ficavam acesas o tempo todo.” Sendo dois meninos brasileiros solitários em seu novo centro de detenção, C.D.A. se apegou ao mais velho W.S.R.
“Nenhum dos policiais lá falava português”, ele disse. “Eles usavam o Google Translate, os policiais digitavam e depois traduziam. Nós só comíamos macarrão lamen no almoço e no jantar, e burrito no café da manhã, ou cereal e suco de maçã. Eu pedi para ligar para a minha mãe quando cheguei lá e eles disseram que não.”
Um dia, explicou o menino, “dois policiais, um homem e uma mulher, nos levaram de ônibus para o aeroporto, e o homem disse que eles tinham roupas e comida para nos dar. Nós trocamos de roupa e ele comprou água para nós.” Na viagem, contou C.D.A., ele e W.S.R. conheceram duas outras crianças que falavam português – um menino e uma menina. “Dissemos aos policiais que queríamos tomar um banho”, ele disse. A resposta foi não. “Só tomamos banho aqui em Chicago.”
Desde que chegou a Chicago, C.D.A. diz que só falou com seu pai duas vezes. Ele pode fazer duas ligações de dez minutos para sua mãe a cada semana. “Eu quero tanto falar com a minha mãe que fiz um calendário dos dias que posso falar com ela”, ele disse. “Eu quero falar com meu pai quando fico triste”, ele acrescentou. “Eu quero estar de volta com meu pai. Eu não sei onde o meu pai está agora.”
Quando acabou de falar, C.D.A. tinha terminado três desenhos que serão incluídos no seu processo. O primeiro era o avião que ele e o pai pegaram do Brasil para Cidade do México; o segundo mostrava o carro que dirigiram; e o terceiro, ele contou a Maldonado, representava sua mãe no Brasil – uma rede presa entre duas palmeiras e um céu azul.
Além de Maldonado, os meninos brasileiros e seus pais também são representados por advogados da Aldea – Centro Popular de Justiça, um coletivo de advogados com muitos anos de experiência em representar pais e filhos no sistema de imigração, e pelo escritório de advocacia internacional DLA Piper. O processo deles faz parte de um crescente volume de litígios que contestam a sistemática separação entre crianças e seus pais que o governo Trump promoveu ao longo desse ano.
Na semana passada, o juiz federal responsável pelo processo dos brasileiros, Edmon E. Chang, concedeu uma medida liminar proibindo o governo de deportar os pais sem seus filhos. Foi uma ordem judicial oportuna, dizem os advogados das famílias. Em uma reunião com a advogada Karen Hoffman, que faz parte da equipe jurídica dos brasileiros, o pai de W.S.R. contou que tinha sido instado pelos agentes do Serviço de Imigração e Controle Aduaneiro dos EUA a assinar um formulário autorizando sua deportação voluntária, supostamente alegando que, se o fizesse, seria reunido ao filho. Segundo Hoffman, os documentos ofertados ao falante de português estavam escritos em espanhol, e os agentes que os apresentaram falavam inglês.
“Felizmente”, disse Hoffman, “ele se recusou a assinar”.
Histórias semelhantes têm surgido em várias partes da fronteira – agentes de imigração norte-americanos acenando com a possibilidade de reunificação para pais separados de seus filhos, inclusive solicitantes de asilo, sob a condição de que consintam com sua própria deportação. Em razão de uma liminar concedida por um juiz federal e uma ação coletiva ajuizada pela ACLU [União Americana pelas Liberdades Civis] na semana passada, o governo recebeu uma ordem para reunir as crianças que separou de seus pais. Até agora, o processo parece bastante desorganizado. “Centenas de pais aparentemente foram deportados sem seus filhos apenas no mês de abril”, disse um relatório publicado semana passada, com base nos dados de apreensão da Patrulha de Fronteira dos EUA, pela Transactional Records Access Clearinghouse [Central de Informações de Acesso a Dados Transacionais], um centro de pesquisas da Universidade de Syracuse que reúne informações sobre atividades de governo. Isso indica que o impacto da “tolerância zero” já era substancial bem antes de qualquer intervenção judicial.
Por toda parte, nos EUA e na América Latina, milhares de famílias foram atingidas pela decisão do governo Trump de denunciar criminalmente qualquer pessoa acusada de atravessar a fronteira de forma ilegal, sem dispor, no entanto, de um sistema capaz de lidar com o fluxo de crianças que a atuação estatal deixa desamparadas. Bebês, crianças pequenas e solicitantes de asilo, como os brasileiros, estão entre os afetados.
