João Filho

Reeleição do extremista Nayib Bukele em El Salvador deixa extrema direita brasileira salivando

O fascínio pelo protótipo de ditador é tanto que MBL mandou militantes a El Salvador para acompanhar de perto a reeleição.

Reeleição do extremista Nayib Bukele em El Salvador deixa extrema direita brasileira salivando

O salvadorenho Nayib Bukele foi moldado na mesma forma que o ex-presidente dos EUA Donald Trump e outras figuras exóticas de extrema direita que ascenderam na última década. Foto: Shealah Craighead/Flickr

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El Salvador é um país pequeno, de 21 mil quilômetros quadrados, 7 milhões de habitantes e pouca relevância no cenário internacional. Mas as suas últimas eleições receberam atenção especial da direita brasileira. 

A reeleição do direitista Nayib Bukele em El Salvador foi muito festejada por aqui. Os bolsonaristas ficaram especialmente excitados, já que o salvadorenho conseguiu realizar os sonhos autoritários que eles não conseguiram. 

Todas as instituições estão sob o pleno domínio de Bukele. A reeleição consolidou sua autocracia.

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Após vencer a primeira eleição, o populista passou a controlar o parlamento, destituiu juízes da Suprema Corte, sufocou a imprensa livre, violou uma série de direitos humanos, colocou as Forças Armadas aos seus pés e ainda assim se reelegeu desfrutando de alta popularidade. 

Assim como Jair Bolsonaro, Nayib Bukele fez das ameaças golpistas uma prática permanente. Chegou a ordenar uma invasão de militares armados no parlamento para pressionar deputados pela aprovação de um projeto do seu interesse. 

A própria renovação do seu mandato representa um golpe contra a Constituição, que proíbe a reeleição. Essas são as credenciais democráticas do novo queridinho da direita brasileira. 

O salvadorenho foi moldado na mesma forma que Bolsonaro, o argentino Javier Milei, Donald Trump nos EUA e outras figuras exóticas de extrema direita que ascenderam na última década. 

De boné virado para trás e linguajar descontraído, o playboy de El Salvador usa a fórmula que tornou esses autoritários de direita populares em seus países: o discurso antipolítica, a luta contra o “sistema”, o demagogo combate à corrupção e o anticomunismo delirante. 

Mas o que mais parece fascinar a reaçada brasileira é a política de tolerância zero com a criminalidade. De fato, a queda nos índices foi vertiginosa. Em 2015, El Salvador era um dos países mais violentos do mundo, com uma taxa de 106 homicídios a cada 100 mil habitantes — quatro vezes maior que a do Brasil. Ano passado, a taxa despencou para 2,4 homicídios a cada 100 mil habitantes. 

Hoje, 90% da população diz se sentir segura no país. Mas como o “ditador mais legal do mundo” — é assim que Nayib Bukele se autorrefere ironicamente  — conseguiu atingir essa marca surpreendente? A resposta é simples: o salvadorenho ganhou poderes supremos depois que instalou um estado de exceção que era para ser provisório, mas se tornou permanente. 

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Bukele praticamente erradicou a criminalidade eliminando a garantia do direito de defesa de acusados, prendendo inocentes sem ordem judicial, torturando presos e investigados, reduzindo a maioridade penal para 12 anos e por aí vai. 

A lista de violações de direitos humanos cometidas em El Salvador é interminável. A violência urbana foi reduzida ao custo de muita violência contra a democracia e a humanidade. Quem paga esse preço, claro, não é a elite salvadorenha. As ações de Nayib Bukele têm um claro corte de classe

Os mais pobres — aqueles que mais sofreram com a brutal guerra de gangues nas últimas décadas — são as principais vítimas da repressão de Bukele. Qualquer mínima suspeita de envolvimento com as gangues é suficiente para uma prisão sumária. 

Hoje, dezenas de crianças estão desamparadas, com pais e mães presos sem terem passado pelo devido processo legal. É esse o pacote anticrime (um salve para Sergio Moro!) que faz brilhar os olhos da direita brasileira. 

O que os reaças brasileiros não falam é que o governo Nayib Bukele sentou à mesa com os chefes das gangues salvadorenhas para negociar um acordo, o que explicaria em parte a redução da criminalidade. 

