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Eleições nos EUA: O que explica Donald Trump não subir nas pesquisas após o atentado?

Tiroteios em escolas são um problema para os republicanos. E é muito difícil se fazer de vítima por algo associado ao seu próprio campo político.


No sábado dia 13 de Julho, o mundo ficou em choque ao receber a notícia de que o ex-presidente dos EUA, Donald Trump, foi alvo de um atentado. Foi um dia com os olhos colados nos celulares e televisores, entre notícias confusas e memes.

As imagens de Trump caindo entre seguranças do serviço secreto e posteriormente se levantando com a orelha ensanguentada circularam por todo o mundo, sendo uma das mais compartilhadas do ano.

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Naquelas 24 horas, o atentado parecia mudar toda a corrida presidencial dos EUA. 

Porém, por incrível que pareça, o atentado pode se somar a uma longa lista de dias que ficamos grudados em telas acompanhando notícias, mas que logo se apagaram da memória.

Uma disputa complicada para Biden

Trump, do partido repubicano, lidera as pesquisas eleitorais, na disputa contra o atual presidente democrata Joe Biden. E, no complicado sistema eleitoral dos EUA, nos estados mais relevantes, chamados de “battlegrounds” ou “campos de batalha”, o ex-presidente tem vantagem superior a 4,2% frente ao atual.

Para piorar, a campanha para a reeleição de Biden está em crise. O presidente teve uma performance desastrosa no debate do dia 27 de junho, quando pareceu confuso, lento e enrolado na maioria das respostas.

O diagnóstico de que o presidente está velho demais para exercer bem suas funções é compartilhado pela maioria dos eleitores. Pesquisa do Washington Post aponta que 80% dos eleitores consideram a idade de Biden um empecilho para sua candidatura.

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Por isso, rumores de movimentações de bastidores para a substituição do presidente na cabeça da chapa democrata, possivelmente pela atual vice-presidente Kamala Harris, seguem intensos.

Nesse quadro, não foi surpreendente que o atentado a Trump causasse uma reação imediata de jornalistas e políticos: as eleições acabaram, Trump venceu. Uma alta por simpatia à vítima de um atentado era esperada e Biden não podia perder mais nenhum ponto percentual se quisesse ser eleito em 5 de novembro deste ano.

Comparações com a alta que Jair Bolsonaro teve nas pesquisas após ser vítima de uma facada foram comuns, inclusive na imprensa internacional.

Campanha de Trump teria enviado propaganda política em defesa da venda irrestrita de armas para Crooks.

Passados seis dias do atentado, contudo, a tal alta simplesmente não ocorreu. A maioria das pesquisas mostra estabilidade no cenário eleitoral. Uma pesquisa inclusive aponta alta de Biden após o ataque.

Trump começou a ter resultados melhores em pesquisas após a escolha do vice JD Vance, quando o noticiário político deixou o atentado para trás.

Uma história com cheiro de repetição

O que explica um ex-presidente receber um tiro e não conquistar nenhum voto a mais?

Em casos históricos, como o atentado a Ronald Reagan em março de 1981, o atentado contra Teddy Roosevelt em 1912 ou a facada em Jair Bolsonaro em setembro de 2018, as pesquisas imediatamente indicaram alta da popularidade da vítima.

A explicação pode estar no próprio atentado. Após a imagem inicial de perseguição política, outro cenário foi se desenhando. O autor do atentado, Thomas Matthew Crooks, parece ser um personagem conhecido do noticiário estadunidense: o atirador de escolas.

Os EUA enfrentam um número atordoante de tragédias desse tipo. No ano passado, 82 casos assim ocorreram, um a cada cinco dias, com um total de 45 vítimas fatais e 110 feridos.

Em sua maioria, esse tipo de crime é praticado por jovens solitários que se radicalizam em fóruns na internet e compram armas potentes. Quase todos são de extrema direita. E também é a direita que defende o direito irrestrito de comprar armas, mesmo após tais atentados.

Esse é o perfil de Thomas Crooks. Relatos de colegas de escola disseram que o homem de 20 anos era isolado e solitário. Ele tentou participar do clube de tiro da escola, mas foi proibido por ter atitudes consideradas suspeitas.

