João Filho

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Paralisa, exonera, decreta sigilo: o método Bolsonaro de combate à corrupção

A cada nova denúncia de corrupção a mesma operação-abafa entra em ação e conta com aliados no Congresso, PGR e STF.

BRASÍLIA, DF, 09.12.2021: EVENTO-DF - O presidente Jair Bolsonaro (PL) participa de evento alusivo ao Dia Internacional Contra a Corrupção, no Palácio do Planalto, em Brasília, nesta quinta. A solenidade é realizada pela CGU e apresenta os resultados do Plano Anticorrupção do governo federal. (Foto: Mateus Bonomi/AGIF/Folhapreess)

BRASÍLIA, DF, 09.12.2021: EVENTO-DF - O presidente Jair Bolsonaro (PL) participa de evento alusivo ao Dia Internacional Contra a Corrupção, no Palácio do Planalto, em Brasília, nesta quinta. A solenidade é realizada pela CGU e apresenta os resultados do Plano Anticorrupção do governo federal. (Foto: Mateus Bonomi/AGIF/Folhapreess)

Foto: Mateus Bonomi/AGIF/Folhapreess

A incompetência generalizada do bolsonarismo no comando do país contrasta com a eficiência para encobrir casos de corrupção envolvendo bolsonaristas. “Não tem o que investigar aqui. Não fazemos nada de errado”, afirmou Bolsonaro na mesma semana em que pipocaram diversos escândalos de corrupção envolvendo integrantes do governo, aliados e seus filhos.

A repetição dessas mentiras descaradas faz parte da estratégia bolsonarista para confundir a opinião pública e empurrar a sujeira debaixo do tapete. O mantra “a corrupção no Brasil acabou”, repetido a todo momento pelo presidente e seus seguidores, será um dos lemas da campanha para a reeleição do governo que mais encobriu corrupção na história da República.

Só nas últimas semanas tivemos os seguintes casos: pastor pedindo propina em ouro em troca de verba no MEC; compra de kit de robótica superfaturado para escolas que não têm nem água encanada; uso do orçamento secreto para a construção de “escolas fake” para turbinar a campanha eleitoral de aliados de Ciro Nogueira em seu reduto eleitoral; empreiteira amiga do governo ganhando a maioria das licitações usando empresas de fachada; Jair Renan Bolsonaro, o 04, fazendo tráfico de influência no governo em favor de um empresário amigo seu. São casos que ficamos sabendo graças ao trabalho da imprensa e de parte do Ministério Público.

Se dependêssemos apenas do trabalho dos órgãos de controle e fiscalização, nada disso teria vindo à tona. Mesmo os casos que se tornam públicos acabam sendo paralisados quando batem em algum órgão aparelhado pelo bolsonarismo. O governo sequestrou todas as instituições de controle e fiscalização do governo como a PGR, a AGU, a CGU,  a PF, o Coaf, a Receita Federal, a Funai e o Ibama. Absolutamente todas as denúncias que respingam no bolsonarismo acabam sendo aplacadas por uma operação-abafa que conta com a ajuda de bolsonaristas no Congresso, na PGR e no STF.

Assim, o terreno tem sido preparado para Bolsonaro tentar a reeleição usando como trunfo eleitoral a narrativa que a corrupção acabou.  “Você pode ver aí quantas vezes aí no Pará o governador recebeu a visita da Polícia Federal. É diferente do governo federal. Aqui não tem visita da PF”, disse o presidente que trocou quatro vezes o diretor-geral da PF em menos de quatro anos para proteger seu mandato, seus filhos e seus aliados.

As exonerações

Quem trabalha nos órgãos de controle, não está alinhado ao bolsonarismo e tenta fiscalizar o governo é imediatamente exonerado. Essa não é uma prática isolada, mas sistemática. Relembremos alguns casos. A delegada da PF responsável pela ordem de prisão do blogueiro Allan dos Santos, que está foragido, foi demitida. Outras duas pessoas do Ministério da Justiça que atuavam no caso também foram afastadas.

O delegado da PF, Alexandre Saraiva, que investigou a atuação do ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles em favor de madeireiros ilegais também foi exonerado. Pouco tempo antes, o governo já havia afastado um superintendente regional do Amazonas que enviou ao STF um pedido de investigação contra Salles.

Em todos os governos anteriores houve corrupção, mas nunca os órgãos de controle foram boicotados de forma tão descarada por um presidente.

O diretor da PF responsável por investigar os elos casos entre milícias do Rio de Janeiro, Queiroz e Flávio Bolsonaro também foi demitido.

O delegado da PF que liderou investigações delicadas para o Planalto também foi afastado. Ele era responsável pela investigação do inquérito das fake news, pela investigação dos ataques de Bolsonaro às urnas eletrônicas, pela investigação sobre organização criminosa dos atos antidemocráticos e apurava também desvios de recursos no Ministério da Saúde envolvendo o filho 04 do presidente. Foi afastado pelo então diretor-geral Paulo Maiurino, que logo em seguida seria substituído.

