Em seus 34 anos de carreira política, Jair Bolsonaro trocou de partido 9 vezes. Teve a carreira parlamentar marcada pela irrelevância e pelo oportunismo, mudando de partido como quem troca de cuecas. A partir de 2016, Bolsonaro começou a ganhar popularidade, virou presidente da República e o bolsonarismo se consolidou como uma força política. A sua relação com os partidos mudou. Agora ele tenta dominá-los e, se isso não for possível, destruí-los.
Relembremos a conturbada relação dele com os partidos políticos nos últimos anos.Em 2018, a onda bolsonarista transformou o PSL, até então um partido minguado, no segundo maior partido do Brasil em número de parlamentares eleitos. No ano seguinte, já como presidente, Bolsonaro tentou transformar o partido num puxadinho da sua família, mas encontrou resistência do cacique Luciano Bivar. Decidiu então abandonar a sigla em meio a uma enxurrada de acusações, trocas de dossiês e processos judiciais. Vários bolsonaristas saíram juntos com ele. O PSL foi destruído e acabou virando União Brasil ao se juntar com o DEM. Bolsonaro então decidiu tentar criar o Aliança Brasil, um partido em que teria o controle total. Mas a incompetência dele e de seu bando fascistóide fez com que o novo partido morresse antes mesmo de nascer.
Sem partido para disputar a reeleição, Bolsonaro se aproximou do PL de Valdemar Costa Neto. Quando a sua filiação já estava engatilhada, o então presidente exigiu que o diretório do partido em São Paulo ficasse sob o controle do seu filho Eduardo. O cacique do PL negou o pedido e então se iniciou uma troca de xingamentos pesados pelo Whatsapp. “Você pode ser presidente da República, mas quem manda no PL sou eu”, disparou Valdemar contra Bolsonaro, que respondeu mandando-o tomar naquele lugar. Valdemar seguiu a baixaria: “VTNC você e seus filhos!”. O rancor proveniente desse barraco não superou o oportunismo de ambos os lados. Bolsonaro precisava do PL e o PL precisava de Bolsonaro. Poucos dias depois da troca de xingamentos, acabaram se casando na força do ódio e do oportunismo.
Assim como aconteceu com o PSL, o PL foi inflado pelo bolsonarismo, se tornando a maior bancada da Câmara e a segunda maior do Senado. Com a derrota de Bolsonaro na última eleição e a definição da sua inelegibilidade para a próxima, a correlação de forças internas dentro do partido mudou. Os bolsonaristas continuam sendo maioria, mas não conseguem unir o partido em torno do projeto político de Bolsonaro. Para a surpresa de ninguém, parlamentares mais tradicionais e pragmáticos do partido traíram um pedido do ex-presidente para boicotar a Reforma Tributária do governo Lula. De olho na liberação de emendas milionárias, vinte deputados votaram a favor do projeto do governo petista, aflorando a disputa de poder dentro da sigla.
Na semana passada, mais um barraco pesado no Whatsapp do PL veio à tona. A baixaria se fez presente como de costume, com xingamentos e acusações pesadas entre correligionários. Até acusação de homicídio rolou. Uma semana antes, a briga interna já tinha dado as caras durante uma reunião do PL em Brasília. O governador Tarcísio de Freitas, do Republicanos, foi hostilizado por filiados do PL e criticado por Bolsonaro pelo apoio à reforma. Teve que sair escoltado da reunião. O episódio mostrou que Bolsonaro está enfraquecido, passando a ser tratado por alguns políticos do PL como “pato manco”.
Sem mandato, sem elegibilidade e sem as chaves dos cofres do poder, Bolsonaro já não é mais o mesmo aos olhos do PL. O que lhe dá sobrevida ainda é sua força eleitoral e sua base parlamentar dentro do partido. Valdemar tentou colocar panos quentes na treta, mas tudo indica que ela continuará e se intensificará nas próximas votações importantes.
Abrigar o bolsonarismo foi um ótimo negócio para Valdemar, que viu o partido passar a receber a maior fatia do Fundo Eleitoral e do Fundo Partidário. E continua sendo, já que Bolsonaro certamente será um ótimo cabo eleitoral para as eleições municipais de 2024. Os custos têm sido altos, mas ainda está sendo vantajoso. O mesmo vale para Bolsonaro que, apesar de não ter o controle total do partido, ainda recebe um bom salário mensal (R$ 39 mil) como presidente de honra. Sua esposa ganhou cargo de presidente do PL Mulher e também recebe um salário de mesmo valor. A mamata é o que mantém Bolsonaro no PL.
Bolsonaro, portanto, não pode sair do PL da mesma maneira que saiu do PSL. Antes ele era presidente da República, agora é um político inelegível, com chances de ir preso. Os políticos bolsonaristas também não podem sair do PL sem provar uma justa causa, senão perdem o mandato e, consequentemente, a bolada do Fundo Partidário. Todos tentam se equilibrar nessa corda bomba.
O racha no PL após uma vitória de Lula era previsto por qualquer analista político minimamente atento. O próprio Valdemar da Costa Neto sabia que ela aconteceria. Bolsonaro tenta controlar o PL, empurrá-lo para a extrema direita alucinada, com o único objetivo de boicotar o governo Lula. Mas Valdemar resiste e mantém o partido no centrão. O PL é uma bomba-relógio prestes a explodir a qualquer momento. Se publicamente ambos os lados afirmam estar tudo bem, nos bastidores seguem com aquela vontade de mandar um ao outro tomar naquele lugar. Mas não mandam porque um está de olho na mamata e o outro de olho nas eleições. E, assim, o casamento entre a antipolítica de extrema direita e o centrão fisiológico segue firme e forte como um prego na areia.
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