Como o Nubank abafou um escândalo envolvendo funcionário que criou fórum de ódio

A máquina da morte da extrema direita está literalmente botando fogo em nosso país, enquanto muitos fingem que não.

Ela tem trilhões de reais para gastar em propaganda, e a grande mídia está muito feliz em aceitá-los.

Mas no Intercept praticamente cada centavo vem de você, nosso leitor. E, em 2025, precisamos nos unir e lutar mais do que nunca.

Podemos contar com você para atingir nossa meta de arrecadação de fim do ano? O futuro depende de nós.

QUERO APOIAR

A máquina da morte da extrema direita está literalmente botando fogo em nosso país, enquanto muitos fingem que não.

Ela tem trilhões de reais para gastar em propaganda, e a grande mídia está muito feliz em aceitá-los.

Mas no Intercept praticamente cada centavo vem de você, nosso leitor. E, em 2025, precisamos nos unir e lutar mais do que nunca.

Podemos contar com você para atingir nossa meta de arrecadação de fim do ano? O futuro depende de nós.

QUERO APOIAR

Como o Nubank abafou um escândalo envolvendo funcionário que criou fórum de ódio

Atual diretor da Brasil Paralelo e criador do 55Chan trabalhava para o banco quando foi exposto – mas o caso foi abafado por dois anos.

Como o Nubank abafou um escândalo envolvendo funcionário que criou fórum de ódio

Em maio de 2016, um alarme soou na equipe de relações públicas do Nubank, que na época já tinha um milhão de clientes e era tido como o banco digital mais promissor do Brasil. Konrad Scorciapino, um dos engenheiros de software mais destacados da empresa e responsável pelo aplicativo da fintech, havia sido exposto por uma publicação xenofóbica que havia feito nas redes sociais. Apesar da gravidade das acusações, o Nubank atuou para acobertar o caso e o manteve no cargo por quase dois anos.

Atualmente diretor de tecnologia da produtora de extrema direita Brasil Paralelo, Konrad é apontado como um dos fundadores do 55Chan, um fórum conhecido por disseminar crimes de ódio, pornografia infantil e antissemitismo, conforme revelou reportagem da Agência Pública

Agora, documentos inéditos obtidos pelo Intercept Brasil mostram que, ao ser informado sobre as atividades de seu funcionário, o Nubank não apenas decidiu mantê-lo em seus quadros como também agiu intensamente para abafar a situação. 

Você possui 1 artigo para ler sem se cadastrar

Na ocasião, em 2016, Scorciapino havia sido convidado para palestrar em um evento da Associação Python Brasil, a APyB. 

Representando o Nubank, onde era engenheiro sênior de software, ele iria lecionar sobre uma linguagem de programação na qual era especialista. No entanto, membros da APyB denunciaram suas interações com publicações xenofóbicas.

A indignação foi causada por um tweet de Scorciapino: “A Dinamarca tem um problema de estupro. O problema do estupro é causado por diversidade. #DiversidadeÉEstupro”, dizia a legenda, em inglês, acompanhada por um gráfico que mostrava as nacionalidades de imigrantes acusados de estupro no país europeu.

Diante da repercussão no Twitter e Facebook, a APyB inicialmente afirmou apenas estar acompanhando as discussões. Posteriormente, anunciou a exclusão de Konrad do rol de palestrantes em um comunicado público. A associação disse que, antes de tomar essa decisão, dialogou com todas as partes envolvidas e  teve “uma extensa conversa” com o próprio Scorciapino e seu empregador, sem mencionar o nome do Nubank. 

Na nota, a APyB também criticou a exposição do caso pelos seus seguidores, pedindo desculpas publicamente ao engenheiro e à empresa por “toda esta confusão”.

A nota não era simpática ao Nubank à toa. O time de relações públicas do banco digital foi acionado para gerir a crise, e não só entrou em contato com os diretores da APyB, como revisou o comunicado sobre a  exclusão de Scorciapino do evento.

Em um documento compartilhado, utilizando o e-mail corporativo, um funcionário do Nubank editou diretamente o texto. Incluiu, por exemplo, a informação de que o convite para a palestra teria sido feito a Scorciapino, e não ao banco.

Depois que o comunicado foi ao ar, o Nubank optou por manter Konrad Scorciapino no cargo por quase dois anos, até março de 2018. Durante esse período, ele continuou a desempenhar suas funções, que incluíam programação, engenharia de dados e desenvolvimento de modelos de machine learning em tempo real.

LEIA TAMBÉM:

A informação de que Scorciapino era o criador do 55Chan era facilmente encontrada na internet desde 2010. Uma publicação do site Internet para Leigos, mantido por um usuário anônimo, afirmava que Konrad era o fundador do fórum. No Twitter, posts de 2010 já associavam o nome completo de Konrad a links de “chans”. Esses fatos, porém, passaram à margem do compliance do banco.

O Intercept entrou em contato com a assessoria de imprensa do Nubank por e-mail e telefone para questionar se, além da publicação que gerou a exclusão de Konrad do evento da Python Brasil, o banco digital conhecia as atividades dele no 55Chan. 

Inicialmente, o setor de relações públicas do banco digital concordou em responder às perguntas feitas pela reportagem. Mas, por duas vezes seguidas, o Nubank não enviou o comunicado dentro do prazo combinado. O espaço segue aberto para manifestações.