Em sua entrevista com Hoffman, o pai de W.S.R. explicou que ele e o filho fugiram do Brasil em razão de uma série de ameaças de uma poderosa figura do crime organizado em sua região do país. Especificamente, declarou o pai, a família estaria na mira do chefe da criminalidade local por ter feito uma denúncia contra ele na polícia, o que o pai alega não ter acontecido. “Eu não fui à polícia”, explicou o pai de W.S.R. “Se eu tivesse procurado a polícia, seria ainda pior. No Brasil, a polícia e os traficantes são como uma empresa.” O pai do menino mais novo, C.D.A., também alega problemas com o crime organizado no país – em seu caso, dever dinheiro para um agiota ligado ao tráfico de pessoas. Se deportado para o Brasil, teme que, juntamente com C.D.A., seria transformado em escravo pelos traficantes, ou até pior.
“Infelizmente, é muito comum no meu país que pessoas que têm problemas com traficantes terminem mortas”, contou a Hoffman. “E a polícia não faz nada.”
Em documentos protocolados em juízo, ambos os pais dizem que esperavam e planejavam pedir asilo apresentando-se nos portos de entrada legalizados, mas ao chegarem foram informados por agentes norte-americanos que os portos estariam “fechados”. “Precisávamos entrar no país para pedir asilo, por isso atravessamos em um lugar próximo”, disse a Hoffman o pai de W.S.R. O pai de C.D.A. acrescentou: “queríamos atravessar legalmente, mas nos disseram que a ponte estava fechada.” E continuou: “Eles não estavam deixando ninguém passar. Um agente disse que estava fechado e as pessoas precisavam voltar. Um homem, que era mexicano, nos levou para atravessar em outro lugar. Ele prometeu que ficaria tudo bem.”
The Intercept analisou os registros de prisões, que mostram que os pais foram capturados pela Patrulha de Fronteira dos EUA em 23 de maio, enquanto cruzavam a pé a fronteira internacional, “aproximadamente 8 milhas [12km] a leste de Santa Teresa, o Porto de Entrada do Novo México”. De lá, as famílias foram movidas para o centro de detenção gerido pelo DHS, que os meninos descreveram a Maldonado.
“Não era um lugar bom”, recorda-se o pai de C.D.A.
“Ele chorou e me abraçou. Ele é um menino bom. Nunca tinha ficado longe de mim ou da mãe dele antes.”
“As crianças dormiam no chão com seus pais”, ele explicou. “Havia crianças de ambos os sexos misturadas. Algumas meninas já com 14 anos. Elas não tinham privacidade para ir ao banheiro. Nem imagino o que seus pais devem ter sentido.” Ambos os pais contaram que seus filhos estavam chorando quando chegou o momento da separação. O pai de W.S.R. contou que lhe disseram que estaria sendo levado para a prisão. O pai de C.D.A. afirma que o agente norte-americano que veio buscar seu filho não lhe deu informações a respeito de para onde o menino de 9 anos estava sendo levado. “Olha, eu vou ficar longe por três dias, no máximo cinco, e então vamos nos ver de novo”, o pai de C.D.A. se recorda de ter dito ao garoto, tentando ao máximo não assustar a criança. “Ele chorou e me abraçou”, disse. “Ele é um menino bom. Nunca tinha ficado longe de mim ou da mãe dele antes.”
“Eu disse a ele que não iria deixá-lo”, continuou o pai de C.D.A. “Agora eu sinto que menti para o meu filho, porque já faz mais de um mês que não o vejo.”
Os pais foram processados, juntamente com mais de vinte outros brasileiros, numa audiência coletiva perante o juiz federal Gregory B. Wormuth em 6 de junho, em Las Cruces, Novo México. Ambos estavam sendo acusados de uma contravenção penal de âmbito federal por atravessar a fronteira ilegalmente, o que ensejou a separação de seus filhos. Os homens descreveram um processo confuso e apressado em que se sentiram incapazes de manifestar preocupação com seus meninos – ou até de informar que tinham filhos mantidos em detenção – ou seu desejo de solicitar asilo por medo de serem deportados para o Brasil. “Não tive a chance de explicar o que aconteceu por não conseguir atravessar a ponte, ou como eu queria pedir asilo”, disse o pai de W.S.R. “Não tive qualquer oportunidade de conversar com a outra advogada que me deram. Ela representou muitos brasileiros naquele dia. Eu só me lembro que ela olhou para mim e eles estavam dizendo meu nome e o nome do meu filho, e eu comecei a chorar porque estava me sentindo muito desesperado.”
