José Arivaldo Rodrigues, ou Zé Turin, como é conhecido, foi eleito vereador de São Paulo em 2016 pelo PHS, o Partido Humanista da Solidariedade. De lá para cá, Turin juntou R$ 415,8 mil em salários referentes aos 22 meses de trabalho prestado como parlamentar.
Em São Paulo, o salário de um vereador é de R$ 18,9 mil, um valor vinte vezes maior que o do salário mínimo (R$ 937). Mas, ao que parece, o dinheiro não foi suficiente para que o vereador consiga sobreviver. Um funcionário do gabinete de Turin, que não quis se identificar, contou ao Intercept que foi coagido pelo parlamentar a emprestar dinheiro para ele. Ele não é o único.
“Ele pedia ajuda porque dizia que estava endividado. E a gente ajudava porque era nosso chefe. Mas ele nunca pagou de volta”, afirmou o servidor, que ocupa um cargo de confiança no gabinete e ganha cinco vezes menos do que o vereador (cerca de R$ 3,5 mil).
No funcionalismo público, há dois tipos de servidores: os que ocupam cargos de confiança, ou seja, que não precisam prestar concurso, e os de carreira, que estão lá porque foram aprovados no concurso. A diferença de um para outro é que, enquanto funcionários de carreira têm estabilidade, os contratados em regime de comissão podem ser demitidos a qualquer momento. O funcionário que emprestou o dinheiro para o vereador, portanto, poderia perder perder o emprego se negasse o pedido do chefe.
Só esse funcionário em questão emprestou mais de R$ 38 mil a Turin em 2017 e, desde então, nunca mais viu a cor do dinheiro. O servidor foi obrigado, inclusive, a pedir para um parente realizar um empréstimo porque que ele mesmo já tinha realizado outros dois e não tinha mais créditos no banco onde era cliente.
O funcionário transferiu todo o dinheiro que emprestou para a conta de Ari de Moura Rodrigues, filho de Zé Turin. Segundo o servidor, essa foi uma orientação passada pelo próprio parlamentar. O Intercept teve acesso a todos os comprovantes de empréstimo feitos pelo servidor e também das transferências bancárias realizadas por ele para a conta de Ari de Moura Rodrigues.
Seis funcionários endividados
Os empréstimos motivaram um inquérito do Ministério Público de São Paulo contra Zé Turin, aberto em 22 de junho de 2018.
A promotoria decidiu investigar o parlamentar depois que um funcionário foi até o Ministério Público fazer uma denúncia anônima, segundo a qual o vereador estaria coagindo funcionários a emprestar dinheiro para ele. O inquérito cita seis nomes de servidores de Zé Turin que teriam sido obrigados a emprestar dinheiro ao parlamentar.
A investigação também apura suspeitas de o vereador ter obrigado funcionários a devolverem parte de seus salários para ele e de suposta existência de “funcionários fantasmas” nomeados por Zé Turin para seu gabinete na Câmara. Segundo a denúncia anônima, esses servidores só apareceriam uma vez por mês para assinar o livro de ponto.
Segundo o professor de Direito Administrativo da PUC-SP, Rafael Valim, a conduta de Zé Turin pode fazer com que ele perca o mandato, com base na Resolução 07/2003, que faz parte do regulamento interno da Câmara. Segundo a norma, o vereador pode ser cassado se “usar os poderes e prerrogativas do cargo para constranger ou aliciar servidor, colega ou qualquer outra pessoa sobre a qual exerça ascendência hierárquica, com o fim de obter favorecimento indevido”.
A mesma resolução instituiu a Corregedoria da Câmara Municipal de São Paulo, órgão responsável por receber e analisar denúncias contra vereadores em eventuais práticas de irregularidades cometidas por eles. Mas, por medo de represálias, nenhum funcionário denunciou Zé Turin ao órgão responsável.O vereador ainda pode responder na esfera penal e ser alvo de ação de improbidade administrativa, além de enfrentar a uma ação por danos morais na Justiça Trabalhista.
Procuramos o vereador pelo menos três vezes, mas sua assessoria de imprensa se limitou a dizer, em nota, que não tinha conhecimento “desse tipo de prática” no gabinete e que as perguntas seriam enviadas a Turin. Pelo telefone, uma funcionária afirmou que a assessora de imprensa estava em agenda externa com o vereador e que eles entrariam em contato. Ninguém se manifestou.
Filho único de partido nanico
Quando foi eleito, em 2016, o PHS, de Zé Turin fazia parte da base de apoio do então prefeito de São Paulo, o tucano João Doria, futuro governador do estado.
O PHS é um partido pequeno e só possui um representante entre os 55 vereadores da cidade: Zé Turin. Desde o início de sua legislatura até agora, Turin conseguiu aprovar 8 projetos de sua autoria. Um deles é o “disque pichação”, proposta que cria um canal de denúncias contra pichadores.
Vereador ‘queimava’ seus negócios para tentar entrar para a política.
Zé Turin é político de primeira viagem. Em 2010, concorreu a deputado estadual pelo DEM, e não foi eleito. Dois anos depois, disputou uma vaga de vereador em São Paulo pelo PSDB e também não se elegeu.
Antes de entrar para a política, ele era empresário, dono de uma rede de açougues. Quando foi eleito, o jornal Folha de S.Paulo publicou uma reportagem na qual ouviu pessoas próximas ao novo vereador. Quem era próximo a ele dizia que, a cada campanha que Zé Turin participava, ele “queimava” parte dos negócios que tinha. O vereador foi o principal financiador de sua campanha em 2016: investiu R$ 70 mil do próprio bolso, 80% do valor total gasto por ele.
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