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Do ‘ópio do povo’ ao ódio do povo: crise da seleção expõe autoritarismo na CBF

Troca de técnico e denúncias contra a reeleição de Ednaldo Rodrigues extrapolam maus resultados esportivos e remetem à demissão na ditadura e investigação de patrocinador milionário dos anos 1990.

Ednaldo Rodrigues foi reeleito presidente da CBF, por unanimidade, e comandará entidade até 2030 (Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress)

A paixão nacional pelo futebol não pode ser encarada com ingenuidade – a relação é passional, mas passa longe de parecer um carinho inocente. A história extrai do esporte um estranho fator de mobilização para o ódio espalhado pela sociedade. 

Essas pressões, difusas, fazem com que mudanças se precipitem, a exemplo da recente decisão de tirar Dorival Júnior do cargo de treinador da seleção masculina. Em 2025, a instabilidade coincidiu com a reeleição de Ednaldo Rodrigues como presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). 

Um ano antes da Copa do Mundo na América do Norte, a CBF se esgarça publicamente. Do ponto de vista administrativo, o pornográfico aumento dos salários dos presidentes das federações estaduais e os recursos gastos para viagens de aliados, denunciados em reportagem da piauí, deixam em evidência a falta de democracia na entidade.

Esportivamente, as derrotas e o afastamento dos torcedores, com ingressos caros e jogos sediados fora do país, despertam um desgosto impreciso, disperso na cultura popular. E suscitam reações.

Ainda é comum encontrar quem o associe com a alienação, mas o esporte não esteve imune aos conflitos na sociedade, e uma desconfortável constância reforça isso. Quando o calendário se mostra apertado, os dirigentes escancaram os alicerces monstruosos do futebol no Brasil: demitem técnicos, simulam mais atenção a apelos populares e fazem reformulações na seleção. 

A pressa poderia expor apenas a falta de planejamento – comprovada, sem dúvidas, pelas hesitações dos gestores. Mas, em pelo menos outras duas oportunidades no passado, as trocas tumultuadas no comando da seleção ajudam a explicar as disputas políticas: uma no fim da década de 1960 e outra no início dos anos 2000. 

Esses episódios ocorreram em períodos críticos, seja pelo autoritarismo e consequente supressão das garantias básicas, seja através do desmonte do estado após a concessão de empresas públicas à iniciativa privada. Em ambos, os confrontos no legislativo, no executivo e nas ruas sutilmente se correlacionaram com a rotina nos vestiários, campos de jogo e, principalmente, à beira dos gramados.

Ednaldo Rodrigues foi reeleito presidente da CBF, por unanimidade, e comandará entidade até 2030 (Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress)
Ednaldo Rodrigues foi reeleito presidente da CBF, por unanimidade, e comandará entidade até 2030 (Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress)

A preparação para a Copa do Mundo de 1970 é ilustrativa. A edição anterior do torneio, em 1966, havia sido a chance de um tricampeonato consecutivo, até hoje inédito. Era, ainda, a primeira Copa da ditadura no Brasil – há relatos de que as autoridades tentaram tirar proveito da popularidade daquela equipe, cuja preparação foi caótica. O desempenho frustrou as expectativas com a eliminação prematura na  primeira fase. 

Embora o período autoritário já estivesse em vigor, a escalada da violência foi disparada logo depois, em 1968, com o Ato Institucional Nº 5, o brutal AI-5. A medida determinou, por exemplo, o fim do habeas corpus e a brutalidade da repressão. Então, a insatisfação não poderia mais se manifestar nas formas convencionais da política – de toda maneira, suprimidas. 

Não é exagero imaginar que a irritação tenha respingado no principal símbolo de sucesso do país no exterior. Afinal, o bicampeonato em 1958 e 1962 arrancou suspiros mundo afora. Sob essa paisagem trêmula, surpreendentemente, o popular comentarista esportivo João Saldanha assumiu como técnico da seleção em 1969.

