Rede de grupos e páginas bolsonaristas com 1,2 milhão de pessoas virou a casaca em apoio a Pablo Marçal 

Rede de grupos e páginas bolsonaristas com 1,2 milhão de pessoas virou a casaca em apoio a Pablo Marçal 

Encontramos oito grandes grupos, com indícios de articulação em rede, que migraram o apoio para o candidato pelo PRTB.

Rede de grupos e páginas bolsonaristas com 1,2 milhão de pessoas virou a casaca em apoio a Pablo Marçal 

Eleições 2024

Parte 7


Pelo menos 11 grupos e páginas de extrema direita, que atingem mais de 1,2 milhão de usuários ativos, migraram de seus antigos tópicos – que vão de Bolsonaro a Sergio Moro, passando por militares – e se converteram para um só tema, ou melhor, candidato: Pablo Marçal. 

Em um levantamento inédito, feito em conjunto pelo ICL Notícias, Aos Fatos e Intercept Brasil, foi possível verificar ao menos oito grupos (seis no Facebook, um no Telegram e um no WhatsApp) e três perfis no Instagram que foram modificados a partir de maio deste ano para o nome de Marçal. 

Desde então, passaram a distribuir mensagens de divulgação de seu nome ou candidatura, além de distribuir conteúdos com desinformação e ataques a adversários do candidato ou do ex-presidente Jair Bolsonaro. 

O maior dos grupos é o do Telegram, que conta agora com 117 mil membros e está sendo divulgado pela campanha de Marçal. Até a noite do dia 8 de agosto deste ano, data do primeiro debate entre os candidatos à prefeitura de São Paulo, ele tinha o nome de “InfluenciadoresProBolsonaro”. 

Criado em 10 de outubro de 2022, o grupo foi alterado para “Marçal por São Paulo” naquela ocasião e estava com 51.936 membros. Há alguns dias, Marçal passou a divulgar um link para que pessoas entrem no grupo e agora o número quase dobrou. A reportagem recebeu os prints que confirmam a mudança.

O grupo no Telegram havia sido criado no segundo turno da eleição presidencial de 2022, e foi utilizado para transmitir uma live  conjunta de  Jair Bolsonaro e Marçal a duas semanas do fim do pleito. Na ocasião, Marçal passava instruções a supostos 320 mil influenciadores para fazer campanha para Bolsonaro. 

Nesse grupo, foi distribuído um material chamado de “Faça o que precisa ser feito!” com “7 missões” para os “influenciadores”. O documento, revelado pelo site Poder 360, dava instruções para que os apoiadores criassem grupos no WhatsApp, utilizassem uma imagem da bandeira do Brasil em seus perfis de redes sociais, gravassem vídeos e ajudassem a difundir mensagens do grupo original.

Vira-casacas articulados em rede

Pelo menos três grupos no Facebook que passaram a apoiar Marçal nas últimas semanas contam com os mesmos administradores – perfis falsos com fotos de mulheres geradas por inteligência artificial.

É o caso do grupo “Juntos com Pablo Marçal – SP”, com 36,5 mil membros, que já andou em outras companhias. Criada em 21 de março de 2016, ainda no início do processo de impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff, a comunidade se chamava “Juntos com o juiz Sergio Moro” até 7 de agosto de 2024. Foi só então que passou a divulgar a candidatura do ex-coach.

Até se engajar na campanha de Marçal, o grupo estava parado havia pelo menos sete meses. Antes disso, tinha sido usado para convocar manifestações na Avenida Paulista ou pedir o impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, dentre outras bandeiras da extrema direita.

As últimas movimentações do grupo foram o compartilhamento de vídeos de políticos como o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, e o senador Eduardo Girão, ambos do Novo.

A estreia de Marçal na timeline ocorreu no dia 7 com duas publicações no espaço de 4 minutos: um retrato com o slogan “mude você que ele muda o Brasil” e uma foto no alto de um trio elétrico, fazendo arminha com a mão ao lado de Bolsonaro. “São Paulo não pode cair nas mãos da esquerda nem do PT!! Bora apoiar Pablo Marçal!! O Brasil precisa de São Paulo!!’, publicou a suposta administradora do grupo.