“Nunca chegamos a conversar”, acrescentou. “Nunca tive a oportunidade de falar sobre o meu medo ou sobre a minha situação. Eu estava há dias sem dormir.”
O pai de C.D.A. narrou uma sequência de eventos semelhante. “Era uma escolha difícil – aceitar a deportação e ver nossos filhos de novo, ou contestar a acusação e pegar até seis meses”, ele explicou. “Muitos pais entraram em colapso”. Acrescentou ainda que: “Os advogados não se importavam muito com os nossos casos. Eles não conversavam individualmente conosco. Só uma mulher explicou a situação para todo mundo. Era como se estivéssemos sendo induzidos a ir embora. Eles diziam que, na justiça, se eu tentasse brigar pelo meu caso, poderia pegar seis meses. Eu disse que não, porque o ICE levou meu filho e vai devolvê-lo. Quero voltar para a custódia do ICE para poder vê-lo de novo.”
Por um acaso, aconteceu de haver observadores independentes na sala de audiência no dia em que os pais brasileiros receberam a sentença judicial. Margaret Brown Vega e seu parceiro, Nathan Craig, são antropólogos aposentados que trabalharam na América Latina. Eles foram convidados pelo escritório da defensoria pública federal local para observar uma das chamadas “audiências simplificadas”, em que os imigrantes são rapidamente processados em massa, no dia 6 de junho – o mesmo dia em que os pais foram condenados. Eles estavam presentes nas conversas entre os advogados de defesa e seus clientes brasileiros antes do pronunciamento judicial e enquanto ele acontecia. Brown Vega e Craig preencheram quase 20 páginas de anotações detalhadas descrevendo o que testemunharam, e depois as compartilharam com The Intercept.
Brown Vega descreveu mais de vinte homens e mulheres – entre eles, os pais de W.S.R. e C.D.A. – que entraram na sala de audiência amarrados entre si pelos pés, pela cintura e pelas mãos. “Todos os homens estão usando macacões verde-escuro, e as mulheres, macacões verde-limão, exceto duas”, ela escreveu. Ambos, Vega e Craig, descreveram em suas anotações individuais ter ouvido um defensor público dizer aos pais e aos demais acusados: “sabemos que alguns de vocês vieram com crianças”. Vários acusados balançaram afirmativamente a cabeça diante da menção às crianças, anotou a dupla. Segundo contaram, escreveu Craig, “todos, ou quase todos os homens estavam viajando com menores. Aparentemente, todas as mulheres menos uma estavam viajando com um menor.”
As anotações de Brown Vega e Craig retratam um procedimento caótico, em que pareceu, de sua perspectiva, que os pais de C.D.A. e W.S.R. foram mal representados por seus defensores públicos federais, juntamente com os demais acusados daquele dia. Em dado momento, depois de manifestar algumas de suas preocupações para os defensores públicos, a dupla foi temporariamente removida da sala de audiência. Foi-lhes permitido, no entanto, retornar para a sentença. “A despeito de ter sido revelado antes da audiência que quase todos os indivíduos ali presentes tinham filhos, e que alguns deles eram solicitantes de asilo, nenhum desses fatos ou circunstâncias foi aventado durante o procedimento judicial”, escreveu Craig ao avaliar a audiência. “O dia de hoje, como a maior parte dos outros, me deixa com mais perguntas do que respostas.”
Na conclusão da audiência, os pais brasileiros foram condenados pelo tempo já cumprido, e devolvidos à custódia do ICE. “Pensei que finalmente seria reunido com meu filho”, disse o pai de W.S.R. “Mas não fui.” Em vez disso, a dupla começou uma jornada pelo sistema de detenção da imigração, enquanto o governo se preparava para enviar seus filhos a Chicago. O pai de C.D.A. se recorda de ter ficado preso em outra instalação provisória enquanto estava sendo levado para um centro de detenção mais permanente no Novo México. Contou que, mais uma vez, todos dormiram no chão. “Perguntei se eles poderiam aumentar a temperatura”, recorda. “Eles disseram ‘não, por causa das bactérias’”.
