Resistir e se unir aos moderados. Este é o norte da estratégia da esquerda para barrar o plano de dominação do Senado da extrema direita para as eleições de 2026 – que mira ter em mãos poderes exclusivos da Casa, como o impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal, o STF.
O cenário preocupa. Em 2022, a esquerda só conquistou cinco das 27 cadeiras em disputa contra 14 da extrema direita – o levantamento do Intercept Brasil considera que pertencem a esse grupo eleitos pelos partidos PL, PP, Republicanos e Novo.
Já nas eleições do próximo ano, PT, PSB e PDT botarão em jogo 12 das 17 vagas que têm no Senado – e sete delas ficam fora do Nordeste, seu reduto mais forte, em regiões definidas como prioritárias pelos rivais, como o Intercept mostrou.
Para proteger seu território e competir com a extrema direita, uma das estratégias cogitadas é lançar apenas nomes com grande chance de vitória. Onde isso não for possível, o plano é se aliar a opções mais moderadas do Centrão – em especial MDB, PSD e União Brasil, que já integram o governo Lula.
Esse caminho passa por dar apoio, principalmente, a ministros destas siglas. Dois são do PSD: Carlos Fávaro, da Agricultura, que deve disputar a reeleição como senador em Mato Grosso, e Alexandre Silveira, de Minas e Energia, que pode tentar seu retorno ao Senado por Minas Gerais.
Outro nome no radar é Simone Tebet, que comanda o Planejamento e cogita voltar ao cargo de senadora pelo MDB em Mato Grosso do Sul. No Nordeste, uma alternativa é apoiar Silvio Costa Filho, ministro de Portos e Aeroportos e filiado ao Republicanos, para a disputa do Senado em Pernambuco.
A esquerda também avalia priorizar candidaturas ao Senado em vez de lançar nomes aos governos estaduais – e, onde isso não for possível, a ideia é construir dobradinhas com quem não se alinhe visceralmente ao bolsonarismo.
“Lógico que a gente quer manter a nossa bancada do PT, mas o mais importante é ter uma maioria da base do governo no Senado. Isso significa que, em vários lugares, vamos possivelmente abrir mão de candidaturas para apoiar candidatos de centro. É essa a estratégia que a gente está trabalhando”, disse Humberto Costa, senador por Pernambuco e presidente interino do PT, ao Intercept.
Na avaliação de políticos da esquerda, isso é crucial porque também estará em jogo a governabilidade em um eventual quarto mandato de Lula a partir de 2027. O desafio, porém, será driblar certas resistências de petistas a essa ideia.
Mas quebrar esse obstáculo passa por reconhecer a necessidade de pensar além dos interesses partidários, avaliou José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil de Lula. Em entrevista à Folha de S.Paulo em setembro de 2024, Dirceu não escondeu que os petistas estão “preocupados” com as eleições de 2026.
Por isso, disse ele, é essencial a esquerda costurar alianças que foquem em “evitar que haja uma maioria de extrema direita” na próxima legislatura. “Se não pudermos ter um candidato próprio, da esquerda, que ele seja da direita – e não da extrema direita”, sugeriu.
Força petista sob perigo
Hoje, o PT tem 10 senadores – nove deles no exercício do mandato, pois a suplente do ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, é Jussara Lima, do PSD. Destes, seis terão o seu mandato encerrado no próximo ano. Três são do Nordeste: Jaques Wagner, na Bahia, Humberto Costa, em Pernambuco, e Rogério Carvalho, em Sergipe.
No Norte, a única cadeira em jogo é a de Randolfe Rodrigues, líder do governo no Congresso, que representa o Amapá. Na região, os petistas têm certo temor porque o bolsonarismo cresceu e a sigla não elegeu nenhum prefeito em quatro estados: Acre, Amapá, Rondônia e Roraima.
As outras duas vagas do PT são as que correm, neste momento, o maior perigo. Uma é de Fabiano Contarato, no Espírito Santo. O risco está na possível entrada do governador reeleito Renato Casagrande, do PSB, no páreo – a perda, neste caso, seria para o PT, pois o PSB é uma sigla de centro-esquerda.
