Após testar positivo para o novo coronavírus, a universitária Carolina Acosta postou a notícia em seu Facebook e aproveitou para relatar os graves sintomas que sentia.
‘Não é uma simples gripe’, dizia no texto a estudante de 23 anos, já em isolamento domiciliar. A postagem logo viralizou e alcançou centenas de usuários.
No começo, recebeu muitas mensagens de apoio e desejos de melhoras. Depois, apareceram comentários agressivos. Usuários acusavam Acosta de espalhar boatos e duvidavam de seu diagnóstico. Com o assédio digital, a estudante de Relações Internacionais teve crises de ansiedade. Isolada e sozinha, os sintomas da covid-19 pioraram.
Nesta segunda, 23 de março, quando entrei em contato com Acosta após ler sua história, ela me contou que havia recentemente sido internada em um hospital, porque sua saúde piorara. Conversamos via Facebook Messenger. Acosta está isolada em um quarto de hospital onde se sente discriminada pelos profissionais de saúde.
‘Todos aqui me olham com medo, como se eu fosse uma aberração. Escutei a enfermeira que me dá remédios dizer que é agoniante ficar no meu quarto’, relatou a estudante ao Intercept.
No início de março, em meu estágio no governo de Minas Gerais, eu e meus dois chefes tivemos uma reunião de rotina com dois empresários estrangeiros que vieram da Europa e estavam de saída do Brasil para os EUA. Foi uma reunião rápida, de cerca de 30 ou 40 minutos, em uma sala grande e bem ventilada.
Cinco dias depois, recebi uma ligação do estágio me pedindo para ir lá com urgência: era para avisar que os empresários que haviam se reunido conosco aquele dia testaram positivo para coronavírus quando chegaram nos EUA – um deles estava em estado grave. Fizemos os exames, recebemos orientações e fomos enviados para o isolamento domiciliar. Em meu caso, logo apareceram os sintomas.
Não sou brasileira, mas estudo e trabalho aqui em Minas Gerais. Tenho família no exterior, que entrou em desespero com a notícia. Felizmente, minha mãe estava de férias no Brasil e pôde ficar por aqui para me ajudar. Fiquei em um apartamento vazio de um amigo, onde passei a cumprir o isolamento com acesso a um estoque de comida.
No dia seguinte aos exames, uma sexta-feira à noite, comecei a sentir dor de cabeça. No sábado, acordei com mais dor e, domingo, me senti muito mal. Fui fazer o almoço e pensei que fosse desmaiar. Estava sentindo muita dor de cabeça e no corpo, fraqueza e febre, mas estava aguentando.
Na segunda-feira, os sintomas aumentaram de intensidade. A febre foi a 40° e comecei a sentir falta de ar, quando eu respirava doía tudo, principalmente meu tórax. Uma dor de cabeça que ia da testa até a nuca e parecia que ia me matar. Uma fraqueza que me deixou sem forças para nada.
Na terça-feira vieram os resultados para o exame da covid-19 que havia feito na semana anterior: positivo para mim, negativo para meus chefes. Até aquele momento, eu não tinha apresentado nenhum sintoma de gripe, como coriza, espirros, constipação. Cheguei a suspeitar de dengue, porque já a tive ano passado, os sintomas são parecidos, e se eu não tivesse sido avisada do contato com alguém contaminado por coronavírus, talvez acreditasse que estivesse com dengue de novo.
A covid-19 não é uma simples gripe. Parece que caí de um prédio de 100 andares, com a sensação que a cabeça vai explodir. Você não sente fome nem sede, por isso os lábios e garganta secam e sua única vontade é se deitar, mas até deitar dói.
Durante esse tempo, fui monitorada remotamente pelo CIEVS. Ligavam periodicamente me perguntando como estava minha febre, os sintomas e se eu havia saído de casa. Recebi kits com termômetro, soro e paracetamol. Havia até uma psicóloga na equipe.
Fui atacada por estar com coronavírus
No dia em que saiu o resultado do meu exame, fiz uma postagem no Facebook para divulgar os sintomas da covid-19, que não são só o de uma gripe e que também podem ser confundidos com dengue.
Muita gente me procurou perguntando por mais informações e para saber como eu estava, mas havia também mensagens bem pesadas. Vinham me chamar de mentirosa, falavam que eu queria gerar o caos no Brasil e desqualificar o que o Bolsonaro dizia. Também escreveram que o coronavírus é apenas uma gripe e que eu estava com outra doença. Pediam provas do meu diagnóstico e comentavam em fotos antigas.
Precisei colocar muitas coisas do meu perfil em modo privado. Passei a evitar entrar em redes sociais porque as notícias do país e xingamentos só me deixavam pior. Ainda em isolamento domiciliar, tive crises de ansiedade. Ficar sozinha não é muito legal, e a dor de cabeça era tão insuportável que eu não conseguia me distrair nem com séries ou livros.
Também tive a notícia de que contagiei um amigo antes de eu ter sabido que podia ter contraído a covid-19. Somos colegas de curso e havíamos ido almoçar juntos depois de uma aula da faculdade. Na última sexta-feira, dia 20, ele foi internado com os mesmos sintomas que eu. No domingo, foi minha vez, pois minha febre aumentou, comecei a sentir muita falta de ar e meu tórax inchou. Avisei minha mãe, e ela chamou uma ambulância.
Ainda estou muito cansada e me sentindo fraca, mas estou estável, apesar do atendimento que recebo no hospital. Entendo a gravidade da situação, mas todos aqui me olham com medo, como se eu fosse uma aberração. Nenhum médico quis realmente falar comigo.
Internada, fiz um raio-x e tentei puxar assunto com o enfermeiro, que me ignorou. Parece que não tenho mais nome. Sou chamada de ‘a paciente isolada’. Entram aqui, medem a febre e não perguntam como estou me sentindo. Outro dia, ouvi a enfermeira que me dava remédios dizer que era ‘agoniante ficar no meu quarto’.
Quem puder se prevenir e se proteger, faça isso. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o novo coronavírus oferece sim risco de saúde a jovens e já há mortes de pessoas mais novas no Brasil. Apesar disso, ainda há jovens furando a quarentena para ir a festas e até visitar os avós.
Cuidem de vocês e de quem vocês amam. Não desejo essa doença para ninguém.
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