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Pressão sobre Biden contra vacinas genéricas de covid-19 para outros países vem até de ex-governador democrata

Howard Dean, ex-governador democrata no estado de Vermont, se junta à indústria farmacêutica para lutar contra o compartilhamento de propriedade intelectual para vacinas de baixo custo.

Howard Dean participa de um painel durante a turnê de verão da PBS Television Critics Association em Beverly Hills, Califórnia, em 29 de julho de 2016.

HOWARD DEAN, grande ex-defensor de pautas progressistas, está tentando convencer o presidente Joe Biden a rejeitar uma renúncia de propriedade intelectual especial que permitiria a produção de vacinas genéricas de baixo custo contra o coronavírus para atender às necessidades dos países de baixa renda. Atualmente, um pequeno número de empresas detém as fórmulas das vacinas contra a covid-19, limitando a distribuição em muitas partes do mundo.

“As proteções de propriedade intelectual não são a causa dos atrasos na vacinação”, afirmou Dean em uma coluna para a Barron’s no mês passado. “Todas as fábricas de medicamentos no planeta que são capazes de produzir vacinas contra a covid-19 já estão fazendo isso.”

“Criar um novo medicamento é uma proposta cara”, escreveu Dean. “As empresas nunca investiriam centenas de milhões de dólares em pesquisa e desenvolvimento se os rivais pudessem simplesmente copiar suas fórmulas de medicamentos e fazer suas versões genéricas.”

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A afirmação de Dean de que a fabricação global de vacinas já está plenamente estabelecida é claramente falsa. Empresas estrangeiras fizeram fila para oferecer fábricas de insumos farmacêuticos para a produção de vacinas, mas foram forçadas a entrar em longas negociações sob os termos estabelecidos pelos donos da propriedade intelectual. A renúncia, no entanto, permitiria aos fabricantes de medicamentos genéricos começar a copiar a vacina rapidamente.

Muitas das fábricas preparadas para a produção em massa de vacinas de baixo custo estão concentradas na Índia, que se comprometeu a abastecer os países mais pobres do mundo. Mas a petição de renúncia de propriedade intelectual, Dean escreveu, “é irracional e insincera; é um estratagema para beneficiar a indústria indiana às custas de pacientes em todos os lugares. Seria sábio se o presidente Biden a rejeitasse.”

A oposição estridente à renúncia, que é apoiada por uma coalizão internacional de organizações de direitos humanos, bem como um grupo cada vez maior de democratas do Congresso, pode surpreender os apoiadores liberais de Dean.  Mas, embora Dean ostente um longo histórico de apoio à cobertura de seguro de saúde por meio de um sistema universal e à intervenção do governo na redução dos preços de medicamentos, ele inverteu suas posições sobre praticamente todas as principais questões progressistas de política de saúde desde que começou a trabalhar no mundo do comércio de influência corporativa.

Dean não é registrado como um lobista, embora trabalhe na divisão de lobby da Dentons, uma empresa de lobby e advocacia, e sua retórica na coluna segue o padrão recente da empresa. A Dentons tem seu trabalho centrado em questões de propriedade intelectual de medicamentos, mencionando em seu website sobre já ter representado a Pfizer e outras empresas no passado.

Sua função oficial é a de consultor sênior da prática de assuntos governamentais voltada para clientes corporativos de saúde, embora, como o Intercept relatou anteriormente, ele se envolva em quase todas as atividades imagináveis de lobby. No passado, Dean argumentou não ser um lobista, mas se negou a discutir sua real função na empresa ou a identidade de seus clientes. Nem Dean nem a Dentons responderam aos pedidos de comentário do Intercept.

A coluna faz referência a uma proposta liderada pela Índia e África do Sul – juntamente do Quênia, Bolívia, Paquistão e diversos outros países – com o objetivo de solicitar a renúncia de propriedade intelectual sobre a criação de vacinas contra a covid-19. Para a Organização Mundial do Comércio, a renúncia possibilitaria acesso livre à propriedade intelectual e às fórmulas necessárias para reorganizar fábricas e intensificar a produção de vacinas para países em desenvolvimento, muitos dos quais projetam atualmente que não atingirão níveis significativos de vacinação antes de 2024.

Apesar de pesquisas com financiamento público e enormes aportes de dinheiro do governo para o desenvolvimento e distribuição de vacinas, os fabricantes de medicamentos protegeram cuidadosamente seu monopólio dos direitos de propriedade intelectual e sinalizaram aos investidores que planejam aumentar os preços em breve. A indústria farmacêutica, incluindo os representantes da Pfizer, Moderna e Johnson & Johnson, já pressionaram o governo Biden a se opor à petição de renúncia de propriedade intelectual e ir além, chegando a impor sanções a qualquer país que comece a produzir vacinas sem sua expressa permissão.

A carreira de Dean, conforme relatado anteriormente pelo Intercept, teve grande rotatividade após seu período como presidente do Comitê Nacional do Partido Democrata, trabalhando para empresas farmacêuticas e de biotecnologia, aconselhando lobistas durante o debate a respeito do Affordable Care Act sobre como ajudar empresas farmacêuticas com proteções de exclusividade estendidas sobre produtos biológicos, medicamentos feitos de organismos vivos como as vacinas. Ele também atua no conselho do Vatera, um fundo de investimento voltado a empresas da área de saúde.

‘Ele meio que aparece sempre que você argumenta contra qualquer coisa que possa reduzir os preços dos medicamentos’.

Em outra coluna recente, mais uma vez refletindo os interesses da indústria farmacêutica, Dean escreveu a favor de uma regulamentação proposta de última hora pelo governo Trump para restringir a capacidade do governo em reduzir os preços de certos produtos farmacêuticos financiados com dinheiro público, uma regra que pode conter qualquer tentativa futura de controlar os custos das vacinas contra o coronavírus.

“Sem o apoio dos contribuintes para pesquisas em estágio inicial nas universidades”, reconhece Dean, “as empresas farmacêuticas nunca teriam condições de criar vacinas que salvam vidas tão rapidamente”. Mas, ele escreve, ecoando os argumentos da indústria de que qualquer forma de controle de preços reprimiria a inovação, “as empresas farmacêuticas não gastarão os bilhões de dólares necessários para comercializar pesquisas financiadas pelo governo federal se houver o risco de o governo apoderar-se dos frutos de suas pesquisas. ”

“Ele meio que aparece sempre que você argumenta contra qualquer coisa que baixe os preços dos medicamentos”, disse James Love, diretor da Knowledge Ecology International, uma organização sem fins lucrativos que trabalha para reformar os direitos de propriedade intelectual de modo a expandir o acesso a medicamentos.

“É terrível porque ele é apresentado como progressista; ele ainda aparece no programa de ‘Rachel Maddow‘”, disse Love. “Mas ele é pago pela indústria. Ele não é um lobista registrado – de alguma forma acha maneiras de não se registrar – mas é uma espécie de influenciador, ele é pago para influenciar o debate.”

Tradução: Maíra Santos

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