‘Imagina se o Nubank descobre que tem supremacista branco e escravagista no quadro de funcionários?’

Prints de conversas no 55chan, de maio de 2016, revelam a admiração dos usuários e o papel de liderança de Konrad, conhecido no fórum como “K”, mesmo depois de sua saída, que aconteceu por volta de 2010, segundo a reportagem da Pública.

O episódio envolvendo Scorciapino no evento da Python Brasil despertou uma série de discussões. À época, ele já não era mais o responsável pelo fórum, que ganhou notoriedade por abrigar conteúdo extremamente violento e ilegal. Mesmo assim, ainda era reconhecido como líder pela maior parte dos usuários. 

O debate sobre o caso começa com um membro dizendo: “K como keynote speaker de conferência. É pescaria?”. Em seguida, começam a surgir comentários em defesa de Scorciapino. 

“Não desrespeite o Santo K”, disse um usuário. “Mas o que tem a ver o trabalho bem feito do cara com suas posições ideológicas? Vai toma no cu esse politicamente correto do caralho. Ainda bem que moro no interior e não tem esses autistas e retardados em minha cidade”.

Os comentários em defesa de Scorciapino indicam a sua liderança do 55Chan. “Estão planejando tirar o Excelentíssimo K por conta de um tweet! Um SFW foi abrir o bico aí tá fornicando tudo. Nós devemos nos manter calado diante de tamanha ofensa ao seu legado??”, questionou um dos participantes.

‘Melhor não fazer nada. Se fizermos é capaz de aí a merda finalmente atingir o ventilador.’

A informação de que Scorciapino arcava com os custos financeiros do 55Chan também aparece em uma das mensagens: “Seria tão bonitinho intervir em favor do K. Nos cansamos de zoar ele, os amigos dele, a esposa dele e até os pais dele enquanto ele pagava as contas do servidor, agora retribuímos o favor enquanto continuamos tirando sarro por aqui”.

Até que, diante da revolta dos membros do 55Chan com a exposição de Scorciapino, começaram as ameaças de “raid”, termo usado para definir um ataque em massa. “Bora reunir os anões para ir ao Python Brasil fazer raid e perguntar coisas constrangedoras?”, perguntou um deles. “Essa é uma boa ideia”, diz uma das respostas.

Em outra resposta, que refuta a possibilidade de um ataque ao evento da Python Brasil, um usuário diz que Scorciapino é um supremacista branco e escravagista e menciona o Nubank: “Melhor não fazer nada. Se fizermos é capaz de ai a merda finalmente atingir o ventilador e algo de verdade acontecer com o K (imagine a NuBank descobrir tem supremacista branco e escravagista no quadro funcionário deles.)”.

Uma das mensagens se refere a supostas postagens feitas por Konrad com apologia à Ku Klux Klan. “O K é muito Kbaço mesmo. O cara vai me postar negócio de KKK no páçaro?”, diz o texto. “Páçaro” é o termo usado pelos membros para se referir ao Twitter (hoje, chamado de X).

Quando saiu a confirmação de que K não palestraria mais na Python Brasil, os usuários do 55Chan reagiram: “Porra, tiraram o Santo K da keynote. Que merda”, disse um deles. “As comunidades de Python, Ruby e afins estão simplesmente lotadas de viados, depósitos e grifinoristas [expressões pejorativas, homofóbicas e misóginas]. Você não vê ninguém dando piti desse jeito na comp.lang.c ou outra comunidade de linguagem mais antiga”, escreveu outro.

No fim, o fórum definiu que não atacaria os integrantes da APyB que denunciaram Scorciapino. “Se fizermos algo vai ser muito pior, pois aí vão ligá-lo ao chan e dizer que foi ele que incitou a raid por vingança. Aí sim ele seria demitido e a carreira dele iria pro brejo. O melhor que fazemos para ajudar o k é não fazer nada. Só torcer para ele não ser burro assim de novo”, resumiu um membro.

Um outro seguidor lamenta: “Ele não precisa ser burro de novo. Essa singela postagem vai persegui-lo pelo resto da vida”.

JÁ ESTÁ ACONTECENDO

Quando o assunto é a ascensão da extrema direita no Brasil, muitos acham que essa é uma preocupação só para anos eleitorais. Mas o projeto de poder bolsonarista nunca dorme.

A grande mídia, o agro, as forças armadas, as megaigrejas e as big techs bilionárias ganharam força nas eleições municipais — e têm uma vantagem enorme para 2026.

Não podemos ficar alheios enquanto somos arrastados para o retrocesso, afogados em fumaça tóxica e privados de direitos básicos. Já passou da hora de agir. Juntos.

A meta ousada do Intercept para 2025 é nada menos que derrotar o golpe em andamento antes que ele conclua sua missão. Para isso, precisamos arrecadar R$ 500 mil até a véspera do Ano Novo.

Você está pronto para combater a máquina bilionária da extrema direita ao nosso lado? Faça uma doação hoje mesmo.

Apoie o Intercept Hoje

Inscreva-se na newsletter para continuar lendo. É grátis!

Este não é um acesso pago e a adesão é gratuita

Já se inscreveu? Confirme seu endereço de e-mail para continuar lendo

Você possui 1 artigo para ler sem se cadastrar