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PIB de +0,8% é bom, mas cenário com pouco investimento ainda preocupa

Alta do PIB foi impulsionada pela demanda das famílias e pelos serviços, e não pelo agronegócio. Mas queda dos investimentos indica futuro difícil.


A economia brasileira cresceu, descontado o efeito da inflação, 0,8% em comparação com o último trimestre de 2023. O dado, divulgado pelo IBGE, se refere ao Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre de 2024.

Precisamos refletir sobre o que significa esse indicador e o que ele pode sinalizar em termos de diagnósticos e desafios para o Brasil. É necessário avançar em relação às análises meramente ilustrativas ou, na linguagem informal, superar as análises de “elevador” que se contentam em apenas apontar o movimento de alta e queda do PIB.

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A primeira consideração importante é que a retomada do crescimento, por si só, é um elemento positivo. Mas o crescimento do PIB não significa, necessariamente, a melhora das condições materiais de vida do povo brasileiro. O PIB pode crescer com concentração de renda e aumento da miséria, por exemplo.

Porém, a contração desse indicador – essa sim, necessariamente – agrava nossas mazelas sociais. Crises ou situações de semi-estagnação econômica costumam afetar o emprego, contraindo a renda e o consumo e gerando efeitos sobre os direitos humanos básicos, sobretudo a capacidade de comprar alimentos. Em momentos difíceis, os mais pobres costumam pagar a conta.

Portanto, uma das heranças malditas da inflexão neoliberal do segundo governo de Dilma Rousseff, agravada pelo golpe de 2016 e sustentada pelo ultraneoliberalismo de Jair Bolsonaro e Paulo Guedes, está sendo revertida: a economia brasileira finalmente voltou a apresentar uma trajetória de crescimento.

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A velocidade desse crescimento ainda é muito mais baixa do que seu padrão no século XX, mas em linha com as principais economias centrais. Os dados do PIB indicam avanços em relação ao ano de 2023 e sinalizam limites e desafios substanciais.

O primeiro, em relação aos avanços, é que, mesmo crescendo menos no primeiro trimestre deste ano em relação ao primeiro trimestre de 2023, a agropecuária não ditou sozinha o comportamento do indicador. Isto é, o risco de concentração de toda a economia brasileira no agro está mais distante.

Juros em queda, inflação controlada e contas públicas estáveis, mas o investimento não cresceu.

Como o primeiro trimestre é o período de colheita, é natural que os dados positivos se concentrem nesse período e depois apresentem desaceleração. No entanto, em 2024, o setor de serviços apresentou alta de 1,4% em relação ao trimestre anterior, enquanto no primeiro trimestre de 2023 havia sido apenas 0,6%.

É qualitativamente melhor que o crescimento seja puxado por um setor mais intensivo em emprego, como os serviços, sobretudo na base da pirâmide social e respondendo a impulsos internos, do que pela agropecuária, em geral altamente mecanizada e dependente da demanda externa.

Queda na inflação e na taxa de investimento

Ainda nas boas notícias, a indústria ficou estável, mas houve queda na indústria extrativa, também mais dependente da demanda externa e com fortes impactos ambientais, e maior crescimento da indústria de transformação, de maior valor agregado e normalmente com geração de melhores empregos. Países desenvolvidos apresentam forte indústria de transformação, que sustenta toda a economia.

O crescimento brasileiro ainda tem sido acompanhado de queda do desemprego, elevação mais que proporcional do rendimento médio dos trabalhadores e queda da inflação, o que – além de desafiar a lógica dos economistas neoliberais e seus manuais – faz crescer ainda mais a renda real disponível às famílias.

A boa notícia não é apenas que o PIB subiu, mas que isso se deve ao aumento da renda do trabalhador com queda da inflação, ou seja, da capacidade do trabalhador de sustentar sua família melhor.

No acumulado dos últimos quatro trimestres, em comparação com os quatro trimestres de 2023, houve um aumento de 3,2% no consumo das famílias e de 2,1% nas despesas de consumo do governo, um dado que aponta que gastos públicos e demanda privada de consumo são motores da sinergia que impulsionou o PIB.

Do ponto de vista dos desafios, a queda sequencial da taxa de investimento parece ser o maior limitador. Na contabilidade das Contas Nacionais, chamamos de “investimento” tudo aquilo que é gasto na ampliação de capacidade produtiva, ou seja, compra de máquinas, construção de uma fábrica, obras de infraestrutura e similares.

Esses são gastos fundamentais porque determinam o quanto podemos crescer no futuro. A taxa de investimento, infelizmente, vem caindo desde 2021 e está em 16,9% do PIB, muito próxima da menor média histórica, que foi em 2016.

Houve uma aposta da equipe econômica, tácita pelo menos, de que poderia haver uma política fiscal mais contracionista, isto é, de menores gastos públicos, expressa na limitação de 2,5% de crescimento real nas despesas públicas.

Segundo essa aposta, isso seria compensado por uma política monetária mais expansionista, expressa na luta política em defesa da redução da taxa básica de juros. Com os juros mais baixos, o setor privado poderia investir mais.

No entanto, embora os juros estejam em queda, a inflação controlada e as contas públicas estáveis, o nível de investimento não respondeu a essas variáveis. Pelo contrário, apresentou uma redução, ainda que estatisticamente pouco expressiva.

Apesar da boa notícia, o PIB ainda não aponta no horizonte a chegada do ‘Brasil do futuro’.

O setor privado não investiu mais e há um risco de o estado não poder atuar mais como compensador. Há limitações no arcabouço fiscal, em especial para a rubrica “investimento”, que é uma despesa chamada discricionária.

E como apenas os gastos obrigatórios tendem a crescer mais, seja a previdência por conta do envelhecimento populacional ou pelas áreas que têm pisos constitucionais, o investimento pode ficar ainda mais comprimido.

Nesse caso, diante da inércia do investimento e da semi-estagnação da indústria, o futuro se distancia demais do presente, já que os sonhos de um Brasil desenvolvido, com crescimento sustentado, geração de postos de trabalho qualificados e melhoria no provimento de serviços públicos ficam obstaculizados e nublados demais.

Apesar da boa notícia, o PIB ainda não aponta no horizonte a chegada do “Brasil do futuro”. O que nos é apresentado é um país com um agronegócio fortalecido, com baixos encadeamentos produtivos, e um setor de serviços, altamente empregador, mas de base tecnológica reduzida, demandando trabalho pouco qualificado e ofertando baixos salários.

Ou seja, o temido “Brasil Fazendão” pode se consolidar, penalizando mais os pobres, que dependem da geração de empregos que estão ligados, principalmente, ao mercado interno.


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