O maior colégio eleitoral do país se prepara para uma eleição municipal com muitas novidades. A união Bolsodoria, que aglutinou a direita na eleição para governador, não existe mais. Os candidatos de Doria e Bolsonaro agora disputam o mesmo eleitorado e aparecem nas primeiras colocações. A esquerda novamente vai disputar o pleito dividida, tendo o PSOL como o único com chances ir para o segundo turno, segundo as pesquisas.
Apesar da alta rejeição de Bolsonaro na cidade (47%), 27% dos paulistanos ainda consideram que ele tem feito um bom ou ótimo governo, segundo o Ibope. O antipetismo continua sendo uma força política bastante presente na capital paulista: 36% do eleitorado diz que não votaria de jeito nenhum em um candidato do PT. Apesar dessa rejeição, o partido ainda é o preferido dos paulistanos (23%), mas até agora não viu o seu candidato sair do traço nas pesquisas.
Russomano, o candidato bolsonarista, aparece em primeiro, o que não quer dizer muita coisa se levarmos em conta que, nas duas últimas eleições municipais, ele largou na frente, mas acabou fora do segundo turno. Desta vez, porém, o cavalo paraguaio pode ser beneficiado pela decisão das emissoras em cancelar os debates na TV, nos quais o bolsonarista costuma ter desempenhos pífios, como no último realizado pela Band.
Segundo pesquisa Datafolha, Russomano vem oscilando para baixo nas intenções de voto, enquanto o candidato de Doria, o atual prefeito Bruno Covas, vem oscilando para cima. Russomano representa a extrema direita, Covas representa uma candidatura de centro-direita. Apesar de ser o candidato de Doria, que topou apoiar a extrema direita na eleição presidencial, Covas tem um perfil mais moderado e declarou voto nulo em 2018. O tucano ainda tem a vantagem de ter quatro vezes mais tempo de TV que o candidato bolsonarista.
O ex-governador Márcio França é do PSB, tem o apoio do PDT de Ciro Gomes e se apresenta como um candidato de centro-esquerda, apesar de muitos esquerdistas terem dificuldade em enxergar o ex-vice de Alckmin assim. Apesar de ter sido chamado de “Márcio Cuba” por Doria em 2018, França chegou até a flertar com um apoio de Bolsonaro nesse ano, apostando no voto anti-Doria. Os dois estiveram juntos em São Vicente, reduto político de França. O candidato do PSB aparece em quarto lugar com 8% das intenções de voto e dificilmente decolará nas pesquisas.
O líder nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, o MTST, é o único candidato de esquerda com chances de impedir um segundo turno entre o candidato de Bolsonaro e o de Doria. Na pesquisa espontânea, ele aparece empatado na liderança com Bruno Covas. Na estimulada, está em terceiro, mas é o que mais tem crescido. Com Erundina de vice na chapa, considerada por muitos (eu incluso) a melhor prefeita que a cidade já teve, é a candidatura com o maior apelo eleitoral no campo de esquerda, conquistando o apoio de petistas históricos.
A candidatura de Boulos, na prática, esvazia o petismo em São Paulo e pode colocar o PSOL como o novo protagonista da esquerda na cidade.
Carismático e articulado, Boulos tem feito sucesso nas redes com uma estratégia de comunicação inteligente que visa furar a bolha derrubar o estigma de “invasor” propagado pela direita e boa parte da grande imprensa. A expectativa é que a força nas redes compense os míseros 17 segundos que o candidato terá de propaganda eleitoral na TV.
A candidatura de Boulos, na prática, esvazia o petismo em São Paulo e pode colocar o PSOL como o novo protagonista da esquerda na cidade. As últimas pesquisas mostram o tamanho do buraco em que está o PT na cidade de São Paulo. Depois do ex-prefeito Haddad perder a eleição no primeiro turno, hoje Tatto aparece com 1% ao lado das candidaturas de partidos nanicos da esquerda como PCO e PSTU e atrás de extremistas de direita bizarros como Levy Fidelix e Mamãe Falei. No debate, o petismo foi atacado por grande parte dos candidatos, que apostam na força do antipetismo, mas Tatto não foi capaz de defender o legado petista e preferiu se focar em apresentar seu histórico como secretário de Transportes. É um homem da burocracia do partido, sem apelo eleitoral e traquejo para debater as grandes questões da cidade.
O PT teimou em sair com candidatura solo mesmo sem ter um candidato conhecido pelos paulistanos e com as pesquisas apontando que o antipetismo ainda é uma das principais forças politicas capital. Agora Jilmar Tatto tem uma missão impossível: ganhar a simpatia do eleitor apesar de ter o carisma de um picolé de chuchu para sair do 1%. A candidatura não empolga nem petistas tradicionais. A esperança do partido é que as aparições de Lula na propaganda de TV possam alavancar a candidatura. Lula demorou para apoiar Tatto e até agora não parece muito empolgado com ele. O PT é o partido de esquerda com mais tempo de TV, quatro vezes maior que a candidatura de PSOL e PCdoB. Será uma boa oportunidade para conferir o tamanho da influência da TV em campanhas eleitorais.
Orlando Silva, do PCdoB, um dos dois únicos candidatos pretos da disputa junto com Vera Lúcia, do PSTU, aparece também com 1%. Isso mostra como o voto útil de esquerda em Boulos minou as chances de outras candidaturas. É curioso como a candidatura de Orlando foi completamente esquecida pela esquerda da cidade. Isso talvez se deva ao fato dele ser o candidato canhoto mais crítico à hegemonia do PT dentro do campo de esquerda, tendo dado declarações que causaram incômodo entre a militância petista nas redes. É um homem de perfil moderado e conectado com as periferias da cidade. Foi ministro de Lula e um deputado federal atuante. Na minha avaliação, teve o melhor desempenho no debate entre todos os candidatos.
A direita está liderando a corrida, mas Boulos está crescendo e tem chances de chegar no segundo turno. Resta saber se a candidatura psolista terá força para a derrotar a direita num segundo turno em um ambiente eleitoral no qual o antipetismo ainda é um fenômeno vigoroso na capital paulista. Mesmo não sendo petista, Boulos se aproximou do partido nos últimos anos e sofrerá com a rejeição do partido. O fato é que a esquerda em São Paulo já mudou de cara. O PT, que por três vezes elegeu um prefeito e esteve presente em todos os segundos turnos, se vê com um inédito 1% a poucos dias da votação e sem nenhuma esperança de chegar ao segundo turno.
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