Donald Trump é uma incógnita na América Latina. Quem ele irá favorecer mais? Seus aliados naturais, incluindo governantes que compartilham muitas de suas obsessões na guerra cultural? Ou políticos e ativistas que enxergam em Trump o longo histórico de domínio dos EUA encarnado, e que se irritam com suas ameaças de tomar o Canal do Panamá e bombardear laboratórios de fentanil no México?
Para tentar responder essas perguntas, é útil se deter por um momento para lembrar que a América Latina, não faz muito tempo, desafiou outro controverso presidente dos EUA em questões relacionadas a guerra e comércio: George W. Bush.
Enquanto o governo Bush se preparava para a invasão ao Iraque em 2003, a América Latina estava começando uma série de eleições memoráveis. Líderes de esquerda estavam chegando ao poder em praticamente todos os países ao sul do Panamá, muitas vezes com pautas ambiciosas e personalidades exageradas. Entre eles estavam Hugo Chávez, na Venezuela, Luiz Inácio Lula da Silva, no Brasil, Néstor Kirchner, na Argentina, e Evo Morales, na Bolívia.
Para uma região que havia estado por muito tempo sob o domínio de Washington, um período de divergência em relação a Bush — começando, digamos, da primeira eleição de Lula à presidência, em 2002, até a morte de Chávez por câncer de intestino, em 2013 — foi extraordinário, e por algum tempo, extraordinariamente bem-sucedido. Na América Latina, os diplomatas falavam em um novo “mundo multicêntrico”, enquanto centros de pesquisa próximos a Washington, como o Conselho de Relações Exteriores, declaravam a Doutrina Monroe “obsoleta”.
‘Uma nova geração de reacionários extrai energia das táticas que animam o trumpismo nos EUA.’
Uma hora, a maré virou. Onde os conservadores mais tradicionais achavam difícil competir nas pesquisas com políticos como Lula e Chávez, uma nova geração de reacionários começou a encontrar sua base, extraindo energia das táticas e questões que animam o trumpismo nos EUA: obsessão com a ortodoxia de gênero, defesa do patriarcado e da supremacia cristã, e amor pelas criptomoedas. A nova direita da América Latina se opõe ao “wokeísmo“, usado, como nos EUA, como guarda-chuva para uma série de políticas sociais com o objetivo de reduzir a desigualdade de classe, gênero e raça.
Ao examinar a montanha-russa de um quarto de século na América Latina, podemos encontrar algumas pistas para o que esperar do segundo mandato de Donald Trump, na América Latina e em outros lugares.
Ascensão e queda da dissidência de esquerda
Os governantes latino-americanos de esquerda de outros tempos eram firmes na rejeição à “guerra mundial contra o terror” de Bush, e se recusaram a permitir a participação de suas forças de segurança no programa transnacional da CIA de extradição forçada e tortura em prisões secretas. O Brasil rejeitou as exigências dos EUA de reformar a legislação para facilitar as condenações por acusação de terrorismo; o PT temia que essa medida pudesse ser usada, como um diplomata dos EUA observou, para perseguir “movimentos sociais legítimos lutando por uma sociedade mais justa”.
Em 2005, Lula, Kirchner e Chávez rejeitaram o tão aguardado Acordo de Livre Comércio das Américas, e a estratégia de negociação tudo ou nada de Kirchner para reestruturação da dívida pública da Argentina foi considerada um modelo para reduzir o impacto da dívida sobre os países pobres. Lula também buscou fortalecer a aliança do BRICS em contraposição à Organização Mundial do Comércio, e resistiu aos esforços para criar uma barreira entre o Brasil e a Venezuela.
Os países da América Latina pressionaram pelo fim das sanções econômicas a Cuba, denunciaram o apoio de Washington à invasão de Israel no Líbano em 2006, e criticaram o campo de prisioneiros criado pelos EUA na Baía de Guantánamo, em Cuba, como um deboche ao Direito Internacional. Venezuela, Brasil e Argentina ignoraram as sanções de Washington contra o Irã. A Bolívia expulsou o Departamento Antidrogas dos EUA em 2008, e a agência humanitária USAID em 2014. O Equador fechou uma base da Força Aérea dos EUA. A maioria dos países da América Latina se opôs ao bombardeio da Líbia pela OTAN em 2011, que resultou na derrubada e na execução de Muammar Gaddafi.
