Não é novidade pra ninguém que os quadros da extrema-direita brasileira são de baixíssimo nível intelectual, moral e político. Eles não têm grandes ideias nem propostas relevantes para o país. A mediocridade impera nas fileiras reacionárias que infestam o parlamento brasileiro. Na falta de talento para a política, sobram-lhes os ataques, as mentiras e a lacração. Isso basta para alimentar a base de eleitores na internet, que está viciada em tudo isso e se sente representada quando vê seus políticos fascistóides “lacrando os comunistas”.
Na ânsia por fabricar vídeos com esse tipo de conteúdo para as suas redes sociais, a oposição tem protocolado uma série de pedidos para ouvir o ministro em diferentes colegiados sobre temas diversos como big techs, ocupações do MST, o 8 de janeiro, entre outros. O ministro da Justiça tem sido o mais requisitado. Com apenas quatro meses de governo, Flávio Dino já compareceu três vezes em colegiados da Câmara e terá que voltar outras dez nas próximas semanas. O ministro tem muito o que fazer, a Câmara também, mas a necessidade em gerar vídeos lacradores é uma prioridade para os bolsonaristas.
O que tem se visto nesses encontros são aulas de política ministradas por Dino. Em contraste com a mediocridade bolsonarista, o ministro tem demonstrado inteligência e elegância nos embates. O ministro tem uma oratória invejável e sabe argumentar muito bem, sem deixar de responder a todas as perguntas e rebater as provocações. Quando os extremistas viajam nas mentiras e absurdos, Dino responde com deboche, mas sem perder a elegância. O fim tem sido sempre o mesmo: todos que chegam para lacrar o ministro, voltam para casa lacrados. A humilhação sofrida pelos bolsonaristas não chega a atrapalhar a fabricação de videozinhos lacradores. Tudo se resolve na edição. Nós sabemos como as mamadeiras de piroca são criadas. Nos cortes dos vídeos, os bolsonaristas aparecem de peito estufado, colocando o ministro contra a parede e o deixando sem respostas. Afinal de contas, as respostas de Dino podem ser editadas ou nem precisam aparecer nesses vídeos direcionados para suas bolhas.
O negócio virou um reality show. Na última terça-feira, foi a vez do Senado convocar Dino. O ministro participou de uma audiência na Comissão de Segurança Pública do Senado e tirou os senadores bolsonaristas para dançar. Flávio Bolsonaro (PL), Marcos do Val (Podemos) e Sérgio Moro (Podemos) foram os mais humilhados do dia. Dino distribuiu chineladas intelectuais e morais na bunda de cada um deles. Diante de homens minúsculos, antidemocráticos, covardes, intelectualmente limitados e com reputação moral duvidosa, o ministro demonstrou a firmeza e a segurança próprias de alguém preparado para o debate e que não carrega uma mácula sequer em toda sua vida pública, seja como juiz federal, seja como político.
Respostas inteligentes, articuladas e bem humoradas arrancaram gargalhadas do Senado e de quem assistiu em casa. Nenhuma pergunta ficou sem resposta, nenhuma tentativa de lacração prosperou.
A primeira vítima do ministro foi Flávio Bolsonaro, que o questionou sobre a ADPF 635, que impôs restrições às operações policiais nas favelas do Rio de Janeiro durante a pandemia. Segundo ele, a medida aumentou o número de mortes de policiais no Complexo da Maré e fortaleceu os traficantes. “A população fica refém desses marginais e, só nos últimos cinco anos, foram assassinados 121 policiais em serviço no Rio de Janeiro”, afirmou Flávio, como se um ministro empossado há 4 meses devesse explicações sobre isso. Sem ter muito o que argumentar diante do questionamento tão estúpido, Dino respondeu: “Quem era o presidente da república nos últimos 5 anos? Nós não podemos responder pelos dados estatísticos dos últimos 5 anos, porque dos últimos 5 anos, nós só exercemos 4 meses”, argumentou o ministro. No meio da resposta, Flávio Bolsonaro interveio e tentou iniciar um debate, mas, com muita elegância e uma dose de ironia, o ministro o colocou em seu devido lugar: “É porque, na verdade, é uma audiência pública, os senhores perguntam e eu respondo. Debate eu faço com o maior prazer. Se o senhor me convidar para um debate na sua rede social, eu vou. Eu só tenho que atender 55 convocações do Congresso Nacional”. Flávio insistiu no devaneio de colocar Dino como responsável pelos problemas da segurança pública do Rio de Janeiro: “Os policiais continuam morrendo, e os traficantes estão cada vez mais fortes. O Rio de Janeiro caminha para uma realidade de narcomilícias”, disse sem nem corar o homem que empregou parentes de chefe de milícia em seu gabinete e cuja família tem antigas ligações com os milicianos. A bola estava quicando na pequena área e Dino só empurrou para o gol: “Até o senador Flávio Bolsonaro falou sobre narcomilícia. É um tema que ele conhece muito de perto. Esse casamento de milícia com narcotráfico.”