A atuação benevolente ao bolsonarismo não foi suficiente para manter Maiurino no cargo. Bolsonaro decidiu que precisava de um homem ainda mais alinhado ao governo em um ano eleitoral e decidiu substituí-lo por Márcio Nunes de Oliveira, amigo pessoal de Flávio Bolsonaro.

Todas essas exonerações foram feitas sob um único critério: o de não alinhamento à família Bolsonaro. Quem não foi um completo capacho foi mandado embora.

Decretos de sigilo

Além das exonerações a rodo, o governo se utiliza de outras ferramentas para esconder crimes envolvendo bolsonaristas. Uma delas é o decreto de sigilo, um instrumento completamente banalizado pelo atual governo. Toda informação com potencial para ser espinhosa é colocada sob sigilo via decreto. Segundo a Lei de Acesso à Informação, o sigilo de um documento só pode ser aplicado caso não seja de interesse público — o que não é o caso de nenhum dos decretos de impostos por Bolsonaro.

Não estamos falando de um ou outro caso, mas de dezenas em que este tipo de decreto foi usado sem cumprir os requisitos da lei. O governo já impôs sigilo de 100 anos sobre as informações dos crachás de acesso ao Palácio do Planalto em nome dos seus três filhos parlamentares. O objetivo era o de atrapalhar as apurações da CPI da Covid.

Em 2020, a Câmara fez uma série de pedidos ao governo para informar com quem o presidente se reuniu no Palácio do Planalto. Desejava-se saber quantas vezes lobistas de armas e o advogado da família Bolsonaro, Frederick Wassef, se encontraram com o presidente. Apesar da divulgação dos compromissos públicos de autoridades ser obrigatória por lei, o governo se recusou a atender os pedidos. A justificativa para não cumprir a lei foi a de que essas informações poderiam colocar a segurança de Bolsonaro e sua família em risco.

Bolsonaro acaba de assinar mais um decreto de sigilo que parece mais uma confissão de culpa.

Também em 2020, em meio aos debates sobre a reforma administrativa, o Ministério da Economia colocou sob sigilo todos os documentos relacionados à PEC da Reforma. Não foi a primeira vez que documentos produzidos para defender as teses do governo sobre uma reforma foram escondidos. Em 2019, documentos da Reforma da Previdência também foram colocados sob sigilo.

No ano passado, o general Pazuello participou de um ato político em favor do presidente, o que é proibido pelo estatuto das Forças Armadas. Abriu-se um processo disciplinar contra o general, mas o caso foi arquivado e os motivos são desconhecidos porque o Exército usou o mesmo expediente e colocou os documentos do processo sob sigilo de cem anos.

Com medo da CPI da Covid, o governo também colocou sob sigilo documentos que tratavam das compras de vacinas. Tanto os documentos relacionados à compra da Covaxin quanto os da Pfizer não podem ser conhecidos pela população. E, por falar em vacinas, Bolsonaro também colocou sigilo de cem anos em sua carteira de vacinação.

Nesta semana, Bolsonaro assinou mais um decreto de sigilo que mais parece uma confissão de culpa. Os encontros do presidente com pastores lobistas envolvidos no recente escândalo do MEC foram sonegados. O GSI deu a mesma desculpa de sempre: a divulgação dessas informações colocam em risco a vida do presidente e seus familiares. Depois voltou atrás, e a informação foi liberada: um dos pastores esteve no Planalto 35 vezes entre 2019 e fevereiro deste ano.

Outro caso emblemático foi o do médico bolsonarista Victor Sorrentino, preso no Egito após fazer piadas sexistas para uma mulher muçulmana. O caso se tornou um incidente diplomático, e o governo precisou intervir para liberá-lo. O Itamaraty colocou os documentos envolvendo as negociações com o governo egípcio sob sigilo de cem anos.

A prática é tão descarada que o presidente da República se sente à vontade para debochar publicamente dos cidadãos que questionam o abuso dos decretos de sigilo.

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Reprodução/Twitter

O sequestro das instituições de controle e fiscalização do estado, as exonerações de funcionários públicos que querem investigar corrupção e a banalização dos decretos de sigilo em casos suspeitos não deixam dúvidas de que esse é o governo menos transparente que já se viu desde a redemocratização. Neste ano eleitoral, a máquina do estado será ainda mais utilizada para abafar novas suspeitas de corrupção do presidente, seus filhos, dos militares e seus aliados.

Em todos os governos anteriores houve corrupção, mas nunca os órgãos de controle foram boicotados de forma tão descarada por um presidente, o que nos leva a crer que provavelmente estamos diante do governo mais corrupto da história da República.

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