Não é novidade o fato de que a direita e a extrema direita dão as cartas no Congresso. Estamos falando daquele que talvez seja o congresso mais reacionário de todos os tempos, formado em boa parte por gente que tentou impedir a posse de Lula, fomentando um golpe de estado.
Não se trata de uma oposição convencional, comprometida com valores democráticos. O bolsonarismo é uma corrente essencialmente golpista que, infelizmente, foi naturalizada dentro do jogo político-partidário. A governabilidade, portanto, é um problema com o qual o governo Lula sabia que teria que lidar desde o primeiro dia do mandato.
As sucessivas derrotas do governo em votações na Câmara e no Senado, nesta última semana, reforçam a constatação de que o bolsonarismo é a principal força política no Legislativo.
Graças à sua força eleitoral, ele atrai com facilidade a turma do centrão. Apesar de ser conhecido por topar qualquer negócio, independente da ideologia, o centrão tende a acompanhar o bolsonarismo nas pautas relacionadas aos costumes.
Votar junto do governo em questões caras ao progressismo é praticamente impossível para um deputado do centrão, cuja base eleitoral é majoritariamente conservadora. Em ano de eleições municipais, não há dúvida de que os sanguessugas do centrão vão fechar com o bolsonarismo em questões como saidinha de presos e criminalização de fake news.
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Soma-se a isso o trabalho da pujante indústria de mentiras da extrema direita, que cria um ambiente de pânico moral que já demonstrou ser muito eficiente para conquistar votos. É um nó que parece impossível de ser desatado.
Já na área econômica, o governo conseguiu avançar aprovando projetos importantes. A Reforma Tributária e o arcabouço fiscal, por exemplo, foram aprovados com apoio maciço do centrão.
Lembremos que este não é um governo puro de esquerda. Ele foi formado por uma frente ampla criada para barrar a continuação de um governo de extrema direita fascistoide. É natural que pautas mais alinhadas ao mercado e do interesse de setores da direita avancem com mais facilidade enquanto pautas progressistas são barradas.
Partidos com ministérios deram mais votos contrários ao governo do que a favor nesta semana.
Goste-se ou não, este é um dado da realidade.
Ocorre que o governo tem concedido importantes nacos do poder para a turma do centrão, mas está recebendo muito pouco em troca. Sabendo que a esquerda seria minoritária no Congresso, Lula iniciou o governo distribuindo ministérios para União Brasil, PSD e MDB.
No ano passado, uma reforma ministerial abriu ainda mais espaço para o centrão, acomodando também o PP e o Republicanos em ministérios. Na teoria, essa composição serviria para dar uma maioria folgada ao governo, mas não é o que acontece.
Os parlamentares dos partidos que têm ministérios deram mais votos contrários ao governo do que a favor na maioria das votações desta semana.
No início deste ano, Lula reuniu Arthur Lira, ministros e líderes partidários e presidentes de partidos para tentar aproximá-los do governo. Depois da reunião, Lula abriu os cofres e autorizou a liberação de R$ 20,5 bilhões em emendas de bancadas, individuais e de comissão.
O centrão foi o mais beneficiado, tendo os parlamentares de PP, União Brasil, PSD e MDB recebido os maiores valores. Na teoria, essas emendas deveriam render um apoio maior do parlamento nas votações de interesse do governo, mas, na prática, está servindo apenas para fortalecer a turma do centrão para as eleições municipais.
Além disso, fortalece também o bolsonarismo, já que boa parte desses partidos disputará eleições em aliança com ele.
Há de se perguntar qual é o sentido de dividir o poder com a direita se, em troca, o que Lula recebe é apenas apoio em votações em pautas alinhadas aos interesses da… direita. Está claro que algo precisa mudar na articulação política do governo. Lula sabe disso e pretende montar uma nova estratégia da articulação política.
A fraqueza do governo no Congresso é um problema que, no limite, pode resultar em impeachment de Lula.
Por enquanto não há sinalização do que mudará exatamente, mas o presidente passará a se reunir semanalmente com o líder do governo na Câmara, o líder do Senado e o líder do governo no Congresso, além do ministro da Secretaria de Relações Institucionais.
Antes, Lula tratava da articulação política em reuniões semanais apenas com o ministro Alexandre Padilha, que é um desafeto de Arthur Lira e cujo trabalho tem sido criticado tanto por parlamentares da base do governo quanto da oposição.
É simbólico que, na votação que manteve o veto de Bolsonaro contra a criminalização das fake news, os bolsonaristas tenham comemorado a vitória acachapante (317 votos a 139) gritando “Lula ladrão, seu lugar é na prisão”.
A fraqueza do governo no Congresso é um problema que, no limite, pode resultar em impeachment de Lula.
Por mais que essa hoje seja uma possibilidade remota, já que a configuração do poder está amplamente favorável ao bloco majoritário formado por centrão e bolsonarismo, é uma carta que sempre estará sobre a mesa de um congresso lotado de golpistas.
Poder para isso eles têm. Mas, por enquanto, ainda é mais interessante manter o governo amarrado, fazê-lo sangrar até o fim do mandato e, assim, preparar o terreno para a eleição de um candidato como o bolsonarista Tarcísio, que agradaria a extrema direita, o centrão e contaria com o apoio de boa parte da imprensa corporativa.
Mas os ventos da política podem mudar e o ímpeto golpista do bolsonarismo estará sempre à espreita.
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