Da esquerda para a direita: Ben Jealous em uma festa da noite da eleição, em 26 de junho de 2018; Stacey Abrams em um debate em Atlanta, em 20 de maio de 2018; e Andrew Gillum em Miami, em 13 de agosto de 2018.

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Nos EUA, eles podem ser os primeiros governadores negros de seus estados

Andrew Gillum, Stacey Abrams e Ben Jealous venceram as primárias do Partido Democrata na Flórida, Georgia e Maryland.

Da esquerda para a direita: Ben Jealous em uma festa da noite da eleição, em 26 de junho de 2018; Stacey Abrams em um debate em Atlanta, em 20 de maio de 2018; e Andrew Gillum em Miami, em 13 de agosto de 2018.

O que estamos vivendo é absolutamente histórico. No momento, os Estados Unidos não têm um único governador negro. Nenhum. Flórida, Georgia e Maryland nunca tiveram um governador negro. Nenhum cidadão negro jamais foi indicado pelo Partido Democrata para concorrer ao governo da Flórida ou da Georgia. Mas isso parece estar prestes a mudar.

Na noite do dia 28 de agosto, Andrew Gillum conseguiu uma vitória impressionante nas primárias democratas da Flórida para o governo. Ele se junta a Stacey Abrams, da Georgia, e Ben Jealous, de Maryland, como o terceiro líder negro brilhante, bem-sucedido e progressista a ser eleito para representar o Partido Democrata em uma disputa para governador em novembro deste ano. As três eleições serão muito difíceis, mas o sucesso é possível.

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Lamento se você já tenha me ouvido dizer isso antes, mas é difícil entender um momento na história quando o estamos vivendo. A história é melhor vista, compreendida e valorizada em retrospecto. Ainda assim, já é possível dizer que estamos presenciando algo potencialmente monumental. Não chegarei ao ponto de chamar esse momento de nova Reconstrução, mas não vemos a possibilidade desse tipo de representação política em nível estadual desde os anos que se seguiram à Guerra Civil.

Como isso aconteceu?

Primeiro, deixe-me traçar um panorama geral, depois, podemos nos aprofundar nos detalhes.

Os três candidatos são amplamente conhecidos e respeitados em seus estados de origem. Não são criações fictícias de uma máquina política. Eles vêm trabalhando duro para as pessoas na Flórida, na Georgia e em Maryland há mais de uma década. Têm redes políticas bem estabelecidas. Antes que os holofotes estivessem sobre eles, cada um já havia lutado por mudanças e vencido em muitas ocasiões diferentes. Gillum, agora prefeito de Tallahassee, foi a pessoa mais jovem eleita para o conselho da cidade, aos 23 anos. Abrams é uma ex-deputada estadual que serviu como líder minoritária da Câmara dos Representantes da Georgia por seis anos. Jealous é um político de primeira viagem que se tornou ativista durante seus anos de universidade e acabou trabalhando para se tornar o presidente mais jovem da NAACP, a Associação Nacional para o Progresso de Pessoas de Cor.

Eles compreendem o cenário da mídia. Eles vêm atuando no grande palco político. Eles falam para grandes públicos. Eles compreendem as nuances das campanhas para fazer as pessoas votarem e dos locais de votação. Eles construíram e gerenciaram equipes e organizações. Todos são vistos como jovens – Jealous tem 45 anos, Abrams, 44, e Gillum, 39 – mas, na verdade, são veteranos políticos experientes que têm estado na esfera pública durante toda a vida adulta.

É por onde precisamos começar. Qualquer outra coisa colocará o crédito por suas vitórias onde ele não pertence exatamente. Gillum, Abrams e Jealous venceram porque suas vidas e carreiras se percorreram esse caminho até aqui. Não quero parecer precipitado, mas os três são vencedores. Eles esperavam vencer. Eles já venceram antes. E isso importa.

Todos são também conciliadores práticos e realistas. Sim, eles têm pontos de vista e políticas fortes, mas todos os três entendem que, para fazer as coisas acontecerem nos níveis estadual ou local, é preciso construir coalizões funcionais de diversos grupos. A base dessa coalizão pode muito bem ser negra – todos têm uma base muito forte de apoio negro construída por eles e com a qual trabalham –, mas há muito tempo aprenderam como construir coalizões mais amplas para atingir seus objetivos.

