A consultoria Alvarez & Marsal recebeu aproximadamente R$ 87,5 milhões, na cotação atual, para atuar na reestruturação da empresa Diamond Offshore Drilling, que entrou em abril de 2020 com um pedido de recuperação judicial na justiça do Texas, nos Estados Unidos. A companhia é fornecedora da Petrobras e atualmente opera duas plataformas no Brasil. O processo de recuperação judicial terminou em abril de 2021 — cinco meses após a Alvarez & Marsal ter anunciado o ex-ministro da Justiça Sergio Moro como “sócio-diretor” em Washington, também nos Estados Unidos.
O valor de 16,5 milhões de dólares pago pela Diamond Offshore Drilling à consultoria consta em documentos judiciais aos quais o Intercept teve acesso. A cifra é maior do que a apresentada pela Alvarez & Marsal ao Tribunal de Contas da União, o TCU, referente a seu faturamento no Brasil. No total, a consultoria disse ter recebido R$ 83,5 milhões no país entre 2013 e 2021.
Do total recebido no caso da Diamond Offshore Drilling, 5,3 milhões de dólares — equivalentes a 32% do valor total — foram pagos após novembro de 2020, mês em que Moro começou a trabalhar na consultoria. Em documento anexado ao processo na justiça do Texas, o CEO Marc Edwards diz que “cerca de 20%” do faturamento da Diamond Offshore em 2019 veio de contratos com a Petrobras.
Em seu mais recente balanço trimestral, a Diamond Offshore Drilling cita uma disputa tributária no Brasil em que a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional questiona a Petrobras em relação ao recolhimento de impostos sobre contratos para afretamento de embarcações e prestação de serviços, como o que a empresa americana possui. A Petrobras saiu vitoriosa do processo no Conselho Administrativo de Recursos Federais, instância administrativa ligada ao Ministério da Economia. Agora, a disputa se dará no Judiciário.
A Diamond Offshore Drilling estimou que o impacto, em caso de derrota, pode ser de até 90 milhões de dólares, segundo documento assinado por um diretor da Alvarez & Marsal anexado ao processo de recuperação judicial. “Nós pretendemos defender nossa posição de forma vigorosa; porém, litígios são inerentemente imprevisíveis, e o resultado final ou efeito de qualquer decisão, processo ou ação não pode ser previsto com precisão”, registra o balanço mais recente.
A Alvarez & Marsal atua em diversos casos de empresas que foram investigadas pela operação Lava Jato, como o Grupo Odebrecht, as construtoras OAS e Queiroz Galvão, o banco BVA, o Grupo Agroserra e o estaleiro Enseada — um consórcio entre Odebrecht, Kawasaki, OAS e UTC.
As prestações de contas anexadas ao processo na justiça do Texas mostram que diversos dos serviços prestados pela consultoria à Diamond Offshore Drilling dizem respeito ao Brasil. Nesses documentos, constam planilhas de horas de funcionários da empresa em escritórios nos Estados Unidos e aqui, que produziram análises e pesquisas para a Diamond Offshore Drilling.
Em nenhum dos documentos o nome do ex-ministro Moro é mencionado. Ele foi contratado em novembro de 2020, sete meses após deixar o cargo de ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, do PL. Por 11 meses, ele recebeu o equivalente a 58 mil dólares de salário para “encontrar as melhores soluções para os complexos desafios que envolvem as áreas de Disputes and Investigations, governança e compliance”, agregando “sua expertise jurídica e investigativa, somada a sua vivência na esfera governamental, aos projetos dos nossos clientes nesse importante momento de maturidade de governança das empresas não só no Brasil como no mundo”, escreveu no LinkedIn o diretor-geral da Alvarez & Marsal Brasil, Marcelo Gomes, ao anunciar a contratação de Moro como “sócio-diretor”.
Na última sexta-feira, 28 de janeiro, o ex-juiz disse ter recebido o equivalente a cerca de R$ 3,46 milhões durante sua atuação na Alvarez & Marsal. Em uma live no mesmo dia, ele afirmou que “nunca recebeu um tostão da Odebrecht”. Procurado pelo Intercept, o ex-juiz voltou a afirmar que “não trabalhava nem recebia do setor de recuperação judicial da empresa norte-americana” e que seu contrato era “com a A&M disputas e investigações, que tem outro CNPJ”. Já a Alvarez & Marsal não respondeu a nosso contato até a publicação desta reportagem.
A atuação de Moro na consultoria é alvo de investigação no Tribunal de Contas da União por suspeita de conflito de interesses. Mesmo que tenha divulgado quanto levou da empresa por cerca de um ano de trabalho, ainda é um mistério o que Moro fez na Alvarez & Marsal, para quais empresas trabalhou, em quais casos atuou e quais pareceres assinou. Essas informações são cruciais para o caso.
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