Pesquisas divulgadas nesta semana indicam a consolidação da candidatura de Pablo Marçal, do PRTB, para as eleições municipais em São Paulo. Com o apoio de Jair Bolsonaro, ele entrou na disputa, e em pouco tempo já está na terceira colocação, ultrapassando Tábata Amaral.
O prefeito Ricardo Nunes, que também conta com o apoio de Bolsonaro, ainda está em segundo lugar com 11 pontos percentuais à frente de Marçal, mas tem muitos motivos para se preocupar.
Bolsonaro colocou mais um cavalo seu na corrida e está apostando nos dois. Ricardo Nunes ainda é o preferido, já que está com a máquina do município na mão, construiu um bom arco de alianças que lhe garantem bastante tempo de TV e, segundo as pesquisas, tem potencial para vencer Boulos no segundo turno.
Mas, diferente de Marçal, o atual prefeito não é um bolsonarista raiz, mas um bolsonarista de ocasião, que sabe que uma candidatura de direita sem o apoio do ex-presidente está fadada ao fracasso.
Nunes tem titubeado em nomear o vice imposto por Bolsonaro, o extremista de direita coronel Mello Araújo. A avaliação é de que o coronel é um nome desconhecido, sem apelo eleitoral, que não agregaria nada à candidatura.
Em 2010, Marçal foi condenado por integrar uma quadrilha que desviava dinheiro de instituições financeiras.
A consolidação de Marçal na disputa é um recado claro de Bolsonaro para Nunes: “aceite todas as minhas condições ou vou apostar todas as minhas fichas no outro cavalo”. Este é o cenário que está desenhado e não há dúvidas de que Nunes aceitará o coronel do capitão na sua chapa.
Marçal, essa figura exótica, é mais um outsider bolsonarista que ganhou fama nas redes sociais com frases motivacionais, dicas vazias sobre empreendedorismo, senso comum reacionário e mentiras — muitas mentiras. Apesar do seu vasto currículo no ramo da picaretagem e das fake news, Marçal não gosta de ser chamado de coach, nem de picareta, nem de mentiroso.
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Mas alguns episódios da sua vida insistem em contrariar esse desejo. Em 2010, por exemplo, Marçal foi condenado por integrar uma quadrilha que desviava dinheiro de instituições financeiras.
Segundo a Operação Pegasus, deflagrada pela Polícia Federal em 2005, a quadrilha criava sites falsos de bancos, depois disparava e-mails ameaçadores acusando as vítimas de inadimplência e roubava informações delas através da instalação de vírus — os chamados “Cavalos de Troia”.
À época, a Folha descreveu a gangue como “a maior quadrilha de piratas da internet brasileira”. Marçal, que era um garoto de 18 anos, confessou que atuava com o grupo, mas alegou não tinha conhecimento dos crimes praticados. Ele só não foi para a cadeia porque o crime prescreveu e sua pena foi extinta.
É bastante simbólico que aquele jovem que instalava vírus nos computadores das vítimas da sua quadrilha acabaria se tornando um Cavalo de Troia de Bolsonaro na corrida municipal do maior colégio eleitoral do país. Mas este episódio é só um grão de areia na vida de Marçal.
Esqueleto no armário
O que não falta é esqueleto no armário do coach. Nas eleições de 2022, ele chegou a ser candidato a presidente, mas saiu da disputa para apoiar Bolsonaro e se elegeu como deputado federal. Mas não pôde assumir o cargo porque a candidatura foi indeferida pelo TSE por problemas na prestação de contas.
Marçal se tornou alvo de busca e apreensão uma operação da Polícia Federal contra crimes de falsidade ideológica eleitoral, apropriação indébita eleitoral e lavagem de dinheiro.
Segundo a polícia, Marçal e seu sócio realizaram doações milionárias para a campanha, sendo que boa parte dos valores foi enviada posteriormente para as empresas das quais são sócios. Foi assim que o coach bolsonarista estreou na vida política.
