Colocar a marca nas garrafinhas custa até R$ 2 milhões. Cervejaria lucrou quase R$ 12 bilhões em 2019, mas quer ajuda com “custos de produção” do álcool em gel.

:batedor: FALTA POUCO TEMPO :batedor:

O Intercept revela os segredos dos mais poderosos do Brasil.

Você vai fazer sua parte para que nosso jornalismo independente não pare?

Garanta que vamos bater nossa meta urgente de R$500 mil até o dia 31 à meia-noite.

Faça uma doação de R$ 20 hoje!

QUERO APOIAR

:batedor: FALTA POUCO TEMPO :batedor:

O Intercept revela os segredos dos mais poderosos do Brasil.

Você vai fazer sua parte para que nosso jornalismo independente não pare?

Garanta que vamos bater nossa meta urgente de R$500 mil até o dia 31 à meia-noite.

Faça uma doação de R$ 20 hoje!

QUERO APOIAR

Ambev embala ação de marketing como filantropia e vende patrocínios em garrafas de álcool em gel

Cotas custam até R$ 2 milhões; cervejaria lucrou quase R$ 12 bilhões em 2019, mas quer ajuda com "custos de produção" do álcool em gel.

Colocar a marca nas garrafinhas custa até R$ 2 milhões. Cervejaria lucrou quase R$ 12 bilhões em 2019, mas quer ajuda com “custos de produção” do álcool em gel.

A crise do coronavírus

Parte 22


A Ambev anunciou que vai usar uma de suas fábricas de cerveja para produzir 500 mil unidades de álcool em gel. A maior cervejaria do mundo, dona de marcas como Brahma, Skol, Antarctica e Stella-Artois, disse que irá doar o produto a hospitais públicos do Rio, de São Paulo e de Brasília. A empresa ainda se comprometeu a arcar com os custos e a logística das entregas. Parece um simples e generoso ato de filantropia. Mas não é bem assim.

O que a Ambev está propagando em redes sociais como boa ação livre de interesses econômicos, contudo, embute uma estratégia de marketing para a própria empresa e para outras companhias surfarem em uma campanha de marketing embalada como filantropia.

Num grupo de WhatsApp divulgado no Linkedin pelo diretor de Inovações Felipe Cerchiari, e a cujo histórico o Intercept teve acesso, a Ambev propôs a outras empresas que financiassem a produção de novos lotes do álcool em gel em troca de publicidade nas embalagens e divulgação de mídia. A depender da quantidade de dinheiro investido, o logotipo impresso nas embalagens varia de tamanho conforme o gasto.

Todas as empresas têm direito a promover a boa ação em suas redes sociais – uma ação publicitária de baixo custo e com boas chances de chegar em milhões de pessoas.

Segundo o catálogo, as cotas de patrocínio custam de R$ 60 mil a R$ 2 milhões. Quem se dispôs a comprar a maior delas terá a logomarca exposta no rótulo das garrafinhas de álcool em gel no mesmo tamanho que a da Ambev. Além disso, recebe permissão para anunciar a iniciativa em redes sociais e na imprensa.

Já R$ 600 mil dão direito à logomarca no rótulo, só que em tamanho reduzido, junto aos outros apoiadores, e divulgação. A menor cota compra apenas a possibilidade de se anunciar como parceiro da benfeitoria em campanhas publicitárias. Com um detalhe: todas as ações de marketing precisam que ser previamente aprovadas pela Ambev.

Em 2019, a Ambev teve lucro líquido de R$ 11,78 bilhões. Cada garrafa do álcool em gel custa R$ 3 para produzir, segundo a cervejaria – o que significa que o primeiro lote, pago por ela, custará R$ 1,5 milhão ao todo. É menos do que o valor da cota principal de patrocínio, e o equivalente a 0,01% do lucro da gigantesca cervejaria no ano passado. Ainda assim, a Ambev quer que outras empresas ajudem a bancar o que venderá como uma boa ação dela.

“E o que você ganha com isso?”, diz o documento da Ambev logo após apresentar os valores. “Bom, primeiro você ganha um futuro e a chance de ajudar nosso país. Esse é o nosso maior e único intuito”, jura o texto. Mas a generosidade só resiste até a página seguinte. “Depois, você pode compartilhar a visibilidade dessa parceria de acordo com a quantidade de garrafas investidas”.

Ao entrar no grupo, representantes de empresas como iFood, Alelo e Scania recebiam uma apresentação com a proposta de parceria. A Ambev tenta, no documento, convencer as grandes corporações que a visibilidade e o retorno serão garantidos.

