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ONGs feministas são vetadas em audiência sobre aborto legal

Evento promovido pelo Ministério da Saúde deveria debater manual que incentiva investigação de vítimas de estupro, mas virou palanque antiaborto.


A audiência pública realizada nesta terça-feira, 28, pelo Ministério da Saúde para (supostamente) debater com a sociedade um guia que dificulta o aborto legal virou um palanque para militantes antiaborto em Brasília. Entre os convidados constavam, por exemplo, a juíza Joana Ribeiro Zimmer, que atuou para impedir o aborto em uma menina de 10 anos estuprada em Santa Catarina, e uma conselheira de Donald Trump. Enquanto isso, organizações de defesa dos direitos das mulheres foram deixadas – literalmente – de fora.

Embora convidada, Ribeiro não compareceu. Já Valéria Machado, diretora estratégica do coletivo nacional de advogadas Nascer Direito e membro do colegiado da Rede pela Humanização do Parto e Nascimento, a Rehuna, contou ao Intercept que, ao chegar, foi questionada por uma das funcionárias da organização do evento se era contra ou a favor do aborto. Então, foi mantida de fora da sala onde ocorria a audiência, sob a justificativa de que não havia assentos vagos.

A Rehuna foi uma das organizações que atuou para garantir a presença de acompanhantes no parto e que conseguiu derrubar uma resolução do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro que proibia a adoção de planos de parto – obra de Raphael Câmara, conselheiro do Conselho Federal Medicina e secretário de Atenção Primária à Saúde do ministério. Foi justamente Câmara quem editou o manual que deveria estar em discussão e criou a audiência pública.

Machado estava acompanhada da vereadora de Goiânia Cristina Lopes Afonso, ativista pelos direitos das mulheres e sobrevivente de violência doméstica. “[Saí] de Goiânia às 5h da manhã só para participar desse debate, dessa discussão importantíssima para as mulheres, e a gente está impedida de entrar”, diz Afonso em um vídeo gravado na recepção do prédio do ministério, onde elas foram orientadas a se sentar e acompanhar a audiência por uma televisão que ficava de costas para as cadeiras. Ao fundo, no vídeo, ouve-se a voz de Câmara.

Quando enfim conseguiram entrar, as mulheres gravaram um novo vídeo, mostrando que, ao contrário do que a organização do evento afirmou, havia diversas cadeiras vazias no auditório. “Só queriam restringir o acesso, mesmo”, criticou Machado em conversa com o Intercept.

Mais cedo, a jornalista Andréia Sadi contou que também havia sido contatada por ONGs em defesa dos direitos das mulheres que também haviam sido vetadas do evento.

Conforme orientação divulgada no Diário Oficial da União na última terça-feira, 21, a Rehuna havia enviado um e-mail com sugestões para o manual, mas não foi incluída na lista de participantes do evento. Não havia na publicação do DOU menção a nenhuma lista fechada, nem a previsão de passos a serem dados para garantir a participação. No entanto, nem Machado nem Afonso conseguiram se pronunciar. “A audiência não era pública, era uma reunião em que só se ouvia convidados. A população não teve voz”, disse a advogada.

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