Juliane Furno

Juliane Furno

Afinal, o que aconteceu com as bolsas de valores na segunda-feira?

Bolsas despencam 10% na segunda-feira, mas se recuperam no dia seguinte. Preocupação com geração de empregos nos EUA foi a causa imediata, porém caso expõe absurdo do sistema financeiro.


Nesta  segunda-feira,  5 de agosto, as bolsas de valores no mundo tiveram um dia de susto. Apesar das perdas terem sido recuperadas no dia seguinte, vale pensar sobre o porquê de dados da economia dos EUA terem causado um susto tão grande nas bolsas.

Por conta de uma economia altamente globalizada, especialmente no campo das finanças, seus impactos são imediatos, embora sejam distintos nas economias centrais e nas periféricas.

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Os principais analistas econômicos passaram rapidamente de uma preocupação com relação às expectativas de quando e quanto seriam os cortes nas taxas de juros norte-americanas, para o temor de uma recessão.

Para vocês entenderem melhor: a economia norte-americana estava em franca expansão, marcada por crescimentos trimestrais superiores ao esperado pelo mercado; por um mercado de trabalho caracterizado pelo pleno emprego; e por uma inflação em queda, com expectativas de alcançar a meta inflacionária definida pela autoridade monetária de 2% ao ano.

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Frente a esse cenário, o Banco Central norte-americano, o FED, poderia iniciar um movimento cauteloso de cortes sistemáticos na taxa de juros, elevadas desde a pandemia de Covid-19.

Rapidamente a situação transitou de um otimismo com relação à trajetória de recuperação e estabilização macroeconômica, para o temor de uma recessão, que é caracterizada pela existência de trimestres consecutivos de crescimento negativo.

Foi a menor geração de postos de trabalho desde dezembro de 2020, ainda no primeiro ano da pandemia.

Não é possível teorizar aqui sobre as perspectivas de futuro, já que estamos falando de mercados muito voláteis e de eventos que estão se processando no calor do momento.

Tampouco é possível cravar uma explicação certeira sobre o que motivou o derretimento das bolsas de valores. No entanto, com base no que temos até agora, são possíveis algumas especulações e algumas hipóteses principais.

Trajetória invertida

Diferentemente de outras crises que atingiram bolsas de valores, em especial a Crise de 1929, os eventos dessa semana parecem configurar uma trajetória invertida: não foi uma crise nos mercados financeiros, notadamente pela existência de bolhas de ativos, que precipitou uma crise na economia.

Parece ser o contrário. Foram os sinais na economia real — aquela que lida com a criação de valor e impacta diretamente na circulação de riqueza, produtos e no dia a dia das pessoas que acenderam um alerta no movimento de compra e venda de ações nos mercados financeiros.

Isso pode ser explicado pela concomitância com que se verificou a queda nas principais bolsas e a publicação dos dados da pesquisa de emprego nos EUA.

Os dados do Payroll apontaram a criação de apenas 114 mil vagas de emprego no mês de julho. O setor privado foi responsável por gerar apenas 97 mil postos de trabalho. A título de comparação, essa foi a menor geração de postos de trabalho desde dezembro de 2020, ainda no primeiro ano da pandemia. 

Pode-se admitir, dessa forma, que a persistência de uma taxa básica de juros elevada para os padrões estadunidenses, fixada no intervalo de 5,25% a 5,5% ao ano, pode ter sido um “remédio” aplicado por tempo demais, prejudicando o enfermo ao invés de mantê-lo saudável.

Dessa forma, a insistência em frear as pressões no mercado de trabalho e atingir a meta inflacionária de 2% ao ano, com uma política monetária contracionista, pode ter precipitado um cenário de recessão.

É por esses mecanismos que podem ser compreendidas as quedas nas bolsas de valores que, embora reféns também de mecanismos especulativos, estão ancoradas em elementos reais, notadamente a taxa de lucro do setor empresarial.

Assim, as expectativas de desaceleração ou mesmo de recessão econômica nos EUA impactam a atividade produtiva e, consequentemente, a projeção sobre o lucro no setor real, o que desvaloriza as ações das principais empresas.

Esse movimento, agora partindo dos mercados financeiros, também retroalimenta as perspectivas de crises no setor real, ou seja, de redução de produção, consumo, aumento de demissões e falências, uma vez que a expectativa de faturamento menor e a desvalorização dos preços das ações, normalmente, impactam nas decisões de investimentos de agentes.

Pelo susto nesta semana, passamos. Mas esse sistema continuará priorizando os investidores.

Dessa forma, o investimento se retrai, seja em função da já elevada taxa básica de juros, seja pela expectativa de lucro futuro. Assim, caso esse susto se repita e se confirme, a profecia pode se autorrealizar, já que a consequência de queda no investimento ou retração da atividade leva a menores contratações e até mesmo a falência e a demissão.

A prioridade são os investidores

O caminho pelo qual percorrem os detentores da riqueza financeira, nesses tempos de instabilidade, se traduz em saídas das bolsas de valores e contração dos investimentos diretos.

Os investimentos correm para ativos mais “seguros”, principalmente em títulos de dívida pública americana. Além de serem os mais estáveis do mundo, esses títulos estão muito mais rentáveis dada a sinalização do FED de que não haverá cortes nas taxas de juros que remuneram os detentores desses títulos.

A questão se agrava e ganha contornos globais quando ampliamos esse movimento dos detentores de riqueza financeira para os demais países, que tendem a replicá-lo e a repercuti-lo em dimensões ainda maiores, levando a quedas mais acentuadas nas bolsas de valores dos demais países e na apreciação do dólar americano com relação às moedas nacionais.

Pelo susto nesta semana, passamos. Mas esse sistema continuará priorizando os investidores internacionais frente a estabilidade e geração de empregos para todos.

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