Encerradas neste domingo, as convenções partidárias definiram quais serão os candidatos à Presidência da República – e, não menos importante, os seus vices.
Recolocado sob os holofotes após a conspiração de Michel Temer a favor do impeachment de Dilma Rousseff, o candidato a ocupante do Palácio do Jaburu pode jogar um papel talvez mais importante na disputa eleitoral que no governo, ao reforçar pontos fracos dos presidenciáveis.
Há quem aposte que a escolha de mulheres como candidatas a vice – caso de Geraldo Alckmin e Ciro Gomes – foi estratégica para abocanhar o eleitorado feminino, majoritário e ainda indeciso. Na prática, porém, a escolha das candidatas mostrou que o compromisso com as mulheres é meramente retórico e simbólico. Ana Amélia e Kátia Abreu, escolhidas por Alckmin e Gomes, são notórias representantes de setores conservadores.
A guinada à direita de Geraldo Alckmin
Se em 2006 Geraldo Alckmin teve em sua chapa o apagado José Jorge, do DEM pernambucano, desta vez ele disputa o Planalto ao lado de senadora Ana Amélia, do PP gaúcho. A aposta na direitista feroz, que celebrou agressões de conterrâneos à caravana do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Sul do país – “levantar o relho, levantar o rebenque é mostrar onde estão os gaúchos”, disse –, é uma tentativa do ex-governador paulista de arrancar votos do proto-fascista Jair Bolsonaro, muito popular no sul.
A escolha feita pelo tucanato, aliás, é exemplar para que se enxergue como o debate político no Brasil se moveu para a direita. Em 2006, Alckmin, na tentativa de se livrar da pecha de “privatista” que lhe foi pregada pela campanha de Lula, deixou-se fotografar vestindo um colete com emblemas de empresas estatais na tentativa de ter apoio entre eleitores de centro-esquerda. Agora, vê como filão a explorar os votos da extrema-direita. E não faz mistério sobre a disposição de privatizar “tudo o que for possível“.
Por outro lado, e ao contrário de 2006, quando escolheu um vice da região, o tucano parece conformado com as dificuldades de obter uma votação expressiva no Nordeste – onde Lula goza de seu maior prestígio.
A aposta arriscada de Lula
Lula nomeou Fernando Haddad como seu candidato a vice – o que quer dizer que o ex-prefeito de São Paulo concorrerá à presidência, já que sua candidatura deverá ser barrada pela Lei da Ficha Limpa. Na última hora, ainda atraiu o PCdoB, que desistiu de lançar Manuela D’Ávila. Ela deverá ser inscrita como vice, ao lado de Haddad, quando o ex-presidente for impedido de disputar a eleição.
O principal movimento do PT, porém, foi a bem sucedida operação que asfixiou Ciro Gomes, privando o pedetista do apoio do PSB, que turbinaria a candidatura do cearense. Lula aposta que será a economia, mais uma vez, o principal fator de decisão de voto, e também em sua capacidade de transferir apoio a quem quer que seja que dispute as eleições com sua benção.
Já deu certo uma vez – ainda que com resultados desastrosos no governo – com Dilma Rousseff. Se der certo novamente, Haddad iria ao segundo turno, e o PT conta que teria Ciro Gomes ao seu lado. É uma aposta arriscada – lembremos que, em 2014, hostilizada pelo PT, partido que ajudou a fundar, Marina Silva declarou apoio a Aécio Neves.
Bolsonaro ganhou quase nada
Jair Bolsonaro, do nanico PSL, terá ao seu lado o general da reserva Hamilton Mourão – que desde 2017 defende publicamente um golpe militar –, do igualmente minúsculo PRTB, feudo partidário de Levy Fidélix, sujeito que só saiu da irrelevância absoluta quando fez declarações boçais contra a população LGBT. Quer dizer: é mais do mesmo.
Para um dos filhos de Bolsonaro, a escolha de Mourão é uma espécie de garantia contra um impeachment do pai.
Bem que o capitão-da-reserva-tornado-político-profissional-desde-1989 tentou algo melhor: a jurista Janaina Paschoal, personagem central do impeachment de Dilma, e Luiz Philippe de Orléans e Bragança, cujo maior predicado é o fato de ser descendente da extinta família real brasileira. Janaina deu-lhe as costas, e o monarquista foi preterido em nome do militar.
