João Filho

Pablo Marçal e Elon Musk não estão acima da lei

A grande imprensa trata Pablo Marçal e Elon Musk como vítimas do judiciário e esquece que a função de um juiz é aplicar as leis a todos.


Dois episódios desta semana mostraram o tamanho do buraco em que parte significativa do jornalismo profissional se enfiou nos últimos anos. Os extremistas de direita Elon Musk e Pablo Marçal são tratados como atores respeitáveis da política nacional, e não como delinquentes empenhados em atacar a democracia.

Esses dois filhotes de Steve Bannon desafiam a legislação brasileira e fazem chacota das instituições democráticas de forma sistemática e acintosa. Mesmo assim, há muita gente na grande imprensa com o paninho na mão disposta a limpar a barra  deles. 

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Há um empenho em tornar esses perigosos picaretas em figuras bem vindas à vida política brasileira. Nesta semana, não faltou colunistão de prestígio para defender Musk e Marçal, ainda que de maneira indireta.

É uma defesa que vem travestida de defesa da liberdade de expressão — esse conceito que nestes nossos tempos foi transformado em escudo para práticas criminosas — e contra um suposto autoritarismo do ministro Alexandre de Moraes. 

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Na prática, trata-se de servir carniça fresca para a urubuzada da extrema direita que tem sido enquadrada pela justiça brasileira.

Pablo Marçal, o digníssimo golpista

Na última segunda-feira, Pablo Marçal disparou sua metralhadora de lixo em uma sabatina na Globo News. No dia seguinte, o jornal O Globo pediu a alguns dos principais colunistas da casa dessem notas para o desempenho do candidato. Marçal contou uma infinidade de mentiras, xingou o presidente da República e atacou uma das jornalistas presentes.

É com essa simpatia e normalidade que está sendo tratado um condenado por dar golpe digital bancário em aposentados.

Mas parece que a lábia do coach enfeitiçou os colunistas globais. Dos 6 consultados, 3 deram nota 3 para o desempenho de Marçal em uma escala de 1 a 5. Na média, o candidato ficou com nota 2,5.

Trata-se de uma insanidade. É difícil de acreditar que alguém tenha assistido àquele show de horrores e pensado “não é bom, mas também não é tão ruim”. Bernardo Mello Franco foi o único a dar 1, a única nota possível.

Mesmo diante das barbaridades proferidas por ele durante uma hora e meia, a maior parte dos jornalistas do grupo Globo achou por bem destacar as qualidades oratórias do candidato que vive rodeado com suspeitos de serem integrantes do PCC.

Pior que isso: houve quem exaltou o “tom ameno” que teria sido adotado por ele durante a sabatina. É difícil de acreditar que essa insanidade venha do jornalismo profissional. 

Um dos jornalistas afirmou que Marçal “falou num tom mais suave e não atacou ninguém”. Bom, eu gostaria de saber onde estava a suavidade de Marçal quando ele tratou a jornalista Natuza Nery como mentirosa.

Ou quando interrompeu de forma sistemática e grosseira os sabatinados. Ou quando chamou Lula de “chefe de facção criminosa” e inventou — sem ser contestado por ninguém — que ele desviou nada mais nada menos que R$1 trilhão. Haja moderação!

Para outro jornalista, Marçal é um “Doria goiano TikToker” que “promete revolucionar o estado com as virtudes do privado”. É com essa simpatia e normalidade que está sendo tratado um condenado por dar golpe digital bancário em aposentados e que agora tenta uma carreira política transgredindo a legislação eleitoral despudoradamente e com uma candidatura apinhada de criminosos.

Elon Musk odeia a democracia e não está acima da lei

Elon Musk é outro picareta que está sendo tratado com o máximo respeito pela imprensa brasileira. Já está comprovado que o bilionário é um gangster internacional que, alinhado à extrema direita no mundo inteiro, tem colocado o seu poder político e financeiro para desestabilizar democracias e promover golpes de estado. Não se trata de exagero, mas da constatação de um fato.

O banditismo de Musk foi naturalizado e colocado em pé de igualdade com ações legítimas do judiciário.

O dono do Twitter/X já assumiu suas intenções golpistas como todas as letras: “Vamos dar golpes em quem quisermos”. Mesmo com todas essas credenciais antidemocráticas, o empresário tem sido retratado por parte da imprensa brasileira como um guerreiro que luta pela liberdade de expressão em todo o mundo. 