Para além de qualquer divergência, o Brasil defendia uma interpretação “bolivariana” do Direito Internacional, que organizasse os país com objetivo de aliviar a pobreza, o aquecimento global, a insegurança alimentar e os males da guerra às drogas. Celso Amorim, ministro das Relações Exteriores de Lula, declarou que o Brasil “não tem inimigos” — o que é digno de nota, considerando que os neconservadores de Bush haviam transformado o mundo inteiro em campo de batalha. A Venezuela reforçou a posição do Brasil, enquanto Caracas colaborava com Cuba e Nicarágua para construir um bloco declaradamente anti-imperialista. Os altos preços das commodities, como o cobre chileno e o petróleo venezuelano, permitiram aos governos manter ambiciosos programas de assistência social, que tiraram milhões de pessoas da pobreza.
Os progressistas da América Latina começaram a perder vantagem, no entanto, com a eleição de Barack Obama, em 2008.
O Brasil encabeçou uma campanha de muitas frentes na ONU, OMC e OMS para quebrar o monopólio das patentes detidas pelas empresas farmacêuticas, insistindo no direito de fabricar medicamentos genéricos contra HIV/AIDS e outros “medicamentos essenciais”. O Brasil venceu essa batalha, alterou as normas globais e ampliou o acesso a tratamentos que salvam vidas.
Os progressistas da América Latina começaram a perder vantagem, no entanto, com a eleição de Barack Obama, em 2008. Enquanto a fanfarronice de Bush endureceu a oposição no hemisfério, os diplomatas de Obama jogaram um jogo de paciência, que retomou o controle sobre a região.
Obama ampliou a perfuração doméstica de petróleo e o fraturamento hidráulico de gás, e encorajou o Canadá a aumentar as exportações de combustível e eletricidade para os Estados Unidos. Tudo isso foi feito para reduzir consideravelmente o custo da energia e “conter” Chávez, o que de fato aconteceu.
Golpes em Honduras em 2009 e no Paraguai em 2012 derrubaram social-democratas moderados. Washington não orquestrou os golpes, mas o Departamento de Estado de Hillary Clinton deu legitimidade a eles e armou os homens que os executaram.
Mas esses dois países eram peixes pequenos. O Brasil, com a Venezuela sob controle, era a bola da vez.
O Departamento de Justiça de Obama forneceu assistência crítica a investigadores corruptos durante a operação Lava Jato, uma caça às bruxas judicial contra o Partido dos Trabalhadores, que resultou na prisão de Lula e no impeachment de sua sucessora, Dilma Rousseff. Essa campanha de “lawfare” acabou preparando o terreno para a ascensão da extrema direita, na figura de Jair Bolsonaro, aliado de Trump em forma e conteúdo, eleito presidente em 2018.
Em seguida, um juiz federal em Nova York decidiu que o acordo de dívida de Kirchner era inválido, obrigando a Argentina a pagar integralmente sua dívida externa. O julgamento despertou a sanha dos abutres financeiros sobre o país, e a situação política entrou em parafuso. A pressão acabou contribuindo, por fim, para a eleição de Javier Milei em 2023, um autodeclarado anarcocapitalista que nunca se cansa de gritar “Viva la libertad, carajo” — “Viva a liberdade, caralho”.
A Nova Direita da América Latina
Bolsonaro e Milei, assim como Nayib Bukele, de El Salvador, representam a possível base de apoio de Trump na América Latina.
Daniel Noboa, herdeiro de uma fortuna da indústria bananeira, não teria nenhuma chance de chegar à presidência do Equador, digamos, em 2006, quando o pai de Noboa concorreu com Rafael Correa, um economista de esquerda, e foi derrotado. Mas a guerra cultural deu um novo verniz às oligarquias. O jovem Noboa adotou uma personalidade estilo Trump, habilidoso com as redes sociais, que se vende ao mesmo tempo como favorável aos empresários e contra o establishment, a favor de Israel e antiwoke. Depois de estampar sua imagem em pôsteres pelo país inteiro, ao lado de Trump, Marco Rubio e Elon Musk, Noboa está logo atrás da esquerdista Luisa González na disputa presidencial, que vai ao segundo turno em abril.