Relatos de testemunhas confirmam uma rotina de trabalho assustadora, com o coach cometendo assédio moral sobre os funcionários.
Há uma série de outras investigações policiais da qual Marçal é alvo. Em seus eventos motivacionais, o coach é conhecido por submeter os participantes a desafios humilhantes e perigosos.
Ficou conhecido o caso em que ele levou um grupo de 32 pessoas para uma expedição no Pico dos Marins em São Paulo. Mesmo debaixo de condições climáticas extremas, com rajadas de vento de mais de 100 km/h, o coach decidiu que o grupo continuaria.
Em nome do papinho furado de coach que prega a “superação de limites”, Marçal levou essas pessoas a arriscarem suas vidas. O pior não aconteceu graças ao resgate do Corpo de Bombeiros.
Mas o pior aconteceu para alguns funcionários de Marçal. Bruno da Silva Teixeira, de 26 anos, morreu de infarto após participar de uma “maratona surpresa” de 42 km, organizada pelo empresário. Mesmo sem terem nenhum preparo para uma maratona, funcionários foram incentivados a testar seus limites.
Marçal chegou ao cúmulo da insensibilidade ao abrir uma live para fazer marketing em cima da tragédia alheia: anunciou que batizaria o seu melhor tênis com o nome do empregado falecido.
Outros 2 funcionários também morreram enquanto trabalhavam para Marçal. Relatos de testemunhas confirmam uma rotina de trabalho assustadora, com o coach cometendo assédio moral e exercendo domínio excessivo sobre a vida dos funcionários.
Durante a pandemia, as empresas de Marçal funcionaram normalmente, desrespeitando normas sanitárias. Durante a tragédia das enchentes no Rio Grande do Sul, o coach espalhou uma série de mentiras sobre o trabalho dos governos e do Exército.
Marçal soube como ninguém capturar o espírito do tempo que criou o bolsonarismo.
Em uma delas ele inventou que a Secretaria da Fazenda gaúcha estava barrando doações que não tinham nota fiscal. Em outra, emulou o neopentecostalismo mais fuleiro ao afirmar categoricamente que o show da Madonna em Copacabana foi um ritual satânico e os mortos pelas enchentes eram oferendas que as autoridades fizeram para o demônio.
A força de Marçal nas redes sociais é o seu maior atrativo eleitoral. Com 11 milhões de seguidores no Instagram e uma ativa comunidade de seguidores, o bolsonarista é um fenômeno de popularidade digital.
A forma como ele tem turbinado sua audiência é, no mínimo, questionável. O pré-candidato tem prometido dar dinheiro aos apoiadores que criarem perfis para distribuir cortes de seus vídeos.
O jornal O Globo mapeou 50 contas ligadas a ele que conseguem milhões de visualizações com conteúdos de ataques a adversários políticos e fake news de todos os tipos. Assim, Marçal criou um exército de contas anônimas que impulsionam sua imagem nas vésperas do início da campanha eleitoral.
Não é à toa que Marçal é idealizado por muitos bolsonaristas como um candidato melhor que Ricardo Nunes. Ele completa com muita facilidade a cartela do bingo bolsonarista.
O coach se inspira nos discursos de pastores neopentecostais, adota um tom messiânico, trata o empreendedorismo como único meio de vencer na vida, aplica a linguagem coach à política, se vende como antissistema e venera Jair Bolsonaro. Marçal soube como ninguém capturar o espírito do tempo que criou o bolsonarismo e desfila com desenvoltura dentro deste mundo particular.
Há grandes chances da sua candidatura ser retirada após cumprir a função de fazer Nunes comer ainda mais na mão de Bolsonaro, mas é inegável que ele está ganhando força eleitoral para o futuro. Se não for preso antes, Marçal pode ser o próximo grande nome da extrema direita em nível nacional.
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