Aumentou o clima de guerra fria entre Jair Bolsonaro e Valdemar da Costa Neto pelo controle do PL. Proibidos pela justiça de se falarem por conta da investigação da tentativa de golpe de Estado, o presidente de honra e o presidente de fato do partido trocaram farpas pela imprensa nas últimas semanas.
Apesar de se tratarem de maneira elogiosa publicamente, com a falsidade característica dessa gente golpista, ambos têm passado recados claros nas entrelinhas. No último dia 11, Valdemar declarou que apoiar uma eventual candidatura Tarcísio de Freitas, hoje no Republicanos, seria o “primeiro da fila” entre as opções do PL para a disputa à presidência em 2026.
Bolsonaro não deixou barato e declarou em entrevista: “Eu sei que não sou nada no partido, agradeço muito o Valdemar por ser presidente de honra, mas o candidato para 2026 é Jair Messias Bolsonaro”. O ex-presidente está inelegível até 2030, mas não admite que ninguém do seu campo político cogite qualquer outro candidato presidencial que não seja ele.
Em outra entrevista, Valdemar ousou um pouco mais e criticou diretamente a postura intransigente de Bolsonaro em não querer apoiar candidatos do PL nas cidades em que o partido está coligado com partidos de esquerda, como é o caso de São Luís, no Maranhão.
“Há lugares no Brasil, como no Maranhão, onde não há esquerda e direita. Há gente com fome. Vamos ter de trazer esse pessoal para ganhar a eleição. Trazer não é difícil. O duro é o Bolsonaro e o pessoal da extrema direita aceitar. Eles não querem”, afirmou Valdemar.
O ex-presidente respondeu novamente, mas de maneira velada, sem citar o nome do correligionário: “Quer dizer que não tem pessoas honestas no Maranhão? Temos como fazer no Maranhão 400 deputados federais que vão orgulhar o estado, o partido e o Brasil. Eu não posso entender alguém dizer que não tem bolsonarista no Maranhão”.
Outro motivo de disputa entre os dois é o controle da Fundação Álvaro Valle — órgão do PL responsável por realizar pesquisas e cursos de formação do partido. Bolsonaro quer colocar o 03, Eduardo Bolsonaro, no comando da fundação que tem um orçamento milionário — cerca de R$ 20 milhões só neste ano.
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Eduardo Bolsonaro pretendia assumir a fundação para usar a verba em atividades destinadas a difundir a ideologia de extrema direita e alimentar a militância bolsonarista. Hoje, o órgão é chefiado por uma aliada política de Valdemar, que já deixou claro que não irá ceder ao pedido de Bolsonaro.
“A fundação fica comigo. Ninguém da família Bolsonaro tocou nesse assunto comigo e não há briga. Aquilo que não gasto com o partido durante o ano vem para a fundação e já guardamos para a eleição seguinte. E, do jeito que o partido está, tem sido difícil guardar verba”, declarou Valdemar, numa tentativa de disfarçar que existe uma luta pelo orçamento do órgão.
Depois de deixar Bolsonaro furioso ao cogitar Tarcísio como candidato do PL em 2026, Valdemar voltou atrás e afirmou em nova entrevista que o ex-presidente conseguirá reverter a inelegibilidade e será o candidato do partido.
É claro que ele não acredita nisso, tanto que não descartou a possibilidade do ex-presidente ser preso: “O Bolsonaro vai ser candidato. Sabe por quê? Se prenderem o Bolsonaro e ele lançar de candidato um poste para Presidente da República?”.
Valdemar disse ainda que hoje o PL não tem votos para vencer Lula em 2026, o que é verdade. Para conquistar esses votos, ele sabe que é preciso costurar alianças com setores da direita e do centro que não fazem parte do bolsonarismo raiz. Para o presidente do PL, o radicalismo bolsonarista já deu o que tinha que dar e o único caminho para o sucesso na próxima eleição presidencial é o do pragmatismo.
Apesar de Tarcísio de Freitas dizer que Bolsonaro será o seu candidato e publicamente demonstrar fidelidade canina a ele, suas movimentações políticas deixam claro que ele tem se preparado para ser o candidato em 2026.
Valdemar parece estar disposto a sacrificar Bolsonaro para recolocar o partido no caminho do pragmatismo.
Ao contrário de Bolsonaro, Tarcísio entrou de cabeça na campanha de Ricardo Nunes em São Paulo e prestou apoio a vários candidatos de centro e direita do estado que estão fora da órbita do bolsonarismo.
Não é à toa que Kassab, o grande vencedor das eleições municipais, já deixou claro qual é o seu projeto: “Meu projeto é Tarcísio, sendo Tarcísio, eu vou estar alinhado com o projeto que seja compatível com o projeto do Tarcísio, seja ele governador ou presidente”, disse Kassab. Essas movimentações de Tarcísio nos bastidores têm preocupado o clã Bolsonaro, que percebeu que o seu poder de influência dentro da direita está minguando.
Bolsonaro continua sendo a maior liderança da direita, mas já não tem o mesmo apelo eleitoral de antes. Isso ficou evidente em várias disputas municipais, principalmente em São Paulo, onde o sucesso da candidatura de Pablo Marçal revelou que nem todo eleitor bolsonarista vota em quem o mito mandar.
O sucesso eleitoral do PSD de Kassab mostrou que é possível um partido de direita sobreviver eleitoralmente fora do guarda-chuva do bolsonarismo. Valdemar está lendo esses sinais e, por isso, passou a estufar o peito dentro do partido.
Ele entende que o PL precisa retomar o pragmatismo para se manter forte, e a presença do ex-presidente é um entrave para isso. Está bastante claro que o radicalismo bolsonarista não será suficiente para evitar a reeleição de Lula em 2026.
Bolsonaro e Valdemar mantêm uma relação tensa há tempos, que só durou até aqui por conveniência mútua. O primeiro tem os votos, enquanto o segundo tem o partido com o maior orçamento do país.
Mas o cenário está mudando e tudo indica que essa relação, que sempre foi frágil, está caminhando para uma ruptura. Valdemar parece estar disposto a sacrificar Bolsonaro para recolocar o partido no caminho do pragmatismo.
Dentro desse contexto, não é difícil imaginar que o presidente do PL não só está cogitando a possibilidade de Bolsonaro ser preso, como está torcendo para que isso aconteça. Com o ex-presidente enjaulado, o PL ficaria livre para formar uma coalizão em torno de Tarcísio e chegar forte em 2026 para enfrentar Lula.
JÁ ESTÁ ACONTECENDO
Quando o assunto é a ascensão da extrema direita no Brasil, muitos acham que essa é uma preocupação só para anos eleitorais. Mas o projeto de poder bolsonarista nunca dorme.
A grande mídia, o agro, as forças armadas, as megaigrejas e as big techs bilionárias ganharam força nas eleições municipais — e têm uma vantagem enorme para 2026.
Não podemos ficar alheios enquanto somos arrastados para o retrocesso, afogados em fumaça tóxica e privados de direitos básicos. Já passou da hora de agir. Juntos.
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