Vejamos o senador Bernie Sanders. Ele apoiou Gillum, Abrams e Jealous e também viajou para a Flórida e Maryland para fazer campanha junto com os candidatos. (Sanders apoiou Jealous quase um ano antes da primária de junho, mas anunciou estar ao lado de Gillum e Abrams poucas semanas antes das eleições). Os esforços do senador de Vermont ajudaram a solidificar a base progressista para esses candidatos. Todos dizem que isso fez a diferença. Na verdade, Gillum tuitou um agradecimento a Bernie Sanders horas depois de ganhar sua eleição. O apoio de Sanders não foi o suficiente para que vencessem, é claro, mas, definitivamente ajudou. Sua base é profundamente comprometida e confia nele. Eles doam. Eles comparecem a eventos. Eles trabalham como voluntários e fazem campanha por telefone. A rede de Sanders deu uma carga extra às campanhas já progressistas do trio.

Vamos fazer uma pausa por um momento. Isso é algo muito grande. Ao reunir uma base de votação negra altamente engajada com a base de apoiadores profundamente empenhada de Sanders, Gillum, Abrams e Jealous conseguiram o que os democratas precisarão fazer se quiserem ter algum sucesso real mais à frente: eles unificaram a base dedicada do Partido Democrata com os Berniecratas. Isso não é pouca coisa – e não sei ao certo se alguém além desses três candidatos negros para governador poderia ter feito algo parecido.

Então, essa é a macronarrativa. Gillum, Abrams e Jealous venceram porque são organizadores políticos profundamente enraizados e altamente experientes, com bases pré-estabelecidas de apoio e que sabiam que, para vencer, precisariam de coalizões inteligentes.
Mas a política é local. E a verdade é que Gillum, Abrams e Jealous tomaram uma série de decisões locais essenciais que repercutiram bem junto a seus eleitores. Basicamente, em vez de saltar para o meio e não se comprometerem com sérias reformas políticas, fizeram exatamente o oposto e assumiram fortes posições na expansão do acesso à saúde, na reforma da justiça criminal, nos direitos civis e direitos de voto, em salários mínimos, melhores escolas e melhores salários para os professores e muito mais. Essas questões repercutiram profundamente com os eleitores – tanto que Gillum foi superado por um fator de cinco pela favorita na corrida, Gwen Graham, mas ainda assim ganhou. (Gillum era o único não-milionário na disputa, mas o apoio financeiro dos bilionários liberais George Soros e Tom Steyer, através de seus grupos Open Society Foundations e NextGen America, foi fundamental para sua campanha).

Gillum também assumiu uma posição significativa sobre uma questão que repercute fortemente com os eleitores da Flórida, que viu vários tiroteios em massa nos últimos anos: reforma das armas. No início de 2017, ele foi saudado por derrubar uma ação movida pelo lobby das armas e apoiada pela National Rifle Association. Nenhum outro candidato poderia dizer isso. Em troca, conseguiu o apoio de grupos de reforma das armas como o Moms Demand Action, que declarou apoio a ele em abril. Jovens ativistas sobreviventes do tiroteio na escola Parkland fizeram campanha por ele.

Tudo isso importava.

Mas, no final, Gillum, Abrams e Jealous chegaram até aqui porque se organizaram melhor do que seus oponentes. Construíram complexas estratégias que levaram as pessoas a votar. Percorreram seus estados, realizando comícios e falando com representantes municipais, apertando mãos, olhando os eleitores diretamente nos olhos e respondendo a perguntas difíceis. Eles foram a centros comunitários e lares de idosos. Eles realizaram grandes eventos, mas acabaram conquistando as pessoas nas salas de estar e nas mesas das cozinhas.

Muitas coisas da campanha presidencial de 2016 me desconectaram do Partido Democrata. E não é só a presidência: o partido não tem controle sobre a Câmara ou o Senado. O mesmo vale para a maioria das legislaturas estaduais e governos em todo o país. Mas esses candidatos me dão esperança. Eles são diferentes.

Tradução: Cássia Zanon

 

Atualização: 19/09/18

Erro: Na versão original do texto, o título dava a entender que Andrew Gillum, Stacey Abrams e Ben Jealous poderiam se tornar os primeiros governadores negros da história dos EUA. Na realidade, eles seriam os primeiros de seus próprios estados.

 

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