O diretor-geral da Polícia Federal diz que são várias as situações que motivaram o deputado Chiquinho Brazão, o irmão, Domingos Brazão, e Rivaldo Barbosa, a planejarem e encomendarem a morte da vereadora Marielle Franco em 2018.
A mais latente é uma disputa imobiliária: os Brazão tinham interesse em fazer loteamentos na zona oeste do Rio, e Marielle se opunha ao empreendimento. O assassino Ronnie Lessa receberia terrenos como pagamento pelo crime.
Em seu relatório final sobre o caso Marielle, a Polícia Federal menciona que Chiquinho foi “surpreendido por dificuldades na obtenção de votos para a aprovação [do projeto], sendo certo que, em primeiro turno, com votos contrários da bancada do Psol e, consequentemente, de Marielle Franco, houve a apresentação de um substitutivo, ampliando a abrangência territorial da lei”.
Segundo as investigações, em 2017 os Brazão haviam infiltrado Laerte Silva de Lima no Psol para monitorar Marielle Franco, pela qual eles tinham “repugnância”. Lima e a mulher se filiaram ao partido naquele ano.
Foi por meio do infiltrado que os milicianos souberam que a vereadora pedia para a população para que não aderisse aos loteamentos erguidos em áreas de milícia. Em 2021, a polícia encontrou documentos que apontavam que Laerte lavou milhões de reais para a milícia com criptomoedas. Ele chegou a ser investigado no caso Marielle, mas isso não foi adiante.
Projeto foi aprovado no dia da morte de Marielle
Na Câmara de Vereadores carioca, Chiquinho Brazão, hoje deputado federal pelo União Brasil – e na época do crime vereador pelo Avante –, tinha um interesse especial no PLC n.º 174/2016, projeto sobre regularização de loteamentos em Vargem Grande, Vargem Pequena, Itanhangá e Jacarepaguá.
O projeto, proposto por Chiquinho, visava favorecer a expansão de construções irregulares na zona oeste, área onde ele, Marcelo Siciliano e Junior da Lucinha disputam votos. Ele já havia tentado aprovar um projeto semelhante anos antes.
Em depoimento que consta no relatório da PF, um assessor da Câmara disse que “o risco da não aprovação do PLC 174/2016 teria causado grande insatisfação do Vereador Chiquinho Brazão com a bancada do Psol e, consequentemente, com Marielle, que votou contra por entender que o projeto não atendia ‘áreas carentes’, mas regiões de classe média e alta”.
Chiquinho não gostou da oposição do Psol e de Marielle. Considerava que o voto contrário da vereadora, e a consequente aprovação apertada do projeto, geraria desgaste político a ele. Conforme a testemunha, Chiquinho ficou irritado, algo incomum para alguém habitualmente “discreto e tranquilo”.
A testemunha apontou o Psol como o “calcanhar de Aquiles” do MDB, partido de Brazão, na época. Ela citou ainda um outro caso que desestabilizou ainda mais o partido, que estava sofrendo os impactos da Operação Lava Jato. Uma ação popular do Psol impediu que o ex-deputado Edson Albertassi, do MDB, fosse nomeado ao Tribunal de Contas do Estado. Isso impediria qualquer gerência do MDB sobre a operação para o Superior Tribunal de Justiça.
A testemunha disse ainda que a morte de Marielle “paralisou o Psol no Rio de Janeiro, uma vez que amedrontou os parlamentares, assessores e demais empregados do partido”.
O relatório da Polícia Federal diz que o descontentamento de Brazão “ocorreu em período compatível com aquele mencionado por Ronnie Lessa” em colaboração premiada, no segundo semestre de 2017, “o que pode ter sido o estopim para que fosse decretada a pena capital de Marielle pelos irmãos Brazão”.
Marielle e Anderson foram executados no dia 14 de março de 2018. Foi coincidentemente a mesma data em que foi aprovada a redação final do PLC n.o 174/2016 no Plenário da Câmara.
O PLC acabou vetado pelo prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, do Republicanos, em 5 de abril de 2018. O veto foi derrubado cerca de um mês depois e a Lei Complementar 188/2018 foi publicada. A vontade de Chiquinho foi cumprida.
Correção: 24 de março de 2024, 20h52
O prefeito responsável por vetar o PLC foi Marcelo Crivella, e não Eduardo Paes. O texto foi corrigido.
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