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Como um nazista brasileiro, robôs e conservadores ressuscitaram uma notícia falsa sobre maconha

Decidi seguir o rastro e topei com uma manchete falsa, um nazista brasileiro, perfis conservadores... e um exército de robôs espalhador de fake news.

RJ - Rio de Janeiro - 06/05/2017 - Marcha da Maconha. - Pessoas participam da Marcha da Maconha, que reivindica a legalização da erva para uso medicinal e recreativo, em Ipanema neste sabado (06). Foto: Luciano Belford/AGIF (via AP)

Na última semana uma notícia voltou às redes sociais. Um estudo concluía: “Maconha causa mais câncer que cigarro”. Estranhei. Em todos esses anos escrevendo sobre tráfico e guerras às drogas eu jamais tinha visto conclusão parecida. Decidi seguir o rastro e topei com uma manchete falsa, um nazista brasileiro, perfis conservadores e um exército espalhador de fake news.

A matéria é baseada em um estudo de cientistas da Nova Zelândia publicado no European Respiratory Journal. A viralização da notícia – publicada originalmente em 2008 – começou no dia 28 de fevereiro com o perfil @_harry_marson.

Harry Marson, o nazista brasileiro

Harry Marson, o nazista brasileiro

captura de tela

Harry é um fã de Hitler, fundador de um tal Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Brasileiros.

A busca pela manchete exata (“Maconha causa mais câncer que cigarro, diz estudo”) mostra que a última vez que ela tinha vindo a tona foi em 28 de janeiro.

Então aparece nosso fã de Hitler e reposta o link. Harry Marson é o paciente zero do vírus. Atrás dele marcha um exército de perfis robotizados. O primeiro tuíte depois daquele de Hitler Jr é das 6:10 da manhã. Depois, mais 21 tuítes em sequência. Alguns com diferença de poucos minutos entre si.

O que todos têm em comum? Zero interação. Nenhum retuíte. Nenhum favoritado.

Então finalmente 3 contas corpulentas postam a mesma notícia. É o fósforo no rastilho de pólvora. Pronto. O link volta às timelines do Brasil, favoritado e retuitado sem que ninguém olhe pra data e duvide da manchete.

Tem um problema além do espalhamento da notícia ter sido feito por um exército de robôs. É que a manchete é totalmente falsa.

Primeiro: a pesquisa não fala em “causa” do câncer. Fala em “aumento de risco”. Coisas diferentes. Causa é correlação direta; aumento de risco é possibilidade atrelada a outros fatores como alimentação e qualidade do ar, por exemplo. Segundo: não é um estudo sobre “o câncer”, mas apenas sobre “o câncer de pulmão”. E em pessoas com menos de 55 anos. Terceiro: o estudo é fraco. Somente 79 casos foram analisados, e as conclusões se baseiam em questionários (“você fuma cigarro?” “você fuma maconha?” “Quantos maços” “Quantos baseados”).

Mas o melhor vem agora: o estudo concluiu que fumar maconha aumenta o risco de câncer de pulmão (o que é óbvio), mas conclui também que fumar cigarro aumenta muito mais esse mesmo risco, contrariando a manchete. Está lá, na tabela 3 da pesquisa: fumantes de cigarro têm em média 6,7 pontos de risco a mais de ter câncer de pulmão. E usuários de maconha? Só 1,2 ponto a mais!

Então, amigos, além de termos uma manchete absolutamente fantasiosa, que circula por aí desde 2008 sem jamais ter sido corrigida, ela foi um oferecimento de Hitler Jr, de perfis zumbis do Twitter e de tuiteiros que não lêem antes de compartilhar. Se mini-Hitler e seu partido fantasma foram capazes de fazer isso, imagina o que farão os partidos que querem seu voto nessa eleição.

JÁ ESTÁ ACONTECENDO

Quando o assunto é a ascensão da extrema direita no Brasil, muitos acham que essa é uma preocupação só para anos eleitorais. Mas o projeto de poder bolsonarista nunca dorme.

A grande mídia, o agro, as forças armadas, as megaigrejas e as big techs bilionárias ganharam força nas eleições municipais — e têm uma vantagem enorme para 2026.

Não podemos ficar alheios enquanto somos arrastados para o retrocesso, afogados em fumaça tóxica e privados de direitos básicos. Já passou da hora de agir. Juntos.

A meta ousada do Intercept para 2025 é nada menos que derrotar o golpe em andamento antes que ele conclua sua missão. Para isso, precisamos arrecadar R$ 500 mil até a véspera do Ano Novo.

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