Desesperado para aprovar a reforma da Previdência, o governo lançou uma nova campanha publicitária caríssima e recheada de distorções. A principal mensagem das novas propagandas é a de que a reforma será feita para “combater privilégios”, o que é uma grande falácia. Como mostrou The Intercept Brasil, grandes privilegiados, como os militares, passarão incólumes.
Outra estratégia encampada pelo governo é incentivar a pressão para cima dos parlamentares. Na última terça-feira, Temer e Meirelles se reuniram com empresários e pediram para que eles ligassem para “seus deputados e senadores” fazendo um apelo pela aprovação da reforma. A reunião teve como objetivo cobrar empenho direto dos empresários na campanha, mas nem precisava. Representantes de importantes setores da indústria e do comércio já estavam ligando, mandando e-mails, fazendo corpo a corpo em Brasília e até mesmo indo às casas de parlamentares. É bonito de ver como os privilegiados se mobilizam para combater privilégios.
Durante a reunião, outros privilegiados pelo governo, como os grande oligopólios de mídia, foram lembrados por Temer e Meirelles da adesão ampla e irrestrita à reforma. “Os senhores podem perceber que a imprensa toda brasileira, sem exceção, está apoiando com editoriais e notícias. Então, a hora é agora”, lembrou Temer. Meirelles reforçou: “A mídia apoia integralmente”.
Agências de publicidade terão um natal farto de dinheiro público. Em novembro o Congresso autorizou o repasse de R$ 99 milhões para publicidade direcionadas à Reforma da Previdência. E se não for aprovada, esse dinheiro terá sido em vão?
— George Marques (@GeorgMarques) 15 de dezembro de 2017
Dois dias após a reunião com líderes empresariais, pudemos ver o resultado da pressão governista estampado nos jornais. Como se já não bastasse o apoio maciço da mídia, pelo menos três grandes jornais (Folha de São Paulo, Estado de Minas e Correio Braziliense) amanheceram com gigantescas propagandas a favor da reforma contratadas pela ABRASCE — entidade representativa dos donos de Shopping Centers. O texto é tão alinhado ao discurso governista, que parece até que foi ditado por Moreira Franco:
Não é a primeira vez que a ABRASCE, maior entidade de um setor que representa 2,57% do PIB do país, entra de sola em questões políticas em favor do grupo político que sustenta Michel Temer. À época do impeachment, a ABRASCE enviou e-mails para seus associados recomendando ponto facultativo no dia da votação. O presidente da entidade, Glauco Humai, é também fundador do Agora! — aquele movimento que se pretende isentão, mas que dialoga com PPS, Rede, PSL/Livres na tentativa de viabilizar candidaturas como a de Luciano Huck, por exemplo. O irmão de Tasso Jereissati (PSDB), dono do grupo Iguatemi, também é integrante do Agora! e da ABRASCE.
O empresário e apresentador Sílvio Santos, um fiel soldado governista, também foi convocado novamente para colocar sua concessão pública em defesa da reforma. De acordo com o Planalto, Temer foi convidado pelo SBT para participar do Programa Sílvio Santos. A dupla certamente mostrará entrosamento para convencer o povo de que pretendem combater privilégios, e não aniquilar seus direitos previdenciários em nome de uma reforma desenhada pelo mercado financeiro.
O MBL, que desde o ano passado atua em conjunto com o governo para traçar estratégias de comunicação das reformas, já realinhou o discurso em suas redes sociais. Preocupadíssimos em combater privilégios, a torcida organizada do mercado financeiro tem feito o que faz de melhor: espalhar fake news fingindo estar combatendo fake news. Nessa semana eles afirmaram que os devedores da previdência estão sendo devidamente cobrados e que a “chance de recuperação da dívida é quase nula”, sendo que a própria Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional informa que R$175 bilhões, de uma dívida de R$450 bilhões, são recuperáveis. O que é nulo é o interesse em recuperar esses débitos, haja vista que grandes devedores da previdência ajudaram na criação da reforma, como é o caso dos bancos.
Ainda sem apoio popular e os votos necessários para aprovar a reforma, o governo decidiu adiar a votação para fevereiro. Na reta final para a aprovação em ano eleitoral, essa nova investida pesada da tríade (governo, empresariado e mídia) representa a última cartada para convencer o povo e o Congresso. É a batalha mais dura enfrentada pelo governo que, até aqui, passeou nas votações de seu interesse. Na Argentina, a população tem se levantado fortemente contra a reforma previdenciária, que é bem menos draconiana que a de Temer e com a substancial diferença de que está sendo proposta por um presidente eleito democraticamente. Que a luta dos nossos vizinhos nos sirva de exemplo.
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