Musk é um herói cultural para homens como Noboa, Milei e Bukele; sua luta contra as iniciativas brasileiras de regulação das redes sociais — por meio de leis destinadas a restringir a desinformação e limitar o extremismo de direita — tornou-se um ponto de mobilização para os conservadores da região. (Até agora o Brasil conseguiu deter Musk, embora a rede Rumble e a Truth Social de Trump tenham acabado de entrar com uma ação nos EUA alegando censura ilegal.)
Em El Salvador, Bukele, um descolado libertário autodenominado que usa boné de beisebol, comanda demonstrações dantescas de desumanização: reúne centenas de supostos integrantes de facções, com as cabeças raspadas, amontoados, nus e algemados. Considerado um modelo não apenas para os conservadores da América Latina, mas também do norte, Bukele dispensou o devido processo legal e provocou a maior taxa de encarceramento das Américas, maior até que a dos próprios EUA.
‘Os laços que unem a Nova Direita da América Latina e suas equivalentes nos EUA estão se estreitando.’
Campanhas psicológicas para desestabilizar governos eleitos de esquerda e centro, amplificando mentiras e manipulando as instituições democráticas — a imprensa, a urna, e a lei —, não são novidade na América Latina. A CIA realizou dezenas de operações desse tipo na região. A novidade da Nova Direita é o surgimento da mobilização de base, a sensação de que a pressão vem aumentando espontaneamente a partir de uma multiplicidade de fontes, de que a direita representa, não uma defesa do status quo hierárquico, mas um desejo de mudança antissistema.
Os laços que unem a Nova Direita da América Latina e suas equivalentes nos EUA estão se estreitando, não como resultado de viralização de memes e publicações de redes sociais, mas dos esforços de organização de financiadores bilionários, líderes religiosos conservadores, ativistas libertários, influenciadores de direita como Steve Bannon, e partidos políticos, como o Vox, da Espanha. Os predadores antivacina atacam as comunidades pobres do México da mesma forma que atacam as comunidades pobres nos EUA. Os libertários se unem aos ativistas antitrans e antiaborto, aos católicos ultraortodoxos, aos evangélicos da teoria do domínio, aos sionistas cristãos, e ao braço latino-americano da Nova Reforma Apostólica — recentemente apontada como fundamental para compreender o apoio dos cristãos a Trump.
Incoerências de Trump
Trump pode comandar o jogo na América Latina.
Com o ex-senador pela Flórida, Marco Rubio, como seu secretário de estado, e o linha dura Mauricio Claver-Carone como “enviado especial” para a América Latina, seria possível imaginar um cenário em que os EUA derrubam Nicolás Maduro; apertam Cuba até arrebentar; removem Daniel Ortega na Nicarágua; mantêm o peso argentino artificialmente valorizado para ajudar Milei a vencer as eleições legislativas em outubro; e aprofundam a cisão já existente na esquerda da Bolívia, finalmente trazendo uma restauração da direita no país rico em lítio. Chile e Colômbia atualmente têm governos de esquerda com números ruins nas pesquisas. Sabe-se lá quais diálogos estão em curso para influenciar as próximas eleições.
Por fim, vem o Brasil, onde as acusações contra Lula foram anuladas depois que se comprovou que a investigação que levou à sua condenação foi corrupta e politicamente motivada. Libertado da prisão, Lula derrotou Bolsonaro em 2022 e assumiu seu terceiro mandato na presidência. Bolsonaro respondeu à derrota encorajando uma tentativa de golpe para tentar se manter no poder, que incluía um plano para envenenar Lula. Ele atualmente está impedido de concorrer à presidência nas próximas eleições, embora seus apoiadores estejam fazendo lobby para que Rubio pressione Lula a encontrar uma forma de remover a inelegibilidade e a permitir que nazistas e antissemitas postem no X brasileiro.
Esse cenário — que inclui não só uma retirada da esquerda, mas um estímulo ao trumpismo pan-americano — presume coerência e paciência que podem estar além da capacidade de Trump. Ele ainda não indicou embaixadores no Brasil, nem na Colômbia, nem um secretário de Estado adjunto para o Hemisfério Ocidental. Além disso, o bloqueio de ajuda humanitária dos EUA para a região, incluindo valores destinados às forças de segurança, limita o espaço de manobra de Washington.