Depois de descumprir repetidamente a legislação brasileira, ignorar decisões da justiça, não pagar multas e usar a rede social para afrontar ostensivamente o ministro Alexandre de Moraes, o STF publicou uma intimação no próprio Twitter/X marcando o empresário.

No texto da notificação, a justiça exige que a empresa apresente um representante legal no país, cumpra as ordens judiciais e pague as multas devidas. Caso isso não ocorra, o STF determina a imediata suspensão das atividades da rede social no país até que essas pendências sejam resolvidas. 

O tribunal quer simplesmente que se cumpra a legislação brasileira, nada além disso. Mas o grosso do noticiário tem tratado o caso como como um duelo entre um empresário bem sucedido que luta pela liberdade de expressão contra um juiz autoritário que quer censurá-lo porque tem intenções políticas.

Uma manchete do Metropóles rodou as redes sociais: “Nem Musk nem Alexandre de Moraes estão dispostos a ceder”. Percebam como o caso está sendo tratado como uma treta entre dois cabeças-duras e não um embate jurídico. É realmente impressionante o nível de descolamento de alguns jornalistas com a realidade dos fatos.

O banditismo de Musk foi naturalizado e colocado em pé de igualdade com ações legítimas do judiciário, que apenas está cobrando da empresa dele o mesmo que se cobra de todas as empresas que operam em território nacional. 

A notificação do STF foi feita publicamente no Twitter/X, algo inédito. Isso foi suficiente para se iniciar um grande debate sobre a validade dessa intimação “fora do rito”.

O Twitter/X desativou o seu escritório operacional no Brasil, uma clara manobra para dificultar o cumprimento de decisões judiciais. Muitos jornalistas deixaram de lado o mérito da questão e passaram a debater a forma.

O fato é que a intimação do STF, apesar de não usual, segue o diz nossa lei: mesmo que nula a princípio, uma intimação se torna plenamente válida no momento que o réu dá ciência inequívoca do recebimento da mesma. Ou seja, a partir do momento que Musk respondeu ao tweet, a intimação cumpriu sua finalidade de informar ao investigado sobre os atos do processo e é válida. Mas na imprensa o caso foi tratado como controverso, polêmico, com juristas sendo a favor e contra à forma da intimação.

Esqueceu-se o pano de fundo da questão, que é a afronta de Musk às leis brasileiras, e focou-se no procedimento pouco comum. O Estadão, por exemplo, deu voz apenas a juristas que consideram a notificação ilegal.

Entre eles destaca-se André Marsiglia, que recentemente virou xodó da extrema direita e participa de lives com Paulo Kogos e Adrilles

Há muitas vozes críticas a Marçal e Musk na imprensa também, sejamos justos. Mas há uma parte relevante dela, que trabalha em grandes empresas, que parece disposta a agradar a parte dos brasileiros que está embriagada pelo esgoto ideológico da extrema direita.

Mesmo que para isso seja necessário distorcer os fatos e espancar a lógica e o bom senso. Aí somos obrigados a assistir a certas bizarrices como: um candidato radical associado ao PCC sendo tratado como alguém moderado e um bilionário golpista como um guardião da liberdade de expressão internacional.

🚨 O QUE ENFRENTAMOS AGORA 🚨

O Intercept está vigiando manobras eleitorais inéditas da extrema direita brasileira. 

Os golpistas estão de cara nova, com seus ternos e sapatênis. Eles aprenderam estratégias sofisticadas de marketing digital para dominar a internet, que estão testando agora nas eleições municipais.

O objetivo final? Dominar bases de poder locais para tomar a presidência e o congresso em 2026. 

Não se deixe enganar: Bolsonaro era fichinha perto dos fascistas de sapatênis…

O Intercept não pode poupar esforços para investigar e expor os esquemas que colocam em risco nossos direitos e nossa democracia.

Já revelamos as mensagens secretas de Moro na Lava Jato. Mostramos como certas empresas e outros jornais obrigavam seus trabalhadores a apoiarem Bolsonaro. E expusemos como Pablo Marçal estava violando a lei eleitoral. 

Mas temos pouco tempo, e muito mais a revelar. Agora precisamos de recursos para colocar mais repórteres nas ruas. Para isso, precisamos de sua ajuda. Somos financiados por nossos leitores, não pelas empresas ricas que mandam em Brasília.

Faça parte do nosso time para causar o impacto eleitoral que você não verá em nenhum outro lugar! Faça uma doação de qualquer valor ao Intercept hoje mesmo! 

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