Uma colega chegou a dizer que todos na escola comentavam: “esse é o mais provável de cometer um atentado em escolas”. Crooks também se filiou ao Partido Republicano assim que completou 18 anos e cometeu o atentado usando a camisa de um canal de YouTube de divulgação da cultura de armas.

Como se não bastasse, um vazamento de dados revelou que, em 2016, a campanha de Trump teria enviado propaganda política em defesa da venda irrestrita de armas para Crooks. Na época, ele tinha apenas 12 anos.

Sim, a campanha política de Trump pode ter participado da radicalização do rapaz que viria a atirar contra ele. De acordo com o FBI, Thomas Crooks pesquisou por Joe Biden e a Convenção Eleitoral Democrata. Segundo o FBI, o presidente e políticos relevantes do partido democrata, como o procurador-geral Merrick Garland, também eram potenciais alvos. A escolha de Trump pode ter ocorrido mais por conveniência e proximidade da casa de Crooks do que por razões políticas.

Anestesia perante a tragédia, mas nem tanto

É comum dizer que os EUA estão anestesiados quanto ao problema dos tiroteios em escolas. Mas anestesia não significa cegueira. É um sinal de cansaço e uma sensação de impotência perante um problema que, sim, muitos consideram seríssimo.

E aqui está a provável razão de Trump não ter ganho os tais votos por simpatia: é muito difícil se fazer de vítima por um problema que o grosso da população associa ao seu próprio campo político.

Se Trump ganhou algum voto pela posição de vítima, a chapa republicana perdeu votos entre independentes.

Uma pesquisa do instituto Morning Consult conclui que 38% dos eleitores responsabilizam o próprio Trump e sua retórica pelo atentado.

Um estudo publicado pela editora de Cambridge aponta que republicanos são vistos como a causa dos tiroteios em escolas por boa parte dos independentes. Mesmo que o direito a ter armas continue relativamente popular, a própria menção ao tema dos tiroteios em escolas costuma ser prejudicial às suas campanhas.

Os casos de tiroteios em escolas acabam por seguir um roteiro já conhecido, afinal, ocorrem dezenas de vezes por ano. Imediatamente após ocorrerem, há um salto no entusiasmo dos eleitores republicanos.

De acordo com um estudo acadêmico, logo após um atentado, republicanos agem ativamente para evitar leis mais duras sobre posse e compra de armas e afirmam que irão comparecer às urnas em maior número por medo que a comoção cause restrição na compra de armas. Muitos aproveitam a situação para doar dinheiro para campanhas republicanas também.

Por outro lado, o mesmo estudo aponta como há uma perda de votos entre independentes. A mera lembrança de que esse problema existe torna independentes mais avessos ao partido de Trump. E, inacreditavelmente, as tragédias se sucedem com pouco impacto político.

Se Trump ganhou algum voto pela posição de vítima, a chapa republicana perdeu votos entre independentes.

Por essa razão, os diagnósticos de que Trump venceu as eleições quando aquele tiro errou, ou quando aquela foto foi tirada, foram precipitados.

Ficaram, contudo, dois mortos: o próprio Thomas Crooks e um apoiador de Trump que foi acertado por engano no dia. Corey Comperatore era um ex-chefe dos bombeiros e pai de duas meninas.

Possivelmente, as palavras de sua viúva sejam o melhor resumo dos sentimentos dos EUA a respeito dos tiroteios:

“Não tenho nenhuma má vontade em relação a Joe Biden. Não sou daquelas pessoas que se envolve em política. Apoio Trump, é nele que voto, mas não tenho má vontade em relação a Biden. Ele não fez nada com meu marido. Um garoto desprezível de 20 anos fez isso”.

JÁ ESTÁ ACONTECENDO

Quando o assunto é a ascensão da extrema direita no Brasil, muitos acham que essa é uma preocupação só para anos eleitorais. Mas o projeto de poder bolsonarista nunca dorme.

A grande mídia, o agro, as forças armadas, as megaigrejas e as big techs bilionárias ganharam força nas eleições municipais — e têm uma vantagem enorme para 2026.

Não podemos ficar alheios enquanto somos arrastados para o retrocesso, afogados em fumaça tóxica e privados de direitos básicos. Já passou da hora de agir. Juntos.

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