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Mulheres trans nos EUA podem ir para prisões masculinas

Decretos de Trump podem levar detentas trans a serem transferidas para presídios masculinos, onde sofrerão violência.

Pessoas trans protestam diante da Casa Branca durante o primeiro governo Trump.

Na tarde de sexta-feira, Kara Sternquist, uma mulher trans detida em uma prisão feminina federal em Forth Worth, Texas, EUA, foi retirada de sua unidade. Um guarda disse a Sternquist que ela tinha uma consulta psiquiátrica excepcional na capela.

“Mentiram para ela”, conta Deviant Ollam, um amigo que fala frequentemente com ela por telefone. “Assim que ela estava longe de todos, eles a levaram.”

Sternquist teria contado a Ollam, segundo o próprio, que estava entre a dezena de mulheres trans que haviam sido separadas da população geral da prisão FMC Carswell e transferida para a unidade de segregação administrativa que normalmente é usada para detentas em risco de suicídio. (O Intercept não conseguiu falar diretamente com Sternquist, e um funcionário da FMC Carswell se recusou a responder perguntas em contato telefônico na segunda-feira.)

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Elas foram informadas de que seriam transferidas para um presídio masculino, segundo Ollam, à luz do decreto antitrans do presidente Donald Trump, que orientou o Departamento Penitenciário a assegurar “que machos não sejam detidos em prisões femininas” e que detentos não recebam cuidados de saúde de afirmação de gênero com uso de recursos federais. Na segunda-feira, Trump editou outro decreto de intolerância, barrando as pessoas trans do serviço militar, que foi rapidamente questionado na justiça federal.

As mulheres trans obrigadas a viver em estabelecimentos prisionais masculinos enfrentam um risco desproporcional de agressão sexual e violência, como reconhece o manual sobre detentos trans do Departamento Penitenciário, publicado em 2022.

Na tarde de terça-feira, um diretor da prisão disse inesperadamente a Sternquist que ela poderia retornar à sua unidade por enquanto, segundo Ollam relatou ao Intercept. “Ela ainda está muito preocupada, mas otimista”, disse, depois de falar ao telefone com ela.

Os quatro dias de sofrimento de Sternquist e a incerteza persistente sobre onde ela cumprirá o restante de sua pena refletem a situação precária de centenas de pessoas trans em prisões federais, que estão sendo perseguidas por Trump e seus aliados de extrema direita.   

“A pior parte para ela é não saber o que vai acontecer a seguir”, diz Allegra Glashausser, advogada de Sternquist. “Ela não sabe se será mantida com homens. Ela não sabe se receberá seus hormônios como programado. Tudo é incerto. Estou extremamente preocupada com a segurança física e a saúde mental de Kara.”

“As pessoas trans presas, e especialmente as mulheres trans, estão sofrendo o impacto direto dos danos imediatos desse decreto”, diz Shayna Medley, advogada de contencioso da organização Defensores da Igualdade Trans.

Não é a primeira vez que Sternquist enfrenta uma alocação perigosa em presídio federal.

Em 2022, depois de ser presa por acusações relacionadas a armas de fogo e posse de crachás do governo forjados, Sternquist foi inicialmente colocada na unidade masculina das famigeradas instalações da MDC Brooklyn, embora seu passaporte e sua carteira de motorista tragam a informação de que ela é mulher.

Foram necessários dois mandados judiciais e a ameaça de sanções por um juiz federal para que o Departamento Penitenciário transferisse Sternquist para um alojamento feminino na MDC Brooklyn. “O Departamento de Justiça e o Departamento Penitenciário atuam sob o equívoco de que os mandados judiciais são consultivos”, escreveu o juiz Sanket Bulsara, em mandado expedido em setembro de 2022. “Essa conduta contumaz enseja risco de sanções por descumprimento.”

Em outro mandado, de novembro de 2022, um juiz determinou que o Departamento Penitenciário alterasse o marcador de gênero de Sternquist para “mulher” em um banco de dados prisional. “Deixar de fazê-lo apenas continuaria a causar os problemas de atribuição equivocada de gênero que a Ré vem enfrentando sob custódia”, escreveu a juíza distrital Dora Irizarry.

Em agosto de 2024, após Sternquist se declarar culpada pela acusação relativa às armas de fogo, Irizarry a condenou à prisão por 60 meses. A sentença da juíza recomendava especificamente que Sternquist fosse direcionada para a FMC Carswell “ou outro estabelecimento médico feminino”, e que o Departamento Penitenciário “fornecesse cuidados médicos de afirmação de gênero e de outros tipos”.