Pelo menos a princípio, Trump provavelmente só terá uma atuação esporádica no hemisfério. Ele já mudou de lado duas vezes em relação à Venezuela. Inicialmente, Trump disse que Maduro precisava sair. Depois, aparentemente seu governo fez um acordo de que ele poderia ficar, e deixar a Chevron extrair petróleo. Mais recentemente, no entanto, ele surpreendeu a Chevron com o anúncio de que estava revogando a exceção concedida à empresa para atuar na Venezuela, aparentemente como parte de um acordo para manter os parlamentares republicanos na linha durante a negociação do orçamento.
À medida que seu mandato avança, Trump comprará brigas com a América Latina, a partir de seus impulsos, por razões como a China, migrações, tarifas, voos de deportação, e política antidrogas, e, ao fazer isso, perderá a chance de construir um movimento hemisférico unificado à sua imagem. Suas reiteradas ameaças de coagir o Canadá a se tornar parte dos EUA o afastaram dos conservadores canadenses. Os colombianos, segundo uma pesquisa de opinião, em geral gostam de Trump — mas não se ele continuar com as ameaças contra o Panamá, que já foi uma província da Colômbia até que os EUA fizeram a divisão em 1903 para construir o canal.
A inconstância de Trump o impede de desenvolver uma política externa coerente e construir uma aliança internacional duradoura. Sua desvantagem, no entanto, é compensada pela fragilidade da esquerda latino-americana.
Por enquanto, os ativistas continuam a mobilizar uma grande variedade de movimentos sociais com o objetivo de construir um mundo mais justo, e os progressistas continuam a vencer eleições. Em uma conta aproximada, há mais de 470 milhões de pessoas na região, de uma população total de 620 milhões, que vivem em países governados por presidentes que se autodenominam socialistas ou social-democratas.
‘A união que existia quando a região resistiu a Bush não existe mais.’
Mas os políticos de esquerda se movem em um terreno instável, e já não conseguem comandar uma hegemonia discursiva como fizeram seus camaradas vinte anos atrás. Chávez energizava a esquerda do continente, mas seu sucessor difícil de defender, Maduro, a exaure, e obriga Brasil, Colômbia e Chile a desperdiçarem energia pensando o que fazer com a Venezuela.
A união que existia quando a região resistiu a Bush não existe mais. Cada país de centro-esquerda parece uma ilha em si mesmo, seus governos incapazes de aprovarem uma agenda de reformas e de construírem alianças estabilizadoras. Lula ainda vem cooperando com o BRICS em busca de uma moeda que não seja o dólar para fazer negócios. “As ameaças de tarifas de Trump não vão impedir nossa determinação”, disse ele, recentemente, de encontrar uma forma de comercialização que “não dependa só do dólar”.
Lula, porém, está encurralado, e sua popularidade ainda está meros um ou dois pontos percentuais acima de Bolsonaro, apesar de todos os crimes do ex-presidente. Talvez Lula precise concorrer novamente em 2026. Se isso acontecer, será um sinal de fraqueza da centro-esquerda, não de força — uma indicação da vitalidade do bolsonarismo, e da incapacidade dos progressistas de encontrarem uma alternativa que não seja voltar a recorrer a Lula, que já estará com 80 anos. Ao longo das últimas décadas, um papa humanista, criado na Argentina peronista, renovou o cristianismo progressista. Papa Francisco, porém, está fraco e doente aos 88 anos, e os reacionários católicos em ascensão estão empolgados com a perspectiva de que ele não permaneça mais muito tempo neste mundo.
Apenas Claudia Sheinbaum, do México, consegue operar em uma posição de autoridade. Sua expansão do estado de bem-estar social é imensamente popular entre os mexicanos, e as pesquisas mostram que a grande maioria do país apoia seus entreveros com Trump. Mesmo enquanto tenta lidar com delicadeza com os EUA, ela continua firme em apresentar uma visão pós-neoliberal de cidadania social.