Para um dos filhos de Bolsonaro, a escolha de Mourão é uma espécie de garantia contra um impeachment do pai. Pelo raciocínio de Eduardo Bolsonaro, Mourão – “um cara faca na caveira” – seria um presidente ainda mais indigesto para eventuais conspiradores contra o pai. É um raciocínio tortuoso, mas, conforme a máxima do Barão de Itararé, de onde menos se espera é que não sai nada.
De todo modo, se certamente agrada aos eleitores de Bolsonaro – e talvez lhe renda mais alguns votos entre a turma da caserna que vê com reservas o indisciplinado ex-oficial –, é difícil imaginar que o boquirroto general vá render votos entre os eleitores que costumam decidir eleições no Brasil: os que ficam no centro, oscilando ora à esquerda, ora à direita.
Ciro e a motosserra de ouro
Dá pra dizer o mesmo de Ciro Gomes: isolado pelo PT, teve que buscar em casa a sua vice, a senadora Kátia Abreu, ex-presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil e vencedora do prêmio Motossera de Ouro, conferido pelo Greenpeace, e aliada mais fiel de Dilma em seus últimos dias no Planalto.
Ainda que Kátia tenha tráfego entre os ruralistas, Ana Amélia e o centrão também têm – e não dá pra imaginar o setor preferindo Ciro a Alckmin. Pior: lealdade a Dilma à parte, é de se supor que parte do eleitorado do pedetista torça o nariz para Katia.
Por uma ironia do destino, quem entregou a duvidosa honraria a Kátia Abreu foi a então vice-coordenadora da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira, Sonia Guajajara. Filiada ao Psol, ela é a candidata a vice-presidente na chapa encabeçada por Guilherme Boulos. Guajajara, nascida na Terra Indígena Arariboia, no Maranhão, é uma espécie de contraponto a Boulos, que ganhou fama pela atuação a frente do principal movimento de sem-teto de São Paulo.
A aposta progressista de Marina
Um pouco melhor saiu-se Marina Silva, da Rede, que fechou acordo com Eduardo Jorge, do PV. Embora ambos estejam no mesmo flanco do campo político – a centro-esquerda, com um apreço especial pela agenda ambientalista –, Jorge compensa o conservadorismo da evangélica Marina, o que é um ponto importante para a parcela do eleitorado que a candidatura de ambos mira. Ele é, por exemplo, a favor da liberação da maconha e da descriminalização do aborto.
Economistas e fantasmas
Henrique Meirelles, que na convenção do PMDB conseguiu a proeza de falar dos “bons tempos” em que era presidente do Banco Central sem mencionar que estava ali sob Luiz Inácio Lula da Silva, terá a seu lado um correligionário – Germano Rigotto, um gaúcho que perdeu as últimas duas eleições que disputou em casa, para governador e senador – essa, para Ana Amélia. É difícil imaginar o que ele possa trazer a Meirelles. Mas o maior problema dele, na verdade, será livrar-se do fantasma de Michel Temer.
Alvaro Dias, por fim, escolheu o economista Paulo Rabello de Castro, do PSC, um admirador do arquiliberal Roberto Campos que, na convenção do Podemos, em Curitiba, falou em “acabar com a república dos canalhas” embora tenha se esquecido de mencionar que presidiu o BNDES por indicação de Temer entre 2016 e 17. Carioca, ele deverá ir atrás de votos para Dias no Nordeste. Mais importante que Castro, porém, é o PSC, presidido pelo Pastor Everaldo, líder de um dos principais ramos da Assembleia de Deus, e dono de segundos preciosos de propaganda eleitoral.
Dias, o mais velho dos postulantes à presidência – completa 50 anos de vida pública em 2018 –, porém, quer ser o candidato da Lava-Jato. No sábado, em Curitiba, prometeu que convidará Sergio Moro para ser ministro da Justiça caso seja eleito. Só se esqueceu de explicar o que fazia em seu palanque o pastor Everaldo, suspeito de levar R$ 6 milhões em caixa dois da Odebrecht.
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