Ambev embala ação de marketing como filantropia e vende patrocínios em garrafas de álcool em gel
Ambev embala ação de marketing como filantropia e vende patrocínios em garrafas de álcool em gel

Conversas do grupo de WhatsApp criado por um diretor da Ambev para vender a boa ação da empresa a patrocinadores: “Impactar pessoas e avançar no combate ao corona”.

A Ambev jura que não terá lucro e que as contribuições serão divulgadas na internet. Pode até ser. Mas há um ganho imensurável que a corporação não comenta – a imagem de que está agindo movida puramente pelo desejo de ajudar a sociedade num momento de crise de saúde pública. O que é desmentido pela estratégia de marketing.

Também há o que, no linguajar de relações públicas, se chama de mídia positiva espontânea – quando emissoras de tevê, rádio, sites, revistas e jornais falam bem de uma empresa no espaço editorial, de graça. Isso é cuidadosamente medido por assessorias de imprensa e departamentos de marketing.

Cada espaço obtido pela boa ação é contabilizado como o custo de um anúncio no veículo e horário ou espaço em que a matéria foi veiculada. Ou seja – é dinheiro. O que conta mais: uma propaganda paga no intervalo do Jornal Nacional ou uma possível reportagem no próprio jornal sobre a boa ação da Ambev?

Você possui 1 artigo para ler sem se cadastrar

Diante disso, uma cota de R$ 2 milhões para estampar a marca no rótulo de um produto que sumiu das prateleiras e pode salvar vidas é o que no mercado se chama de grande oportunidade. Para efeitos de comparação, 30 segundos nos intervalos comerciais do Fantástico, programa dominical da Rede Globo, horário nobre para anunciantes na televisão brasileira, custam quase a metade – R$ 1,06 milhão, em valores de julho passado. No Jornal Nacional, ainda mais: R$ 1,3 milhão.

A publicidade gratuita já começou. O simples anúncio da fabricação do álcool gel garantiu à Ambev destaque em diversos veículos. A coisa se espalhou a tal ponto que uma fake news de que a empresa distribuiria o produto de graça foi usada para infectar telefones celulares com malware.

Não à toa, já havia patrocinadores confirmados quando a Ambev divulgou a oportunidade – “eles pedirem pra não divulgar até fecharmos tudo certinho. Mas tem 2 de varejo, uma de bens de consumo e 2 de alimentos já”, garganteou Cerchiari no grupo de WhatsApp. Mantivemos a grafia original da mensagem.

O diretor também antecipou o próximo passo da Ambev: arrecadar colaborações de pessoas físicas via crowdfunding, as vaquinhas virtuais. “Nessa primeira fase vamos buscar as empresas. Acho que uma fase seguinte poderia ser com pessoas físicas. Vamos falando”, escreveu. “A princípio A maior ajuda agora é com $ para produção. Por isso a busca pelas grandes empresas”, prosseguiu.

O grupo de WhatsApp durou poucas horas: foi criado na noite de quarta, 18, e encerrado no fim da manhã seguinte, com o anúncio de que os acordos seriam formalizados e o projeto deverá ser divulgado hoje, sexta-feira.

O entusiasmo das despedidas deixa entrever que será um bom negócio para todos. “Quero agradecer o engajamento de todos, bonito de ver a colaboração”, disse um dos participantes. “Parabéns a todos, vamos seguir com fé e esperança que tudo passa, mais enquanto isso temos que ter os cuidados necessários. Colaborativo. Engajados. Solidários. Compreensivos”, comoveu-se outro.

Questionada, a Ambev respondeu em nota apenas que “se une à intenção de centenas de outras empresas do país nos esforços conjuntos para mitigar os efeitos da Covid-19 à população”.

JÁ ESTÁ ACONTECENDO

Quando o assunto é a ascensão da extrema direita no Brasil, muitos acham que essa é uma preocupação só para anos eleitorais. Mas o projeto de poder bolsonarista nunca dorme.

A grande mídia, o agro, as forças armadas, as megaigrejas e as big techs bilionárias ganharam força nas eleições municipais — e têm uma vantagem enorme para 2026.

Não podemos ficar alheios enquanto somos arrastados para o retrocesso, afogados em fumaça tóxica e privados de direitos básicos. Já passou da hora de agir. Juntos.

A meta ousada do Intercept para 2025 é nada menos que derrotar o golpe em andamento antes que ele conclua sua missão. Para isso, precisamos arrecadar R$ 500 mil até a véspera do Ano Novo.

Você está pronto para combater a máquina bilionária da extrema direita ao nosso lado? Faça uma doação hoje mesmo.

Apoie o Intercept Hoje

Conteúdo relacionado

Inscreva-se na newsletter para continuar lendo. É grátis!

Este não é um acesso pago e a adesão é gratuita

Já se inscreveu? Confirme seu endereço de e-mail para continuar lendo

Você possui 1 artigo para ler sem se cadastrar