“O seu apoio à Brasil Paralelo pode impedir o aborto e salvar vidas”. Essa é uma das frases dos mais de 5 mil anúncios feitos pela produtora de extrema direita sobre o tema nas redes sociais desde agosto de 2020.
Um levantamento do Intercept Brasil com base nos dados da Biblioteca de Anúncios da Meta indica que a Brasil Paralelo tem investido significativamente em campanhas antiaborto nas redes sociais nos últimos anos.
Os dados revelam que, desde agosto de 2020, a empresa desembolsou no mínimo R$ 560,6 mil em mais de 5 mil anúncios mencionando a palavra aborto nas redes sociais.
Como alguns desses anúncios seguem ativos e a Meta fornece apenas uma faixa de valores, o gasto real pode ser ainda maior. Se somados os valores máximos de cada anúncio, divulgados pela própria big tech, esse valor pode chegar a R$ 1,131 milhão.
O ano de 2023 marcou o pico de investimento da produtora no tema, com um gasto total de R$ 389.100 em campanhas antiaborto, sendo que somente em outubro de 2023 foram gastos mais de R$ 200 mil.
Na época, o tema estava quente: no mês anterior, em 22 de setembro, a ex-ministra Rosa Weber havia pautado o tema no STF. Votou pela descriminalização do aborto nas primeiras 12 semanas de gestação.
Os anúncios mais caros sobre o tema feitos pela produtora custaram R$ 10 mil cada, valor que foi gasto pelo menos seis vezes, todos eles no segundo semestre de 2023. Cinco dos anúncios com maior valor foram direcionados a pessoas com mais de 55 anos.
As propagandas antiaborto da produtora apresentam estratégias complexas de segmentação de público e de narrativas. A maioria dos anúncios utiliza linguagem emocional e imagens impactantes para engajar o público.
Frases como “Ficar em silêncio não é uma opção” são recorrentes, apontando que, apesar de se posicionar como uma produtora de conteúdo, a intenção do grupo é mobilizar e engajar os espectadores em torno da causa.
Narrativa da Brasil Paralelo sobre aborto é a mesma do PL do Estupro
A linha abordada na máquina de propaganda da Brasil Paralelo alimentou muitas das teorias que circularam em apoio ao Projeto de Lei do Estupro, o PL 1904/24, que pretende equiparar o aborto após a 22ª semana de gestação ao homícídio.
Nesta semana, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, do PP, anunciou a criação de uma comissão para debater a proposta. Segundo ele, o grupo contará com representantes de todos os partidos e o debate será retomado no segundo semestre, após o recesso parlamentar.
A proposta de lei tem sido alvo de intensas críticas, tanto pelo seu conteúdo quanto pelo processo de tramitação. O projeto não só equipara o aborto ao homicídio, mas também impõe uma pena maior à mulher que realiza o procedimento em comparação à do estuprador. As críticas culminaram em manifestações de coletivos feministas nas principais cidades do Brasil, protestando contra o projeto que representa um retrocesso significativo na legislação sobre o aborto legal.
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Lira, em resposta às críticas, assegurou que o texto a ser aprovado na Câmara não trará retrocessos ou danos aos direitos das mulheres. “Quero reafirmar que nada nesse projeto retroagirá nos direitos já garantidos e nada irá avançar para trazer qualquer dano às mulheres”, afirmou.
Neste mês, a Brasil Paralelo defendeu abertamente o PL 1904/24. Nas redes sociais, a produtora fez posts afirmando que “a vida começa na concepção”, e diz que uma “campanha de desinformação” visa deturpar o projeto que “salva vidas”. Não foram veiculados anúncios específicos sobre o projeto – por enquanto. A máquina segue rodando.
Brasil Paralelo pagou R$ 25 milhões em quatro anos ao Facebook e Instagram
Os gastos da Brasil Paralelo não se restringem apenas a anúncios sobre aborto. Desde 4 de agosto de 2020 até 16 de junho de 2024, o valor total gasto em anúncios na plataforma da Meta chega a R$24.745.039.
Em seus termos de uso, a Meta diz que proíbe anúncios com desinformação, conteúdo chocante, sensacionalista, e situações de crise, temas sociais ou políticos controversos. Os anúncios de aborto da Brasil Paralelo praticamente gabaritam as restrições, mas a Meta parece não se importar muito com isso.
Os anúncios abrangem uma variedade de temas, refletindo a agenda ultraconservadora da produtora. Vários deles também se referem a temas ligados às questões de gênero, como homofobia, transfobia e violência doméstica.
A produtora tem em seu catálogo um documentário que traz a versão do agressor da ativista Maria da Penha – que dá nome à principal lei brasileira criada para coibir atos de violência doméstica. O documentário foi apontado como a causa de uma série de ataques e ameaças contra Penha, que precisou ser incluída no Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos do governo do Ceará, no início de junho.
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