Segundo reportagem do El Faro, um veículo que acabaria sendo censurado por Bukele, o governo se comprometeu a conceder benefícios a alguns criminosos de gangues que estão presos, como autorização para a venda de frango, pizzas e doces dentro das penitenciárias. 

Em troca, as gangues dariam uma maneirada na criminalidade. Ou seja, o governo sentou à mesa com a bandidagem para reduzir a violência — eis a hipocrisia do discurso de implacabilidade contra o crime. 

MBL foi a El Salvador acompanhar eleição de Nayib Bukele

Não são apenas os bolsonaristas que estão se deliciando com a implementação paulatina da ditadura em El Salvador. O MBL também está encantado. O grupelho, que nasceu junto com o bolsonarismo na onda reacionária que varreu o Brasil na última década, tem dado atenção especial para o governo de Nayib Bukele. 

O fascínio é tanto que mandaram um grupo de militantes para acompanhar o processo eleitoral salvadorenho. Essa é a segunda missão internacional patrocinada pelo MBL. A primeira foi uma “missão humanitária” para a Ucrânia em guerra, quando o então deputado Mamãe Falei aproveitou para flertar com loiras ucranianas porque, segundo ele, elas “são mais fáceis porque são pobres”

O liberalismo do MBL não resiste a um extremista de direita em ação. Por mais que tente sustentar a fachada liberal, o grupelho sempre acaba abraçado com a extrema direita, haja vista o seu entusiasmado apoio à eleição do fascistoide brasileiro. 

A intenção deles agora é criar um partido político para disputar o espólio eleitoral de Bolsonaro. Investir na pauta do combate à criminalidade é parte desse objetivo. 

Os meios antidemocráticos escolhidos pelo autocrata salvadorenho são ignorados para se exaltar os resultados. É esse o modelo de segurança pública que os liberalecos sentados no colo da extrema direita querem para o Brasil. Paz para os ricos, selvageria para os pobres.

Já que o MBL pretende formar um partido, lembremos quais quadros políticos o grupo já produziu para o país. O principal deles é Kim Kataguiri, o deputado federal gamer que defendeu publicamente o direito de nazistas alemães se organizarem em partidos políticos mesmo depois do Holocausto. 

Outro destaque é o youtuber Mamãe Falei, que teve o mandato de deputado estadual cassado pelas falas misóginas contra ucranianas. Não nos esqueçamos de outro youtuber oriundo do ninho do MBL: o ex- vereador carioca Gabriel Monteiro, cassado pela acusação de estuprar uma menor de idade e hoje preso. 

Esse é o perfil de político formado nas fileiras do MBL. Todos parecem um protótipo de Nayib Bukele. O apoio à ditadura salvadorenha é, portanto, coerente com a trajetória da turma. 

É natural que eles se identifiquem com um playboy autoritário de boné que se reelegeu de maneira ilegal e hoje está encarcerando pobres inocentes ao arrepio da lei. Bukele é a cara do MBL.

O DNA golpista e autoritário de parte significativa da direita brasileira faz desse flerte com Nayib Bukele algo natural. É o discurso do “bandido bom é bandido morto” elevado à centésima potência, enquanto crianças veem seus pais sendo presos arbitrariamente sem direito a um julgamento. 

O caminho da barbárie está sendo tomado com muito humor, boné virado para trás e lacração contra a esquerda. A democracia e o estado de direito são apenas um detalhe. 

🚨 O QUE ENFRENTAMOS AGORA 🚨

O Intercept está vigiando manobras eleitorais inéditas da extrema direita brasileira. 

Os golpistas estão de cara nova, com seus ternos e sapatênis. Eles aprenderam estratégias sofisticadas de marketing digital para dominar a internet, que estão testando agora nas eleições municipais.

O objetivo final? Dominar bases de poder locais para tomar a presidência e o congresso em 2026. 

Não se deixe enganar: Bolsonaro era fichinha perto dos fascistas de sapatênis…

O Intercept não pode poupar esforços para investigar e expor os esquemas que colocam em risco nossos direitos e nossa democracia.

Já revelamos as mensagens secretas de Moro na Lava Jato. Mostramos como certas empresas e outros jornais obrigavam seus trabalhadores a apoiarem Bolsonaro. E expusemos como Pablo Marçal estava violando a lei eleitoral. 

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