“Bem”, ele pensou, “se o frio mata as bactérias, pode nos matar também.”
Nas semanas que se seguiram, os pais batalharam para encontrar seus filhos e conseguir falar com eles. O pai de C.D.A. se voltou para os outros pais brasileiros sob custódia do ICE. “Muitos já estavam ali há 10 dias, alguns até há 18 dias, então sabíamos que o que acontecesse com eles também aconteceria conosco”, disse. “Liguei para o número 0800 que o advogado me deu para tentar falar com meu filho. Mas eles só pediram informações sobre mim e disseram que na próxima semana eu falaria com ele. Eu não sabia se poderia receber ligações.” Duas semanas atrás, os dois finalmente conseguiram conversar pela primeira vez. “Foi um alívio enorme”, disse o pai de C.D.A. “Mas as coisas que ele disse me perturbaram muito. Ele parecia tão adulto. Ele disse: ‘Pelo amor de Deus, não quero que ninguém passe pelo que estou passando’”.
“Uma criança de nove anos disse isso”, ele contou, destacando a pouca idade do filho.
“Eles tratam nossos filhos como lixo da rua.”
A primeira comunicação do pai de W.S.R. com seu filho foi em 15 de junho. “Pai, nunca mais vou ver você de novo”, disse o menino. Seu pai contou à advogada que W.S.R. tem chorado muito, e está “desesperado para sair do centro onde está detido”. Na semana passada, os dois conseguiram conversar de novo, mas só por dois minutos. “Eu preciso pagar pelas ligações com o dinheiro que recebo para as despesas na prisão”, explicou o pai de W.S.R. “E aí, quando ligo, eles me deixam na espera, e quanto mais eu espero mais o dinheiro vai acabando. É muito difícil me comunicar.”
O pai de W.S.R. conseguiu, no entanto, descobrir uma informação importante: “W.S.R. disse que perdeu o passaporte quando eles o fizeram correr pelo aeroporto, para levá-lo aonde quer que ele esteja”, disse. “Eles tratam nossos filhos como lixo da rua.”
Ele explicou que manter a calma no meio de tudo isso é incrivelmente difícil. Semana passada, depois de sua reunião com a advogada, ele foi mais uma vez removido para um novo centro de detenção. Antes de ser realocado, ele contou à advogada em termos claros e precisos sobre a dor que está vivenciando.
“É muito solitário aqui”, ele disse. “Ninguém fala português. Somos só três brasileiros. Eu finjo que está tudo bem quando falo com meu filho, mas não está tudo bem. Digo a ele que está tudo tranquilo, ótimo, mas isso não é verdade. Eu não posso dizer a verdade porque isso o perturbaria demais. Tento comer, mas sei que estou perdendo peso. Tento mesmo assim, porque meu filho precisa que eu esteja forte. Estou muito angustiado, sonho que estou vendo meu filho. Todos os dias penso: ‘amanhã eu vou vê-lo’. Nunca vou conseguir esquecer o que aconteceu. É como uma cicatriz, nunca vai desaparecer, não tem dinheiro que possa compensar isso. As pessoas que fizeram isso não devem ter filhos. É como viver um pesadelo: eu quero acordar, mas não consigo. Quero estar com meu filho, quero ir a Chicago, onde ele está, para tentar pegá-lo de volta. Ele precisa estar comigo, que sou o pai dele. Também quero ter a chance de trabalhar com os advogados no nosso processo de asilo. Não consigo fazer nada daqui da prisão. É muito difícil até conversar com minha advogada pelo telefone. Meu maior medo é ser deportado para o Brasil sem meu filho. Não sei como vou consegui-lo de volta se isso acontecer. Não importa o que aconteça, temos que ficar juntos.”
O governo dos EUA vai apresentar em juízo seus argumentos no caso dos brasileiros nesta semana. W.S.R. planeja comparecer a essa audiência crucial, para estar presente em sua própria defesa. “Se perdermos”, disse Maldonado, “e perdermos até o final, essa é a única audiência que ele vai ter nos Estados Unidos. E ele quer ir.” Ainda não está claro, porém, se o menino vai conseguir realizar o desejo de celebrar seu aniversário com o pai hoje. Ele está fazendo 16 anos.
Tradução: Deborah Leão
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