Contarato garante que será o candidato do PT à reeleição e que isso é prioridade para o partido e para o próprio Lula. Delegado da Polícia Civil, ele defende que a esquerda assuma a segurança pública como uma bandeira central para chegar forte na eleição — uma área que, segundo ele, vem sendo monopolizada pela direita com soluções populistas e autoritárias.
Entre as sugestões do senador, estão criminalizar a violência doméstica reiterada como tortura, reforçar penas para crimes de corrupção e aumentar o tempo de internação para adolescentes que cometem crimes graves.
“A população tem que entender a forma como o partido está trabalhando nesses temas relacionados à segurança pública. Esse assunto não pode ser um tabu”, disse ao Intercept.
LEIA TAMBÉM:
- Poderes exclusivos e impeachment no STF: por que a extrema direita quer tomar o Senado em 2026
- Onde estão as 16 cadeiras que podem dar a maioria do Senado à extrema direita em 2026
Já no Rio Grande do Sul, o único senador de esquerda eleito, Paulo Paim, do PT, termina o mandato no ano que vem e já confirmou que não disputará a reeleição. O nome preferido de Lula para manter a vaga é o deputado federal Paulo Pimenta, que foi ministro e liderou as ações do governo federal durante a enchente que atingiu o estado em 2024.
No entanto, derrapadas à frente da Secretaria de Comunicação da Presidência da República e na própria condução da crise ambiental podem atrapalhar os planos. Pimenta foi substituído na Secom em janeiro deste ano, semanas após críticas públicas de Lula sobre a comunicação, em um seminário do partido.
Diante desse cenário, um apoio estratégico da esquerda e da centro-esquerda a um candidato mais moderado não é um cenário descartado. “A disputa será complicada, mas não impossível. Temos bons quadros e, com uma visão de frente ampla, podemos vencer”, avaliou Paulo Paim ao Intercept.
Paim lembra que a direita é muito forte no Rio Grande do Sul e que foi o único senador de esquerda eleito no centro-sul do país em 2018. “Na última eleição, foi muito difícil conter todo esse avanço”, admitiu.
Centro-esquerda na berlinda
Já os partidos de centro-esquerda contam atualmente com sete cadeiras no Senado – e seis delas precisam ser renovadas nas eleições de 2026. O PDT tem duas: Leila do Vôlei, no Distrito Federal, e Weverton Rocha, no Maranhão.
Destas, a mais cobiçada pela extrema direita é a vaga no DF. A estratégia à mesa tem opções do próprio PL, como Michelle Bolsonaro e a deputada federal Bia Kicis, e até mesmo o governador reeleito Ibaneis Rocha, do MDB.
Já o PSB põe em jogo quatro cadeiras: Cid Gomes, no Ceará, Jorge Kajuru, em Goiás, Flávio Arns, no Paraná, e Chico Rodrigues, em Roraima. Três estão no mapa de prioridades da extrema direita, principalmente a do Sul e a do Centro-Oeste, onde a meta é ganhar as duas vagas em todos os estados.
A exceção é o Ceará. Apesar de Cid Gomes ter descartado ir à reeleição, a esquerda confia na força do ministro da Educação, Camilo Santana, que foi reeleito senador em 2022, e conta com a saída de Eduardo Girão, do Novo — ele deve abrir mão de tentar um novo mandato para disputar o governo do estado.
JÁ ESTÁ ACONTECENDO
Quando o assunto é a ascensão da extrema direita no Brasil, muitos acham que essa é uma preocupação só para anos eleitorais. Mas o projeto de poder bolsonarista nunca dorme.
A grande mídia, o agro, as forças armadas, as megaigrejas e as big techs bilionárias ganharam força nas eleições municipais — e têm uma vantagem enorme para 2026.
Não podemos ficar alheios enquanto somos arrastados para o retrocesso, afogados em fumaça tóxica e privados de direitos básicos. Já passou da hora de agir. Juntos.
A meta ousada do Intercept para 2025 é nada menos que derrotar o golpe em andamento antes que ele conclua sua missão. Para isso, dependemos do apoio de nossos leitores.
Você está pronto para combater a máquina bilionária da extrema direita ao nosso lado? Faça uma doação hoje mesmo.