“É preciso mover céus e terras para que elas fiquem na unidade certa”, disse Ollam sobre o processo para que pessoas trans presas sejam direcionadas para as instalações adequadas, mesmo com as regras do governo Biden. “Se elas forem transferidas, provavelmente estarão perdidas para sempre.”

Ollam, que publica atualizações em vídeo sobre o caso e as condições de Sternquist, contou ao Intercept que ela não sabe quando será transferida, mas teme que possa acontecer a qualquer momento. Enquanto isso, autoridades do presídio começaram a se dirigir a Sternquist e às outras mulheres trans por pronomes masculinos, segundo Ollam. “Quando os funcionários entram aqui, eles se dirigem a elas como ‘senhores'”, diz.

O Departamento Penitenciário não respondeu às perguntas sobre as mulheres trans detidas na FMC Carswell, nem sobre os planos de transferi-las. Mas outro detento do local, Ángel Espinosa-Villegas, que é transmasculino, fez um relato muito parecido com o de Ollam nas mensagens que enviou aos amigos.

‘Não sei mais o que fazer além de soar os alarmes.’

Na sexta-feira, os guardas “levaram as mulheres trans de todas as unidades”, escreveu Espinosa-Villegas em uma mensagem no dia, que foi compartilhada com o Intercept. “Você precisava ter visto os olhares malignos de triunfo quando eles escoltaram as mulheres trans daqui, chorando.”

Espinosa-Villegas também escreveu sobre o receio entre detentos transmasculinos de “sermos os próximos na lista de Trump”.

“Agora estão falando sobre nós, transmasculinos, sermos enviados para [segregação administrativa] até o ‘Trump encontrar um lugar para nós'”, escreveu Espinosa-Villegas. “Tem policiais dizendo essa merda. Eles se recusaram a me dar as injeções [de testosterona] todas as vezes que fui pedir.”

“Meu Deus, ver as mulheres trans sendo arrastadas foi pura maldade”, escreveu Espinosa-Villegas em outra mensagem. “Não sei mais o que fazer além de soar os alarmes.”

No domingo, outra mulher trans sob custódia federal — identificada nos autos do processo por um pseudônimo, Maria Moe — entrou com a primeira ação judicial contestando o decreto.

“Maria Moe vive como mulher e tomar hormônios continuamente desde a adolescência”, diz a petição inicial, protocolada na justiça federal no estado de Massachusetts. “Durante seu período de encarceramento, ela sempre foi tratada como mulher pelos funcionários da administração penitenciária e por suas colegas. Ela nunca foi alojada em uma instituição masculina, e nunca parou de tomar seus hormônios.”

Mas na semana passada, como Sternquist e as outras na FMC Carswell, Moe foi removida da população geral de um estabelecimento feminino, segundo os documentos judiciais, que ocultaram o nome do presídio específico. No dia seguinte à assinatura do decreto por Trump, Moe foi confinada à “Unidade Especial de Alojamento” e “não foi autorizada a ter contato com outras pessoas por pelo menos quatro dias”. 

O advogado de Moe argumenta que as disposições do decreto sobre alojamento de presos violam a proibição da Oitava Emenda Constitucional contra penas cruéis ou incomuns, entre outras disposições da Constituição e da legislação federal, assim como a proibição de fornecimento da terapia hormonal e outros cuidados. 

“Transferir Maria Moe para uma prisão masculina representará um risco substancial de danos graves, incluindo risco extremamente alto de violência e agressão sexual por outras pessoas encarceradas e funcionários do Departamento Penitenciário”, diz a petição inicial.

Em resposta ao pedido, o juiz distrital George O’Toole, em Boston, impediu liminarmente a transferência, enquanto aprecia o mérito da questão.

Embora o caso de Moe tenha sido rapidamente colocado em sigilo, Ollam diz que ele, Sternquist, e as outras mulheres trans na FMC Carswell estão acompanhando de perto, na esperança de que o juiz do caso suspenda o decreto em todo o país. Na semana passada, um juiz federal suspendeu temporariamente outro dos decretos de Trump, relativo ao direito de cidadania por lugar de nascimento.

“As meninas só querem que seu recado seja: o silêncio equivale à morte”, diz Ollam.

N. da. E.: O texto foi atualizado para incluir a informação de que já houve decisão preliminar no caso de Maria Moe.

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