Um técnico ‘inconveniente’ às vésperas da Copa

Começaram a vir a público, em ano de véspera de Copa do Mundo, as fortes ligações de Saldanha com o Partido Comunista Brasileiro, perseguido à época; brigas públicas com outros profissionais do futebol; e até desentendimentos com Pelé

Com as sucessivas crises e a repercussão na cobertura especializada, a demissão de Saldanha foi anunciada meses antes da competição. Quem levantou o troféu do terceiro título brasileiro foi Mario Jorge Lobo Zagallo, outro treinador – acompanhado de uma equipe técnica fortemente militarizada.  

A vinculação com o governo era direta. A então Confederação Brasileira de Desportos, CBD, responsável por administrar o futebol, estava atrelada ao Conselho Nacional de Desportos – um colegiado no interior do Estado. 

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Foi só a partir do fim dos anos 1970 que a modalidade se tornou gradualmente mais privada. A criação da CBF, uma instituição particular, exemplifica esse processo. Passou a ser comum a crítica à mercantilização de clubes e profissionais, sob a alegação do abandono dos antigos valores do esporte.

O futebol, contudo, continuou a despertar reações acaloradas. Principalmente, porque permaneceu entre as tradições populares a sensação de pertencer ao Brasil por meio daquele histórico time multicampeão. 

Daí a ambiguidade: a seleção evoca a brasilidade da população e, simultaneamente, ao estar sob controle privado obedece a orientações excludentes – que a afastam do povo. Esses dilemas, presentes inclusive em bate-papos cotidianos, ganham tamanha proporção que resvalam na ordem dos trabalhos em Brasília, em especial a partir dos anos 1990, diante da agressividade do embate entre público e particular. 

Derrota para a França, CPI e nova crise

A década de 1990 foi definitiva para as privatizações de empresas estatais e não é exagero identificar ali o ponto de partida para a perda de direitos que alcança, no século XXI, os extremos da uberização. É possível notar consequências pouco perceptíveis no desconforto com as mudanças e suas implicações para o futebol.

A revolta com a decisão da Copa do Mundo de 1998, em que o time brasileiro levou 3 a 0 dos franceses, e as infundadas acusações de que a seleção havia sido sabotada são dois exemplos disso. A circulação das suspeitas de conspiração entre gente comum reforça essa resistência à natureza meramente comercial do futebol. 

Foi estabelecida nesse clima até uma Comissão Parlamentar de Inquérito, CPI, em 2000 para investigar a promiscuidade da modalidade com as empresas que o financiam, rebatizada pelos jornais de CPI da Nike. Esporte nacional, lucro global: o futebol entrava, mais do que nunca, na mira dos megainvestidores internacionais. 

Com o aumento do montante em circulação, as suspeitas recaíam sobre empresários, dirigentes e treinadores de futebol.  Até o atacante Ronaldo foi questionado a respeito da influência da patrocinadora e até sobre sua escalação na final da Copa de 1998.

Assim, somadas aos insucessos esportivos, as consecutivas alterações na equipe técnica conduziram Luiz Felipe Scolari ao cargo de treinador no ano que antecedeu o mundial da Coreia do Sul e do Japão – onde o Brasil conquistou o pentacampeonato, em 2002.

A despeito de ser chamado de ópio do povo por supostamente inebriar a população e apartá-la dos problemas sociais, o futebol parece condensar descontentamentos no Brasil

Na crise atual da CBF se empilham questões históricas como o autoritarismo, representado por eleições com candidatos únicos e sem oposição nas urnas desde 1989, e pelo avanço de um restritivo poder privado, capaz de pagar viagens a familiares de um parlamentar aliado para conservar boas relações com as federações

Há, também, insatisfações disformes, que ressoam em gritos de torcida, mas ultrapassam o próprio esporte.

Temos uma oportunidade, e ela pode ser a última:

Colocar Bolsonaro e seus comparsas das Forças Armadas atrás das grades.

Ninguém foi punido pela ditadura militar, e isso abriu caminho para uma nova tentativa de golpe em 2023. Agora que os responsáveis por essa trama são réus no STF — pela primeira e única vez — temos a chance de quebrar esse ciclo de impunidade!

Estamos fazendo nossa parte para mudar a história, investigando e expondo essa organização criminosa — e seu apoio é essencial durante o julgamento!

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