Enquanto Jair Bolsonaro chamava o coronavírus de gripezinha em discurso, a direção do Hospital Central da Polícia Militar do Rio de Janeiro, o HCPM, solicitava a convocação de dentistas para dar conta da baixa de médicos e enfermeiros com suspeita da doença no serviço de referência. No ofício, a PM não menciona quantos casos são. Mas o Corpo de Bombeiros contabiliza, até o momento, 16 militares do corpo técnico de saúde do Hospital Central Aristarcho Pessoa afastados com suspeita da covid-19 – oito são médicos.
Diz o ofício da PM: (…) “considerando o aumento da demanda atual e futura”, “a avaliação da convocação extraordinária dos oficiais dentistas” visa “somar esforços neste momento crítico”.
Atualmente, há 450 militares em todo o estado do Rio com suspeita de terem contraído a doença: cerca de 150 bombeiros e 300 policiais militares – 22 deles internados no HCPM e ao menos cinco no Hospital Central Aristarcho Pessoa, conhecido como o hospital dos bombeiros.
Mas os números podem ser ainda maiores. O próprio governo já disse que de cada 100 pacientes com a covid-19, só 14 são identificados. A estimativa é que o Brasil tenha nove vezes mais casos do que o que é oficialmente registrado – a imensa maioria, sem sintomas. Por isso, sem saberem, podem passar a doença para alguém que venha a ter problemas mais graves.
Os militares que atuam na linha de frente da saúde no Rio estão preocupados com a situação da tropa. O diretor-geral de Saúde do Corpo de Bombeiros, o coronel Roberto Kazumi Baldas Miura, solicitou, via termo emergencial, a compra de 9 mil testes rápidos para detecção da covid-19. A quantidade é estimada para seis meses, “já que estimativas governamentais apresentam diminuição do número de casos para setembro de 2020”.
Na justificativa, o coronel leva em consideração que “a curva de pacientes infectados está crescendo exponencialmente”, que “a infectividade da covid-19 é muito alta”. Com os testes, segundo o ofício, o Corpo de Bombeiros quer assegurar que não precisará afastar militares apenas com suspeita para não ocorrer falta de mão de obra, como já está acontecendo.
Além da falta de médicos, enfermeiros e técnicos para lidar com a pandemia que afeta os militares do Rio, também não há equipamentos médicos e insumos para limpeza e proteção dos agentes que estão na rua e que buscam atendimento em hospitais. Apesar do Rio já ter registrado oito mortes e ter 370 casos confirmados, a PM ainda tem problemas estruturais que podem piorar a crise.
Outro documento ao qual tive acesso mostra que há 14 ambulâncias sem a devida higienização circulando pela cidade. O Grupamento Especial de Salvamento e Ações de Resgate da PM enviou ofício para Diretoria de Saúde informando que, embora haja uma empresa contratada, eles estão “sem quaisquer serviços específicos de limpeza para ambulâncias, embora tenham sido por nós solicitados”. O documento, datado do dia 13 de março, clamava “diante da Pandemia do Coronavírus, solicito ciência e providências cabíveis, com a urgência que o assunto requer”. A limpeza, porém, ainda está pendente.
Você sabia que...
O Intercept é quase inteiramente movido por seus leitores?
E quase todo esse financiamento vem de doadores mensais?
Isso nos torna completamente diferentes de todas as outras redações que você conhece. O apoio de pessoas como você nos dá a independência de que precisamos para investigar qualquer pessoa, em qualquer lugar, sem medo e sem rabo preso.
E o resultado? Centenas de investigações importantes que mudam a sociedade e as leis e impedem que abusadores poderosos continuem impunes. Impacto que chama!
O Intercept é pequeno, mas poderoso. No entanto, o número de apoiadores mensais caiu 15% este ano e isso está ameaçando nossa capacidade de fazer o trabalho importante que você espera – como o que você acabou de ler.
Precisamos de 1.000 novos doadores mensais até o final do mês para manter nossa operação sustentável.
Podemos contar com você por R$ 20 por mês?