Um desequilíbrio frágil
As eleições são disputadas no fio da navalha, pelos votos de cidadãos cansados da criminalidade, da corrupção e da inflação. Em meio ao cansaço, é tentador ser convocado para uma luta. Mas é principalmente a Nova Direita que está fazendo a convocação, preenchendo a lacuna deixada pela desorientação da esquerda com os sentidos da política. A hegemonia da esquerda deu lugar à expansão do conspiracionismo de direita, um projeto de criptoconstrução de mundo com detalhes cada vez mais rebuscados.
Como nos EUA, a Nova Direita da América Latina compõe sua própria demonologia enquanto cresce: os globalistas, Judith Butler, George Soros, cientistas climáticos, repórteres, funcionários públicos — especialmente professores do ensino básico e da universidade pública —, migrantes, e supostos pedófilos. “Con mis hijos no te metas” — “Não se meta com meus filhos” — é o nome de um movimento peruano que ganhou influência sobre o governo, que em maio do ano passado decretou que pessoas intersexo e transgênero eram “doentes metais”. A expressão “igualdade de gênero” foi retirada dos livros escolares no Peru.
O apoio de Milei a Israel é tão “inabalável” quanto seu apoio a Trump, mesmo que, para Milei, as políticas tarifárias de Trump representem um dilema moral maior que o genocídio de Israel em Gaza.
A defesa da “liberdade” pelo presidente da Argentina — que para ele quer dizer liberdade de mercado — requer mobilização constante em apoio a causas que estão em conflito, pelo menos a princípio, com o libertarianismo, como leis de restrição ao aborto, perseguição a pessoas transgênero, encarceramento coletivo em massa; e ataques contra a liberdade de impressão, o direito de reunião e de manifestação, o jornalismo, a educação pública, e os professores. O objetivo é dominar o debate público, segundo Milei, para ampliar constantemente a imaginação conservadora. Caso contrário, a vantagem retornará aos ativistas pela “justiça social”.
Milei, amado pelos editores da revista The Economist, recentemente se envolveu em um caso de fraude com criptomoedas. O ministério público da Argentina iniciou uma investigação sobre o golpe, e as provas parecem inequívocas. Os organizadores do esquema — aparentemente, as mesmas pessoas que coordenaram a venda da moeda de Melania Trump — haviam direcionado recursos à chefe de Gabinete de Milei, sua irmã Karina Milei. “Eu controlo aquele n****”, escreveu um dos acusados em uma mensagem, em relação ao presidente. “Eu mando $$ pra irmã dele e ele assina o que eu disser e faz o que eu quiser.”
O frágil desequilíbrio entre o poder da direita e o da esquerda se mostra na postura da América Latina em relação à Europa: como fez em relação ao militarismo anterior de Bush, Lula criticou o apoio dos EUA à Ucrânia na defesa contra a Rússia, e insistiu que apenas a diplomacia pode resolver um conflito que passou décadas em formação. Milei, por sua vez, enquanto Joe Biden ocupava a Casa Branca, prometeu apoio eterno ao presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenskyy. “Eu fui o primeiro a defender a Ucrânia contra a Rússia”, disse; “sempre me encontrarão do lado certo da história”.
Milei chegou a anunciar que a Argentia pretendia aderir à OTAN, estendendo a aliança militar do Atlântico Norte para o Atlântico Sul, mas então a história mudou de lado. Agora, cortejando Trump e precisando que Washington apoie um empréstimo do Fundo Monetário Internacional, a Argentina se afastou de Zelenskyy, e Milei instruiu seu embaixador na ONU a se abster em uma votação que repudiou a invasão da Ucrânia pela Rússia.
Milei não parece preocupado com sua própria hipocrisia, e se apresenta como um modelo para os seguidores: “todos os dias eu luto incessantemente a guerra cultural”.
Viva la libertad, carajo.
JÁ ESTÁ ACONTECENDO
Quando o assunto é a ascensão da extrema direita no Brasil, muitos acham que essa é uma preocupação só para anos eleitorais. Mas o projeto de poder bolsonarista nunca dorme.
A grande mídia, o agro, as forças armadas, as megaigrejas e as big techs bilionárias ganharam força nas eleições municipais — e têm uma vantagem enorme para 2026.
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