A necessidade em gerar vídeos lacradores é uma prioridade para os bolsonaristas.
Usando um broche da SWAT, grupo de elite da polícia americana, Marcos do Val tentou intimidar Dino performando uma coragem que visivelmente ele não tem. O senador gosta de se apresentar como “membro de honra e instrutor sênior da SWAT”, mas o fato é que ele apenas deu algumas aulas de defesa pessoal para o grupo. Detalhe: o broche que ele usa na lapela pode ser comprado por R$ 60,00 na internet. Do Val também se diz “Doutor Honoris Causa”, mas a faculdade que lhe concedeu a honraria não existe, conforme apurou o repórter do Estadão André Shalders. Recentemente, o senador confessou que mentiu no episódio em que se tramou um golpe contra Alexandre de Moraes para tentar manipular a Justiça. Como se vê, tudo o que vem de Do Val é fake, mas voltemos ao embate com Dino.
O senador, que foi prestar solidariedade aos invasores golpistas dos Três Poderes na prisão, insistiu na tese estapafúrdia de que o ministro teria sido conivente com a invasão do 8 de janeiro e pediu sua prisão: “eu espero que o ministro seja afastado e, se possível, preso, como foi o ministro Anderson Torres”. A única resposta possível para esse tipo de maluquice é o deboche, que Dino usou com maestria: “As construções mentais que o senhor faz, muito singulares, não tem suporte nos fatos (…) Se o senhor é da Swat, eu sou dos Vingadores. O senhor conhece o Capitão América, o Homem-Aranha?”
Depois, iniciou-se um debate entre dois ex-juiz federais: Moro x Dino. Um debate injusto para Moro, diga-se. Dino é um homem intelectualizado, que passou em primeiro lugar no concurso para o cargo, foi presidente da Associação Nacional de Juízes Federais (Ajufe) e secretário-geral do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Moro é aquilo que conhecemos: um ex-juiz conhecido por corromper o sistema judicial, ter sentenças anuladas e com dificuldades constrangedoras com a língua portuguesa. O xerifinho de Maringá, sempre alerta em defesa dos bons costumes, saiu em defesa de Do Val. Disse que o seu colega foi respeitoso e reclamou que Dino estava sendo debochado. O ministro respondeu: “Eu vim aqui como ministro e senador da República para ser respeitado. Se um senador acha que pode cercear minha palavra, se um senador diz que eu tenho que ser preso, isso é respeito? Pense bem, pense com a sua consciência”. Na sequência, Dino jogou uma carapuça feita sob medida para Moro: “Eu sou uma pessoa honesta, ficha limpa. Eu fui juiz. Nunca fiz conluio com o Ministério Público. Nunca tive sentença anulada. E por ter sido um juiz honesto, ter sido um governador honesto, é que eu não admito que alguém venha dizer que eu deva ser preso. Isso é desrespeito.”
Os embates têm aumentado o capital político de Dino. Ele se tornou o ministro com maior popularidade digital, ultrapassando Haddad.
Humilhado, minúsculo, quase sendo engolido pela cadeira, Moro respondeu: “Se tiver deboche, eu não concordo. Tenho que interromper. Eu conheço muito bem a lei. Sei que na minha gestão reduzimos os assassinatos em 20%. Não aceito ser tratado com deboche”.
Enquanto Flávio, do Val e Moro lançavam mão de mentiras, ataques e intimidações, Dino respondia com argumentações claras, inteligentes, elegantes e com pitadas de ironia e deboche quando necessário. O contraste entre os passados de Dino e do trio bolsonarista é gritante sob qualquer ponto de vista, seja ele moral ou intelectual. O debate entre eles chega até ser covardia, mas quem buscou isso foi o trio. O fato é que, apesar de atrapalhar seu trabalho no Ministério da Justiça, os embates têm aumentado o capital político de Dino e aumentando o seu engajamento nas redes sociais. Ele se tornou o ministro do governo com maior popularidade digital, ultrapassando Fernando Haddad. Os tiros disparados contra Dino podem até estar rendendo alguns likes para os reacionários, mas estão saindo pela culatra. Os fascistoides do bolsonarismo podem estar ajudando a criar um grande candidato à presidência do campo progressista no futuro.
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