Um mesmo perfil falso, com foto de uma mulher gerada por IA,  é membro do “PABLO MARÇAL – PREFEITO DE SÃO PAULO 🇧🇷 ✨✨”, coletivo que teve um passado ainda mais volátil desde sua criação, em 23 de janeiro de 2021.

Com 55,6 mil participantes hoje, o grupo foi fundado com uma identificação genérica à direita conservadora. Em 2022, porém, atuou na campanha de Sergio Moro, do União, ao Senado. Um dia após o primeiro turno das eleições daquele ano, passou a se chamar “bolsonaristas contra o PT”. 

No ano seguinte, a comunidade chegou a apoiar por um mês o líder da extrema direita portuguesa André Ventura, do Chega, antes de reatar com Moro. Também flertou durante dois meses com o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG).

Com quase 100 mil inscritos, o grupo privado “🇧🇷 PABLO MARÇAL BR 🇧🇷” ainda guarda em sua URL uma referência às Forças Armadas brasileiras. Criada em 2017 com referência a “patriotas de direita”, a página passou a se chamar “AMOR MILITAR – BR” em dezembro de 2022, e retirou a referência aos quartéis logo após o 8 de janeiro.

Em 2023, seu nome se dedicou a exaltar o legado de Bolsonaro, exceto por um período de pouco mais de um mês entre maio e junho de 2023, quando começou a apoiar o ex-deputado estadual Marcos do Val, do Podemos capixaba.  

Grupos foram utilizados para mobilizações como a greve dos caminhoneiros e contra a votação do PL das Fake News.

Mobilização para greves de caminhoneiros e contra a votação do chamado PL das Fake News, o PL 2.630/2020, também constam no histórico de outras páginas que hoje fazem campanha para o candidato do PRTB à prefeitura de São Paulo. 

“Esses grupos não possuem uma filiação ideológica ou estreita em um candidato. Na maior parte das vezes, eles formam um arquipélago de interesses desde antivax [contra vacinas] a pessoas que são religiosas, contrárias ao movimento feminista, contra os direitos de pessoas LGBTQ+”, explica Leonardo Nascimento, coordenador do Laboratório de Humanidades Digitais da UFBA. 

Os grupos, segundo ele, são criados por várias razões – mercadológicas, como vender coisas, ou em torno de debates temáticos. Em momentos de eleições e crise, esses grupos “se transformam para atingir um determinado objetivo político, eleger um candidato ou defender uma causa, se posicionar sobre algum acontecimento”. 

Para o pesquisador, é necessário observar como nas redes sociais a militância política não está desvinculada de interesses econômicos. “O posicionamento político, militância, via redes sociais não está desvinculado dos interesses econômicos, da ideia de vender coisas, e de monetizar essa participação política. Essas coisas se confundem e, para fazer isso, você precisa ter muitas pessoas nos grupos e canais”, aponta.

Grandes perfis de direita Instagram também seguiram a tendência

O mesmo tipo de movimento ocorreu em ao menos três perfis de direita no Instagram, que somam 500 mil seguidores. Os três perfis passaram a reproduzir conteúdos pró-Marçal em maio de 2024, durante a pré-campanha. 

O maior deles se chama atualmente “Pablo Marçal Oficial SP®” e tem 335 mil seguidores. Na descrição, o perfil declara ser “perfil reserva oficial” do candidato à prefeitura de São Paulo pelo PRTB. A atual política de transparência da Meta não permite mais ver os nomes anteriores de um perfil, mas afirma que o nome foi mudado uma vez. 

Com base em publicações no feed do perfil, a reportagem apurou que só há referências sobre Pablo Marçal a partir de maio. Antes disso, o conteúdo era típico de um perfil bolsonarista, com divulgação de vídeos e memes de Bolsonaro e seus aliados, ataques ao governo, ao PT e à esquerda.

