Os computadores que registram a chegada de visitantes na Câmara de Vereadores do Rio marcavam 12h09 na quarta-feira, 7 de março, quando Cristiano Girão Matias entrou por uma porta lateral. No passado, entre janeiro e dezembro de 2009, a Casa chegou a fazer parte da sua rotina. Até ele ser preso, sob a acusação de chefiar uma milícia em Jacarepaguá, na Zona Oeste da cidade. Em outubro de 2010, após quase um ano atrás das grades, a mesa diretora cassou o seu mandato – não pelos crimes dos quais é acusado, mas por excesso de faltas. E não houve mais notícia de que ele tivesse aparecido de novo na sede do Legislativo carioca.
The Intercept Brasil teve acesso à imagem que mostra o rosto de Girão no momento em que ele entrou no prédio na última semana. Na recepção, o destino informado pelo visitante – condenado por formação de quadrilha – foi o gabinete da Presidência da Câmara. O ex-vereador, porém, ainda esteve no sétimo andar, onde ficam as salas do pessolista David Miranda e de Zico Bacana (PHS) e Chiquinho Brazão (MDB) – este último irmão do ex-conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, Domingos Brazão, preso pela Operação Quinto do Ouro, em março do ano passado.
A presença de Girão na Câmara é especialmente emblemática diante do assassinato de Marielle Franco. Em 2008, a combativa vereadora morta brutalmente nesta quarta-feira trabalhou ativamente na CPI das Milícias, como assessora do deputado Marcelo Freixo. A Comissão indiciou 226 pessoas – entre elas Cristiano Girão. Freixo ainda se desloca com seguranças por causa daquele período. Enquanto a Casa perdia uma guerreira contra os paramilitares, o miliciano ressurgia das cinzas e voltava a circular nos corredores e gabinetes.
Outro desafeto do miliciano morto na mesma noite
Na mesma noite em que Marielle foi morta, outro personagem ligado a Girão foi assassinado. A ex-mulher do miliciano – a funkeira Samantha Miranda – e seu marido, Marcelo Diotti da Mata, foram alvejados por tiros de fuzil no estacionamento de um restaurante na Barra da Tijuca. Há nove meses, o casal já havia sofrido uma tentativa de homicídio na mesma região. Samantha, então, acusou o ex-vereador de ter contratado um homem para matá-los.
Marcelo da Mata desta vez não escapou. O empresário levou dois tiros e morreu no local. A mulher conseguiu fugir. Pela segunda vez em depoimento à Divisão de Homicídios, ela voltou a acusar o ex-marido miliciano. Sob intervenção federal, as investigações na DH seguem em sigilo.
Contactado por WhatsApp, o deputado Marcelo Freixo disse saber que o miliciano estava em liberdade, mas demonstrou surpresa com sua volta ao Rio. Da primeira vez em que foi solto, Girão foi impedido de retornar ao Estado por causa das ameaças que fazia a seus desafetos locais. O advogado Leandro de Andrade Meuser, que representa Girão, não foi localizado para falar sobre o benefício concedido a seu cliente e para dizer o que fazia o ex-vereador na noite de quarta-feira enquanto Marielle e Marcelo da Mata eram executados.
Ei, Al Capone
Além de ter sido condenado por formação de quadrilha armada e lavagem de dinheiro, o ex-vereador ainda responde, na Justiça Federal, a um processo de execução fiscal por sonegação de impostos desde 2015. A Receita tenta recuperar cerca de R$ 1,1 milhão.
Cumprindo pena em liberdade, o réu é obrigado a fornecer endereço à Justiça. Mas um documento de 8 de novembro do ano passado mostra que Girão não foi encontrado para ser citado no processo. O andamento foi suspenso por um ano. Se ele não for localizado, segundo a decisão, o caso será arquivado.
Será que a Justiça vai procurá-lo na Câmara?
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