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O estilo de Hugo Motta

O novo presidente da Câmara recusou um acordo com uma diarista por R$ 1.500 – e venceu. Agora, negociará o destino do país.

Presidente do Câmara dos Deputados, Hugo Motta, do Republicanos da Paraíba (Foto: Marina Ramos/Câmara dos Deputados)

Presidente do Câmara dos Deputados, Hugo Motta, do Republicanos da Paraíba (Foto: Marina Ramos/Câmara dos Deputados)
Presidente do Câmara dos Deputados, Hugo Motta, do Republicanos da Paraíba (Foto: Marina Ramos/Câmara dos Deputados)

Na política, a arte da negociação costuma ser exaltada como a mais nobre das habilidades. O consenso, o diálogo, a busca por acordos equilibrados — tudo isso faz parte do imaginário de um bom articulador. Mas há diferentes maneiras de negociar. E o novo presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, do Republicanos da Paraíba, deixou para a posteridade um registro revelador de seu próprio estilo.

O episódio está documentado em um processo trabalhista ajuizado na 3ª Vara do Trabalho de Brasília em 2017. A reclamante, Silvana de Souza (o nome foi alterado para preservar a identidade da trabalhadora), alegava ter trabalhado como empregada doméstica para Hugo Motta entre agosto e dezembro de 2016, três vezes por semana, sem carteira assinada. Reivindicava o reconhecimento do vínculo empregatício, pagamento de verbas rescisórias e indenização por danos morais. O valor da causa: R$ 35 mil.

Em depoimento, o deputado negou a relação empregatícia. Argumentou que Silvana era diarista, sem periodicidade fixa, e que lhe pagava R$ 100 por dia de trabalho, além do transporte. Uma testemunha do parlamentar, um motorista alocado em seu gabinete na Câmara, reforçou essa versão, dizendo que ele nem sempre estava em Brasília e, portanto, não havia continuidade no serviço — um elemento essencial para a configuração do vínculo de emprego doméstico.

O processo seguiu seu curso, e, em 7 de junho de 2017, foi realizada uma tentativa de conciliação. A defesa de Motta ofereceu R$ 1.000 para encerrar o caso. Silvana fez uma contraproposta: R$ 2.500. Não estamos falando de uma soma vultosa. Estamos falando de R$ 1.500 de diferença. Mas o deputado, homem que nas semanas seguintes controlará um orçamento bilionário na Câmara dos Deputados, recusou o acordo.

Trecho do termo de audiência realizada em 7 de julho de 2017 na sala de sessões da na 3ª Vara do Trabalho de Brasília

O caso, então, foi julgado pelo juiz Francisco Luciano de Azevedo Frota, que deu razão ao parlamentar e negou o pedido de Silvana. A trabalhadora recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, mas a decisão foi mantida pelo juiz Gilberto Augusto Leitão Martins, relator do acórdão publicado em 9 de maio de 2018. Com isso, além de perder a ação, Silvana foi condenada ao pagamento das custas processuais, no valor de R$ 700 – quantia da qual foi dispensada por ser beneficiária da gratuidade da justiça.

A história não é apenas um retrato de um processo judicial. É uma mostra do perfil de um político que agora ascende a um dos postos mais poderosos do país. Diante de uma trabalhadora que pedia pouco, Hugo Motta fez questão de vencer. Não cedeu um centímetro. Não aceitou perder R$ 1.500 para encerrar um litígio menor. Levou a disputa até o fim e saiu vitorioso.

Agora, Hugo Motta se prepara para conduzir as grandes negociações políticas do país. O que se diz é que ele sabe dialogar com deputados de todos os lados, que entende a importância de construir consensos. Mas, para nós, reles mortais, talvez valha lembrar desta história. Ele poderia ter feito um acordo. Preferiu derrotar uma trabalhadora. Tentei ouvi-lo sobre o caso, mas sua assessoria não deu retorno.

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Evidentemente, não é apenas o caso de Silvana que nos ajuda a entender de qual lado da história está Hugo Motta. Outro episódio, muito bem contado por alguns veículos de imprensa nesta semana, é emblemático. Mensagens obtidas pela Polícia Federal durante a Operação Lava Jato indicam que Hugo Motta assinava requerimentos e fazia movimentações parlamentares a pedido do então presidente da Câmara Eduardo Cunha, do MDB.

Documentos anexados a inquéritos revelam que Hugo Motta, ainda em seu primeiro mandato, servia como intermediário para Cunha, ocultando o real interessado em determinadas ações legislativas. Entre os exemplos, estão e-mails de assessores de Cunha perguntando se podiam enviar requerimentos para Motta assinar e mensagens do ex-presidente da Câmara instruindo-o a apresentar emendas e propostas em seu nome.

Não é de se surpreender. O novo presidente da Câmara iniciou a vida de congressista em 2011, aos 21 anos, pelo então PMDB. Filho do ex-prefeito da cidade paraibana de  Patos, Nabor Wanderley, e neto do ex-deputado federal Edvaldo Motta, o jovem parlamentar rapidamente se destacou como aliado fiel de Eduardo Cunha.

Com apoio de Cunha, ele assumiu relatorias estratégicas e a presidência da CPI da Petrobras em 2015, consolidando-se como um operador do grupo que comandava o centrão naquele momento.

Se o episódio com a diarista revela a intransigência de Hugo Motta diante dos fracos, sua trajetória ao lado de Eduardo Cunha escancara sua disposição para servir aos poderosos. Negociador hábil quando se trata de operar em favor de caciques políticos, Motta não hesitou em emprestar sua assinatura para aliados e manobrar nos bastidores do Congresso.

Agora, no comando da Câmara, terá nas mãos não apenas a caneta para chancelar acordos, mas a prerrogativa de pautar e barrar projetos que moldarão o país nos próximos anos. A questão que se impõe não é se ele sabe negociar, mas a serviço de quem o fará.

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