Rede de perfis de direita também têm contas em referência ao ex-presidente Jair Bolsonaro e ao ex-ministro Paulo Guedes.

O cenário é idêntico ao do perfil “Pablo Marçal Perfeito”, com 99 mil seguidores e que já mudou de nome seis vezes. Também passou a postar conteúdos ligados à campanha de Pablo Marçal em maio. 

Antes disso, era um perfil de direita bolsonarista mantido pela influenciadora Ana Moreno, conhecida como Ana Opressora, candidata a vereadora em Natal pelo PL. O perfil postava, além de vlogs produzidos pela influenciadora, registros de sua rotina, como idas à academia. Atualmente ela usa em sua própria campanha uma conta muito menor, com apenas 28,6 mil seguidores. 

A mesma lógica também é notada no “Pablo Marçal Prefeito”, com mais de 118 mil seguidores. A conta já mudou de nome três vezes desde que foi criada, em novembro de 2023. O perfil também aderiu à campanha de Marçal a prefeito em maio deste ano. 

A reportagem apurou que a conta faz parte de uma rede de perfis de direita, que também têm contas em referência ao ex-presidente Jair Bolsonaro e ao ex-ministro Paulo Guedes. Por trás de todas elas está o influenciador goiano Uelton Costa, candidato a vereador em Goiânia pelo PL e ligado ao deputado federal Gustavo Gayer, do PL. 

Procuradas, a assessoria de Pablo Marçal e a influenciadora Ana Moreno não se manifestarm.

Esta reportagem integra o projeto “Os Ilusionistas”, uma aliança jornalística coordenada pelo CLIP (Centro Latino-americano de Investigação Jornalística) na qual repórteres e pesquisadores digitais de 15 organizações e veículos de mídia latino-americanos investigam, de forma colaborativa, a circulação de informações falsas e a manipulação de conversas públicas na mídia digital, durante este “super ano eleitoral” de 2024 na América Latina. No Brasil, participam do consórcio o ICL Notícias, Aos Fatos e The Intercept Brasil.

Los Ilusionistas

Uma investigação jornalística que busca desvendar a desinformação política no “super ano eleitoral” de 2024 na América Latina. Liderado pelo Centro Latino-americano de Investigação Jornalística (CLIP) em aliança com ICL Notícias, Aos Fatos y Intercept (Brasil), El Faro (El Salvador), Lab Ciudadano (Honduras), Animal Político e Mexicanos Contra la Corrupción (México), La Prensa y Foco Panamá (Panamá), IDL Reporteros y Ojo Público (Perú), Diario Libre (República Dominicana), El Observador (Uruguai), Fake News Hunters, Cocuyo Effect, ProBox, C-Informa e Medianalisis (Venezuela)

🚨 O QUE ENFRENTAMOS AGORA 🚨

O Intercept está vigiando manobras eleitorais inéditas da extrema direita brasileira. 

Os golpistas estão de cara nova, com seus ternos e sapatênis. Eles aprenderam estratégias sofisticadas de marketing digital para dominar a internet, que estão testando agora nas eleições municipais.

O objetivo final? Dominar bases de poder locais para tomar a presidência e o congresso em 2026. 

Não se deixe enganar: Bolsonaro era fichinha perto dos fascistas de sapatênis…

O Intercept não pode poupar esforços para investigar e expor os esquemas que colocam em risco nossos direitos e nossa democracia.

Já revelamos as mensagens secretas de Moro na Lava Jato. Mostramos como certas empresas e outros jornais obrigavam seus trabalhadores a apoiarem Bolsonaro. E expusemos como Pablo Marçal estava violando a lei eleitoral. 

Mas temos pouco tempo, e muito mais a revelar. Agora precisamos de recursos para colocar mais repórteres nas ruas. Para isso, precisamos de sua ajuda. Somos financiados por nossos leitores, não pelas empresas ricas que mandam em Brasília.

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